
Cannabis e saúde da mulher: o que a ciência revela sobre climatério e menopausa
O que o sistema endocanabinoide tem a ver com o climatério?
Publicado em 24/08/2025
O aumento da expectativa de vida faz com que as mulheres passem cerca de um terço de suas vidas no período pós-menopausa. Essa fase, marcada pela queda de estrogênio e por flutuações hormonais, pode trazer sintomas que afetam sono, humor, sexualidade, energia e saúde óssea. Entre as abordagens complementares que vêm sendo estudadas para esse público está a modulação do sistema endocanabinoide (SEC) por meio de derivados da cannabis.
O que o sistema endocanabinoide tem a ver com o climatério?
O SEC é um complexo de receptores, moléculas sinalizadoras e enzimas que atua como “orquestrador” da homeostase — o equilíbrio interno do corpo. Ele influencia sono, apetite, dor, humor, memória e resposta imunológica. Durante o climatério e a menopausa, as mudanças hormonais também alteram o funcionamento do SEC, contribuindo para maior sensibilidade à dor, piora da qualidade do sono e alterações emocionais.
Como a cannabis pode ajudar
Pesquisas ainda iniciais, mas crescentes, sugerem que compostos como o canabidiol (CBD) e o tetrahidrocanabinol (THC) podem auxiliar no manejo de alguns sintomas:
- Distúrbios do sono – Ao modular receptores ligados ao ciclo sono-vigília e reduzir ansiedade, a cannabis pode favorecer noites mais reparadoras.
- Alterações de humor e ansiedade – O CBD interage com receptores serotoninérgicos, podendo contribuir para estabilização emocional.
- Ondas de calor e suores noturnos – Ao atuar no centro termorregulador do hipotálamo, os canabinoides podem amenizar sintomas vasomotores.
- Dor articular e muscular – Efeitos anti-inflamatórios e analgésicos auxiliam na redução do desconforto comum nesse período.
- Saúde íntima – Formulações tópicas à base de CBD e outros fitocanabinoides podem melhorar lubrificação, reduzir dor na relação e favorecer a saúde dos tecidos geniturinários.
Formas de uso e segurança
- Oral: óleos, cápsulas ou comestíveis, mais indicados para ansiedade, insônia e dor difusa.
- Tópica: cremes, géis ou óvulos, úteis para dor localizada e saúde íntima.
Sempre é fundamental iniciar com doses baixas e progressivas (“start low, go slow”), optar por produtos com controle de qualidade e manter acompanhamento médico, especialmente para mulheres que usam outros medicamentos.
O que ainda precisamos saber
Apesar dos relatos positivos e de estudos promissores, faltam ensaios clínicos robustos que definam posologias, combinações ideais de canabinoides e segurança no uso prolongado. Também é essencial que pesquisas incluam mulheres de diferentes idades, etnias e contextos de saúde.
A cannabis não é uma “cura” para o climatério ou a menopausa, mas pode ser uma aliada na melhora da qualidade de vida, quando usada de forma criteriosa e integrada a outras estratégias terapêuticas.
Referências
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- Bilkei-Gorzo, A. (2012). The endocannabinoid system in normal and pathological brain ageing. Philosophical Transactions of the Royal Society B: Biological Sciences, 367(1607), 3326–3341. https://doi.org/10.1098/rstb.2011.0388
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- M Kathryn Dahlgren, Celine El-Abboud, Ashley M Lambros, Kelly A Sagar, Rosemary T Smith, Staci A Gruber. A survey of medical cannabis use during perimenopause and postmenopause. Menopause 2022 Aug 2. doi: 10.1097/GME.0000000000002018. Online ahead of print.
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- Russo, E. B. (2016). Trends in Pharmacological Sciences, 37(7), 594–605.

Priscila Gava Mazzola*, é professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual de Campinas (FCF/Unicamp). Formada pela USP/SP, com doutorado em tecnologia-bioquímica farmacêutica e habilidades aprimoradas no MIT. Dra. Priscila também é especialista em medicamentos tópicos e transdérmicos, utilizando em seus trabalhos ativos naturais (inclusive resíduos) e sintéticos. Atualmente explora os poderes terapêuticos da cannabis medicinal, desenvolvendo novos medicamentos para ampliar o arsenal terapêutico nacional.