Explorando os vínculos históricos entre a cannabis e o câncer: O Caso da Princesa de Ukok

Explorando os vínculos históricos entre a cannabis e o câncer: O Caso da Princesa de Ukok

O processo de formação do câncer é chamado de carcinogênese ou oncogênese

Publicado em 15/01/2024

A Cannabis e o Câncer, coexistem na humanidade há milênios. O primeiro marco histórico da sinergia entre ambos os temas, sem dúvidas é a “Donzela do Gelo” ou Princesa de Ukok. A múmia de uma mulher, provável sacerdotisa do povo nômade Pazyryk no século V a.C., foi encontrada em uma tumba com outros artefatos, em 1993 na Rússia. Em  2014, uma pesquisa sugeriu que um câncer de mama, e ferimentos por queda, foram os responsáveis pelo óbito da jovem, aos seus vinte e poucos anos de idade. Entre os artefatos encontrados na tumba, havia um recipiente de cannabis próximo ao corpo. Será que a Cannabis estava sendo utilizada como tratamento deste câncer, ou para alívio dos sintomas? Possivelmente sim.

 

O processo de formação do câncer é chamado de carcinogênese ou oncogênese e, em geral, acontece lentamente, podendo levar vários anos para que uma célula cancerosa prolifere-se e dê origem a um tumor visível, podendo também ser rápidamente invasivo e destrutivo a depender da malignidade. Os efeitos cumulativos de diferentes agentes cancerígenos ou carcinógenos são os responsáveis pelo início, promoção, progressão e inibição do tumor.

 

O câncer surge a partir de uma mutação genética, ou seja, de uma alteração no DNA da célula, que passa a receber instruções erradas para as suas atividades. As alterações podem ocorrer em genes especiais, denominados protooncogenes, que a princípio são inativos em células normais. Quando ativados, os protooncogenes tornam-se oncogenes, responsáveis por transformar as células normais em células cancerosas.

 

No Brasil são esperados 704 mil casos novos de câncer para cada ano de 2024 e 2025, sendo 70% dos casos concentrados nas regiões Sul e Sudeste. O tumor maligno mais incidente no Brasil é o de pele não melanoma (31,3% do total de casos), seguido pelos de mama feminina (10,5%), próstata (10,2%), cólon e reto (6,5%), pulmão (4,6%) e estômago (3,1%).

 

O processo de formação do câncer é chamado de carcinogênese ou oncogênese

Lina Dantas
 

Um fenômeno fisiológico importante é a apoptose, ou a morte celular natural. Quando a célula sofre algum dano, quando atingida a maturidade ou expectativa da vida desta, é acionado dispositivos intracelulares que desencadeiam o processo apoptótico desejado, mantendo assim a homeostase daquele órgão ou sistema. Cada célula tem seu tempo específico de vida, enquanto uma hemácia vive cerca de 120 dias, um neurônio pode durar décadas.

 

A cannabis devolve às células cancerígenas a capacidade de sofrer apoptose, reduzindo a massa tumoral, além de diminuir a disseminação e oxidação das células cancerígenas em outros sítios, reduzindo as metástases. O processo metastático inclui a neoangiogênese, ou seja, a formação de novos vasos sanguíneos que por sua vez disseminarão ainda mais o tumor.

 

Estudos in vivo demonstram que os canabinóides reduzem o crescimento tumoral e as metástases, bem como a proliferação celular e a angiogênese nos animais pesquisados. Pacientes com tumores que expressam o gene CB2 tiveram sobrevida global, sobrevida específica do câncer e sobrevida livre de doença significativamente maior, além de apresentarem menos metástases linfonodais.

 

Congresso Brasileiro de Cannabis Medicinal

O principal congresso da América Latina de caráter científico e profissional, que busca trazer inovação e avanços relacionados à utilização medicinal da cannabis.  

 

Diversos artigos científicos apontam os efeitos antitumorais dos componentes da Cannabis e dos endocanabinóides. Foi demonstrado que os canabinóides têm vários efeitos na adesão das células tumorais à matriz extracelular (MEC). O canabidiol reduz a invasividade das células do câncer de mama ao inibir o Id-1, um inibidor dos fatores básicos de transcrição hélice-alça-hélice envolvidos na progressão do tumor.  O CBD também reduz o crescimento e o tamanho do tumor e diminui o número de metástases pulmonares. O THC diminui o tamanho do tumor, o número de metástases tumorais, inibe a proliferação celular e a angiogênese em um modelo animal de câncer de mama metastático. Esta inibição da proliferação celular envolve os receptores CB2, mas não os receptores CB1.

 

Os endocanabinóides possuem efeitos citotóxicos e citostáticos, que provocam a  indução da apoptose e efeitos anti metastáticos, como inibição da neoangiogênese e migração de células tumorais através da ativação dos receptores CB1, CB2, e TRPV1m e outros mecanismos não totalmente elucidados. O endocanabinóide anandamida (AEA) e o fitocanabinoide canabidiol (CBD), possuem efeitos independentes dos receptores CB1 e CB2. O endocannabinoide 2-AG inibe a invasão de células cancerígenas da próstata independentes de andrógenos através da ativação do receptor CB1.

