Cantores, artistas e mais de 200 entidades fazem “Ato pela Terra” em Brasília

Protesto pede a derrubada do chamado Pacote da Destruição. Alguns artistas aproveitaram o momento para questionar a criminalização da cannabis no Brasil

Publicada em 09/03/2022

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Por Manuela Borges

Dezenas de artistas, ativistas e especialistas em meio ambiente desembarcaram hoje em Brasília para mobilizar o judiciário e o legislativo contra cinco Projetos de Lei que avançam no Congresso, e que podem impactar negativamente no meio ambiente. A mobilização teve início no Supremo Tribunal Federal (STF). Um grupo, liderado pelo cantor e compositor Caetano Veloso, se reuniu primeiramente com os ministros Luis Roberto BarrosoCármem LúciaAlexandre de Moraes Ricardo Lewandowski. Na sequência, os famosos foram recebidos numa audiência coletiva pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSB-MG), no Salão Negro - um local reservado para solenidades.  Além de Pacheco, outros deputados e senadores participaram do evento.

Porta-voz dos colegas, Caetano Veloso leu uma carta direcionada ao presidente do Senado. No texto, o poeta lembrou dos desastres de Brumadinho em Minas Gerais, e recentemente das chuvas que arrasaram Petrópolis no Rio de Janeiro, alertando que o problema do aquecimento global é real e já está em andamento. “O desmatamento saiu do controle, a violência contra indígenas aumentou. A nossa credibilidade internacional está arrasada, e o prejuízo é de todos nós”, leu Veloso. E fez um apelo, em nome dos colegas e de especialistas, para que o presidente do Senado impeça mudanças na lei que possam comprometer de forma irreversível a qualidade de vida da população e das futuras gerações.

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A cantora Maria Gadú, que veio do Rio de Janeiro para o protesto, disse estar preocupada com as leis que vêm sendo aprovadas no país. “Estamos aqui para fazer um chamado nacional! O ato é sobre a comida que está no nosso prato, é sobre o ar que a gente respira, é sobre a qualidade da água que bebemos. Isso vai além de partidarismo”. E lembrou que se de um lado os deputados aprovam um “libera geral” para a entrada de veneno (agrotóxico) no país, a cannabis – uma planta medicinal – continua sendo crime no Brasil. “Criminalizar a natureza para mim é um absurdo! Você não pode marginalizar e criminalizar uma planta! A cannabis é usada para fins medicinais há milênios. A ciência e a tecnologia, agora, vêm ampliando o uso da planta e centenas de pessoas podem se beneficiar dela”. 

Gadú contou que faz uso do canabidiol (CBD) para tratar ansiedade e depressão. Segundo a cantora, o óleo medicinal tem revelado ótimos resultados, sendo possível eliminar outros medicamentos alopáticos da sua vida. “Minha mãe também tem usado para bursite, minhas cachorras estão fazendo tratamento de câncer com CDB. Conseguimos muitas melhoras”, comemora. Maria Gadú ainda lembra que, no dia de mobilização em defesa da terra, nada mais apropriado do que destacar as propriedades regenerativas da cannabis. “Sabemos que essa planta é usada para regenerar solos degradados pela soja e por outros tipos de monocultura que empobrecem o terreno. É uma planta maravilhosa! Os parlamentares precisam regulamentar de uma vez por todas, pelo menos, a cannabis medicinal” cobrou a ativista.

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Além de novas regras que facilitam a entrada e reduzem o controle dos agrotóxicos no Brasil (PL 6.299: Lei dos Agrotóxicos), os manifestantes ainda questionam outros projetos de lei, como o que libera a mineração e altera a possibilidade de demarcação de terras indígenas (PL 490: Marco Temporal das Terras indígenas e PL 191: Garimpo em terras indígenas), o que reduz as exigências de licenciamento ambiental  (PL 2.159: Licenciamento Ambiental) e o que pode favorecer a grilagem de terras (PL 2.633 e PL 510: grilagem) no Brasil, garantindo anistia aos invasores.

