Baviera quer proibir consumo de cannabis na Oktoberfest 2024

Segundo a organização, objetivo é manter caráter familiar do festival após legalização parcial da maconha na Alemanha e restringir uso nos espaços públicos

Publicada em 17/04/2024

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As autoridades do estado da Baviera anunciaram nesta terça-feira (16/4) que será proibido o consumo de cannabis na Oktoberfest de 2024 em Munique. A decisão segue a legalização parcial da maconha para uso pessoal em todo o país, a partir de abril.

A medida, se confirmada, proíbe o uso de maconha nos biergarten, festivais públicos e terraços dos restaurantes. Segundo nota divulgada pelo governo bávaro, o objetivo é “limitar o consumo público de cannabis, apesar da lei de legalização do governo federal”.

Clemens Baumgärtner, diretor da Oktoberfest, afirmou ao portal Web.de que “um festival familiar como a Oktoberfest e o consumo de cannabis não combinam”. Baumgärtner é membro da União Social Cristã (CSU), partido conservador que governa o estado da Baviera e integra a oposição no âmbito federal, tendo se manifestado contra a legalização.

O governador bávaro, Markus Söder, também membro da CSU, ressaltou a importância de reforçar a proteção de crianças e jovens. A secretária da Saúde do estado, Judith Gerlach, destacou que a medida visa proteger a saúde, especialmente dos jovens e crianças.

A nova lei federal, que legaliza o uso recreativo da cannabis na Alemanha, permite que maiores de 18 anos portem até 25 gramas de cannabis, cultivem até três plantas para uso pessoal e armazenem até 50 gramas da erva seca em casa. Além disso, clubes de cannabis com até 500 membros poderão cultivar e distribuir a substância a partir de julho.

Os 16 estados alemães têm autonomia para decidir como aplicar as novas regras.

O que dizem os críticos? 

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Adriana Russowsky

Adriana Russowsky, farmacêutica e colunista do Sechat, criticou a decisão, mesmo com o argumento de preservação da cultura familiar do país, e destacou que a cannabis ainda é vista de maneira marginalizada, mesmo com os avanços do uso medicinal e da produção de alimentos à base da planta em vários países europeus.

“Culturalmente, o consumo de álcool está enraizado na tradição alemã e belga. As crianças, a partir de 8 anos, já estão sentadas à mesa com os pais consumindo cerveja. Isso é saudável? Sabemos que não, mas é um costume cultural”, comenta Adriana.

Quanto à proibição da cannabis, Adriana observa que isso se assemelha ao movimento de contracultura e a marginalização da planta. “Se essa decisão é politicamente correta? Eu diria que não. Quando avaliamos a situação, especialmente em um festival como a Oktoberfest, precisamos ter uma visão mais abrangente”, afirma.

Comparando a situação com a do Brasil, onde esses costumes não são comuns, Adriana sugere que talvez fosse necessário restringir o acesso a todas as substâncias sob a ótica da coerência. “No Brasil, por exemplo, como não temos nenhum desses costumes, não deveríamos ter acesso ao cigarro, bebida alcoólica e nem mesmo à maconha. Ou então, deveríamos liberar tudo”, completou.

 

Cannabis desprotege as crianças, mas a cerveja não?
 

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Clayton Medeiros 

Segundo o advogado Clayton Medeiros, a proibição na Baviera se apoia no histórico marginalizado da cannabis e permeia o pensamento conservador, muito típico do Estado. "Na Alemanha, os estados possuem autonomia para aplicar uma lei federal, principalmente em ambientes privados. O que chama a atenção é a conclusão de que a cannabis desprotege as crianças, mas a cerveja não. O ambiente alcoólico é mais propício à ocorrência de brigas e outras situações, como visto na Oktoberfest de Blumenau em 2023, quando algumas pessoas foram expulsas. Outro fator importante é que, em países onde a cannabis é legalizada, o consumo de cerveja diminui, o que pode parecer negativo para o evento e para o Estado em um primeiro momento, já que se trata de um ambiente turístico. No entanto, a autorização do uso de cannabis dentro do evento seria mais lucrativa e harmônica", opinou. 


Qual o risco do consumo de bebida alcoólica? 

A médica Natália Candiago criticou a decisão de proibir o uso de cannabis em um evento no país que, por outro lado, permite o consumo ilimitado de álcool. Ela argumenta que tal medida é contraditória, pois a cannabis já está regulamentada no país e é mais coerente com o objetivo de manter um ambiente familiar do que o uso de álcool, uma substância que está associada a graves impactos na saúde e à ocorrência de violência.

"É contraditório proibir o uso de cannabis em um evento, mesmo sendo regulamentada no país, com o argumento de manter um ambiente familiar, em um festival que permite o uso ilimitado de uma substância responsável por 2,8 milhões de mortes anuais em todo o mundo, além de estar associada a mais de 200 doenças e presente em cerca de 15% a 66% de todos os homicídios e agressões graves, assim como em aproximadamente 13% a 50% dos casos de estupro e abuso sexual. Portanto, esse ambiente não pode ser naturalizado como familiar."