 

medical cannabis fair

 

Rick Simpson, um engenheiro canadense, ativista e cultivador de Cannabis desde os anos 90, teve sucesso em curar suas feridas oncológicas na pele, com um extrato integral de cannabis full spectrum (Full Extract Cannabis Oil- FECO). O Oleo ou extrato concentrado do Rick Simpson, ficou internacionalmente conhecido como RSO (Rick Simpson Oil),  mas ele se recusou a patentear essa nomenclatura por argumentar que a Cannabis é um patrimônio da humanidade.Rick Simpson passou a ser buscado por um número cada vez maior de pessoas e em 2019 o protocolo “Rick Simpson” era a única referência do uso antitumoral da Cannabis. O protocolo preconizava 60 ml de extrato puro de Cannabis, ou seja antes da diluição, em 90 dias. Além de seguidores, Rick Simpson ganhou muitas críticas por não ter o respaldo de evidências científicas satisfatórias, bem como por utilizar solventes tóxicos na extração (nafta), que pode provocar intoxicação.

 

Dr. Joe D. Goldstrich, MD publicou o recente Best Seller da Amazon, “ The Cannabis Cancer Collection” ainda disponível somente em inglês. Neste livro, o Dr. Goldstrich embasado com sua experiência clínica, com mais de 3000 casos de pacientes oncológicos no tratamento do Câncer, e uma vasta revisão de literatura, detalha protocolos de tratamento com a Cannabis para cada tipo de Câncer, a ser complementar ao tratamento oncológico alopático indicado. Neste livro há indicação de altas dosagens de Canabidiol, Cannabigerol e Delta-9 Tetrahidrocanabinol, além de outros compostos da planta como as formas ácidas dos canabinóides e terpenos, em especial o beta-cariofileno. Recomendo esse livro a todo oncologista, a todo médico prescritor de Cannabis e interessados pelo tema.

 

Graças a conexão do professor Dr. Harry McIlroy, me conectei online ao Dr. Joe D. Goldstrich, MDem março de 2023 e tive a oportunidade de acessar seu manuscrito antes de ser publicado. Com o nome de “Cannabis Kills the Cancer”, a obra enfrentava dificuldade para conseguir ser publicada. Graças a este livro, pude ter ainda mais resultado com os pacientes oncológicos no tratamento com a Cannabis Medicinal. Todos que atendi em 2023, que estão seguindo os protocolos do Dr. Goldstrike, estão tendo resultados satisfatórios, sem exceção. Alívio da dor, da náusea, aumento da vitalidade, melhora da qualidade de vida, redução da massa tumoral e metástases e maior resiliência ao tratamento oncológico indicado para cada caso. São sinceros os agradecimentos pelo trabalho do Dr. Joe D. Goldstrich, MD e de toda cadeia de conexões que fizeram essa obra chegar até meus olhos.

 


 

 

 

Sem dúvidas ainda existem muitos detalhes moleculares a serem elucidados, e mais pesquisas precisam ser realizadas. Contudo, com o que já temos de resultados e evidências científicas, que não são poucas, já podemos trabalhar, e nos impulsionar a saber mais sobre o tema. Considerando que a Cannabis não tem overdose documentada, nem efeitos colaterais lesivos ou irreversíveis, seu uso como tratamento é seguro, eficaz e indicado para complementar o tratamento contra o Câncer. Considero a presença do oncologista no acompanhamento desses casos, tão indispensável quanto o uso associado da Cannabis Medicinal no tratamento oncológico tradicional. Recordando ainda dos efeitos antitumorais dos endocanabinóides, concluo que todas as práticas que reforçam a síntese dos nossos canabinóides humanos, são bem vindas. Uma alimentação saudável, preferencialmente orgânica, massagem, acupuntura, meditação, respiração, suplementação vitamínica (PEA, Ômega 3), aromaterapia, entre outras técnicas, mas principalmente a vontade de viver e superar, permite que a vida que ainda habita, transcorra com o máximo de consciência e contentamento possível, suavizando todo um processo de tratamento que costuma ser denso e sofrido, para o indivíduo e seus familiares.

Imagem do colunista Lina Dantas
Lina Dantas

Dra. Lina (Carolina Dantas) CRM 23322 é médica, graduada pela EBMSP BA há 12 anos. Estudiosa e pesquisadora da Cannabis Medicinal e CBD há 5 anos. Pós Graduada em Cannabis Medicinal- Unyleya, com certificação de prescrição internacional de Cannabis WeCann Academy. Supervisora do Programa Mais Médicos há 6 anos, atua no SUS, com as Práticas Integrativas Complementares. Fundadora da UNO Clinic Brasil, vem se dedicando aos modelos de assistência e saúde Integrativa.