(Créditos da imagem: Manuela Borges)

O cantor Nando Reis fez um discurso forte, disse que leis tão importantes para o meio ambiente não deveriam ser decididas no parlamento, mas por especialistas. “Esse pacote, as medidas que estão sendo sorrateiramente aprovadas em toque de caixa é uma barbaridade. A responsabilidade das senhoras e dos senhores senadores é imensa! O peso dessa desgraça (se aprovada) se abaterá sobre a consciência de todos vocês!”, profetizou. Sobre a criminalização da cannabis e a dependência de importação de insumos para a produção de medicamentos à base da planta no Brasil, Reis questionou a sanidade dos eleitos para representar a população. “Estamos de fato vivendo um surrealismo. A hipocrisia predomina nessa falta de responsabilidade e critérios. Veneno aprovam, planta medicinal criminalizam. É incompreensível”, concluiu indignado o cantor.

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Sob pressão, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, reconheceu que a questão do meio ambiental é crucial para o Brasil, inclusive se o país quiser sobreviver economicamente. Por outro lado, disse que o Congresso tem feito a sua parte, aprovando leis que limitam a produtividade e estabelecem cotas de preservação. “A Lei Ambiental dos crimes contra a flora e fauna brasileira é absolutamente rígida. O Brasil é um dos poucos países que um crime contra o meio ambiente pode ser atribuído a pessoa jurídica. Não podemos deixar de reconhecer os problemas que temos. É normal ter divergência de ideias. Mas o agronegócio tem servido ao mundo para garantir a segurança alimentar das pessoas”. Pacheco fez questão de citar o agronegócio, porque o setor vem sendo acusado de fazer lobby e pressão para aprovar o chamado “pacote da destruição”. Apesar de ter se mostrado sensível à pauta, Pacheco foi enfático: “O presidente do Senado pode muito, mas não pode tudo”.

Ao final da solenidade, ao ser questionado se o ato havia conquistado seu objetivo, o ator Lázaro Ramos disse que é uma pessoa de fé, e que acredita na mudança de postura dos parlamentares. “Essa sensibilização, ela é feita também com informações, hoje se inicia um processo que eu espero que seja contínuo para que a gente possa pensar tudo o que está em jogo”, alertou o artista. Já a atriz Letícia Sabatella foi mais enfática: “Nós vamos continuar mobilizando até conseguir, não vamos descansar”, sendo breve. 

(Créditos da imagem: Manuela Borges)

Se do lado de dentro do Congresso a ideia era conquistar a empatia dos legisladores sobre o tema meio ambiente, do lado de fora centenas de pessoas buscavam protestar para chamar a atenção de quem passava nas ruas da capital do país. Além de carro de som, gritos de ordem e música, a organização do vento também providenciou bichos gigantes da fauna brasileira para enfeitar o gramado da Esplanada. E surtiu efeito: “Não podemos mais aceitar calados. O que está em jogo é a nossa saúde e o planeta Terra. Eles vão ter que nos escutar”, disse a estudante Fabiana Andrade que decidiu aderir à manifestação quando viu o protesto na saída do trabalho. 

Do Salão Negro, os artistas, cantores e ativistas partiram ao encontro de milhares de manifestantes que aguardavam do lado de fora, no gramado em frente ao Congresso Nacional, já em protesto. A Esplanada foi tomada por gritos de ordem contra os congressistas, os projetos de lei em curso e contra o governo federal. A organização do evento também providenciou bichos gigantes da fauna brasileira para enfeitar o gramado da Esplanada e chamar a atenção de quem passava. Após os discursos, o ato deu lugar a uma série de shows. Ao anoitecer, as apresentações gratuitas atraíram ainda mais manifestantes. Os artistas fizeram questão de inserir no repertório músicas cujo tema é a proteção do meio ambiente. “O protesto está lindo! É muito emocionante ver as pessoas na rua pedindo em nome na mãe natureza! Esse ano tem eleições e precisamos escolher com sabedoria quem vamos colocar lá para nos representar. Quem se omite, permite. Não dá mais para deixar como está”, alertou a estudante Juliana de Oliveira.