O futuro do mercado da cannabis medicinal no Brasil
Os negócios da planta direcionados à saúde são destaque em todo o mundo; o setor ganha espaço no país
Publicada em 02/03/2023

Por Norberto Fischer
A legislação brasileira ainda é bastante restritiva em relação à planta, mas nos últimos anos houve avanços significativos.
Em dezembro de 2019, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a regulamentação para a venda de medicamentos à base de cannabis em farmácias, mediante prescrição médica, abrindo as portas para a importação de produtos e uso científico em solo nacional.
Ainda assim, a regulamentação não autoriza o cultivo da planta para fins medicinais .
Isso significa que as empresas que desejam produzir medicamentos à base de cannabis no país ainda dependem da importação de matéria-prima.
Além disso, a Anvisa é criticada por limitar o acesso dos pacientes a medicamentos à base de cannabis, devido a restrições como a proibição da prescrição de produtos com mais de 0,2% de THC, o principal componente psicoativo da planta.
Mesmo diante desse cenário, o mercado tem apresentado um crescimento significativo.
Segundo a Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace Esperança), a demanda pelos produtos à base de cannabis para pacientes com epilepsia e outras condições tem crescido cerca de 20% ao mês.
O número de pacientes autorizados pela Justiça a cultivar a planta em casa também vem aumentado significativamente.
Em contrapartida, a falta de regulamentação específica para o cultivo de cannabis medicinal é um dos principais obstáculos para o desenvolvimento da indústria.
Apesar disso, algumas empresas estão investindo no Brasil com o objetivo de se preparar para o mercado futuro, é o caso da canadense Tilray que, em 2019, inaugurou uma fábrica em Cantanhede, no Maranhão, para produzir óleos e cápsulas de cannabis para uso medicinal.
Outras empresas têm mostrado interesse nesse segmento
A canadense Canopy Growth, uma das maiores produtoras de cannabis do mundo, anunciou em 2020 a aquisição da empresa brasileira de pesquisa médica Beckley Canopy Therapeutics, em uma parceria com a Beckley Foundation, liderada pela ativista pela reforma da política de drogas, Amanda Feilding.
Outro ponto importante para o futuro do mercado de cannabis medicinal no Brasil é a conscientização sobre os benefícios terapêuticos da planta.
Ainda existe muito estigma em relação ao uso da cannabis para fins medicinais e muitos pacientes têm medo de buscar tratamento com a planta devido à possibilidade de criminalização.
Por isso, é importante que a sociedade e os profissionais de saúde sejam informados sobre os benefícios do tratamento para diversas condições médicas, como dor crônica, epilepsia, ansiedade e distúrbios do sono.
Nesse momento, é importante que se mantenham os investimentos em pesquisas sobre a eficácia e segurança desses medicamentos.
Pois, embora existam milhares de evidências de que a planta é eficaz no tratamento de várias condições médicas, os políticos contrários ao avanço do tema afirmam que há poucos estudos clínicos que justifiquem avançar na regulamentação do mercado e no plantio nacional.
O investimento em pesquisas ajudará a aumentar a aceitação da cannabis medicinal entre os profissionais de saúde e a sociedade em geral.
Outro desafio é a complexidade do processo de importação de medicamentos à base de cannabis.
A regulamentação da Anvisa estabelece que os produtos à base de cannabis importados devem ser registrados no país de origem e certificados por autoridades sanitárias estrangeiras, apesar disso, o produto deve ser novamente avaliado e liberado pela ANVISA aqui no Brasil.
É importante destacar o fato de que o mercado de cannabis medicinal no Brasil ainda enfrenta muitos desafios legais, pois embora a legislação brasileira permita o uso medicinal da cannabis em casos específicos, a planta ainda é considerada uma substância ilícita, o que pode gerar insegurança jurídica para empresas e pacientes.
Em complemento, a falta de regulamentação específica para o cultivo da planta pode dificultar a produção nacional de medicamentos em larga escala.
Ainda com esses obstáculos, o olhar mais amplo e estratégico indica o forte potencial do mercado.
Apesar de enfrentar desafios regulatórios e sociais, o mercado brasileiro deve superar as melhores expectativas e continuará a ser impulsionado pela demanda crescente por tratamentos alternativos e pela ampliação da aceitação dos benefícios terapêuticos da cannabis.
Com a regulamentação do cultivo da planta no Brasil, quando ocorrer, provavelmente o mercado brasileiro se tornará em pouco tempo um dos mais importantes players na indústria global de cannabis medicinal e industrial.
As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e de responsabilidade de seus autores.
Norberto Fischer é pai de Anny Fischer, primeira brasileira autorizada legalmente a importar o extrato da maconha para uso medicinal. Tornou-se articulador político no Brasil, com repercussão internacional, destacando-se no ativismo pelo direito ao acesso, distribuição pelo SUS, custeio dos tratamentos pelos planos de saúde, plantio e produção nacional por empresas, ONGs e autocultivo.