Dia das Mães: maconha uniu mãe e filho para combater tumor e preconceito

Gizele tem um tumor cerebral intratável; Raul é o 'jardineiro'

Publicada em 08/05/2020

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Por Caroline Apple

De um lado, uma biomédica nascida e criada em berço conservador que lhe ensinou que maconha era coisa de “drogado que vendia as coisas em casa para manter o vício”, do outro, um filho progressista, que mesmo sem ainda saber plantaria maconha para tratar a mãe, via com bons olhos os resultados de estudos e pesquisas a respeito dos benefícios da Cannabis.

E foi a partir do diagnóstico de um tipo de tumor cerebral intratável que a vida da família cruzou com a milenar história da Cannabis.

A biomédica Gizele Thame, de 61 anos, mudou completamente quando soube que um tumor no cérebro de 1,2 cm estava estacionado perto da sua hipófise e do nervo óptico. Mas a mudança não era só o fato de o tumor ter sido diagnosticado. Thame passou a conviver diariamente com todas as consequências geradas pela doença: medos, falta de sono, depressão, irritabilidade. Então, além de ter que lidar com o fato de ter um tumor que o único tratamento seria a intervenção cirúrgica, que poderia deixar sequelas graves, a biomédica e toda sua família lidavam todos os dias com essa “nova Gizele”.

O empresário Raul Thame de Toledo Almeida, de 36 anos, nãoconseguia mais ver sua mãe “desaparecendo” diante da doença e, então, decidiuapresentar a Cannabis como alternativa para tratar o que até então era consideradointratável. Raul conta que não foi fácil convencer sua mãe, que tinha um perfilabstêmio até mesmo quando o assunto era alopatia.

Cannabis é maconha?

Quando Raul levou a alternativa para mãe, Gizele aceitou seinformar, mas isso sem relacionar que Cannabis era, na verdade, maconha. Quandosoube, “quase caiu para trás”. Como uma senhora de quase 60 anos virariamaconheira a essa altura da vida?, ela se perguntou. Seu preconceito era grande,mas sua curiosidade foi maior diante dos artigos e depoimentos que seu filholhe enviava para estudo.

E foi a partir da história de uma mãe norte-americana quenarrava a redução do tumor cerebral da sua filha de quatro anos que a decisãofoi tomada. Raul se espantou com a decisão da mãe, mas tinha uma esperança delaaceitar o tratamento. Por isso, foi plantando algumas mudas escondidas em suacasa, deixando os vasos na laje.

Gizele e Raul partiram para a primeira consulta com uma médica prescritora de Cannabis. Porém, era uma psiquiatra, e a biomédica não entendia como ela poderia ajudar, afinal, ela tinha um tumor. Não seria necessário ir a um neurologista?

Chegando lá, Gizele entendeu. Seu caso era até então intratável, mas todo o universo de doenças e danos psicológicos e emocionais poderiam ser aliviados com a Cannabis. E assim aconteceu. Ao tomar o óleo, a primeira melhora foi na qualidade do sono. A depressão se foi. A amorosidade foi voltando. A irritabilidade sendo deixada de lado. Florescia junto com as plantas uma nova oportunidade de vida para a biomédica e sua família.

A cada seis meses, Gizele faz uma ressonância para ver o estado do tumor. Em um ano e meio usando Cannabis, o tumor se manteve estacionado. Entretanto, dois anos depois de começar o tratamento, a ressonância apontava o que até então parecia improvável: uma remissão de 1,2 x 0,8,x 0,8 cm para 0,7 x0,4 x 0,8 cm.

A família não teve dúvidas. Estava na hora de entrar para a legalidade e plantar maconha para produzir mais óleo e sair do receio de que a polícia baixasse na porta e levasse todo mundo para cadeia.

Então, depois de todo o processo burocrático, conseguiram um HC (Habeas Corpus) para plantar. Quem cuida do ‘jardim’ e faz a extração é o Raul, que hoje, mais do que nunca, é ativista pelo direito de que as pessoas possam plantar livremente maconha em suas casas. Gizele não mexe diretamente nas plantas, mas rega e conversa com elas, e usa sua história para inspirar outras pessoas, assim como um dia foi inspirada pela história de uma jovem garotinha que vive a centenas de quilômetros da sua casa.

Neste Dia das Mães, mãe e filho têm a chance de comemorar mais uma data como essa longe do fantasma da depressão, da frustração e do medo da morte iminente e ainda, de presente, lidar com o fato de que a Cannabis é uma esperança para que o tumor siga reduzindo de tamanho.