O cânhamo e o meio ambiente

O cultivo de cânhamo, desde que orgânico, pode ser vantajoso com relação ao cultivo de algodão em monocultura por utilizar menos recursos hídricos e pesticidas

Publicada em 31/01/2025

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Imagem Ilustrativa: Canva Pro

Por Konstantin Gerber

A Federação Internacional de Associações de Cânhamo (“FIHO”) recomenda que a regulação de cânhamo o reconheça como produto agrícola, diferenciando os cultivos conforme a finalidade industrial: fibra, grão e flores e folhas do topo.

Atualmente o cânhamo está inserido na política agrícola comum da União Europeia, que prevê utilização de sementes certificadas conforme catálogo de variedades de plantas agrícolas, não podendo ultrapassar 0,3% de tetrahidrocanabinol (“THC”), com fiscalização após a floração. Quem o cultiva presta um serviço ambiental, recebendo um valor por isto, em se tratando de prática agrícola benéfica ao clima e ao meio ambiente.

O cultivo de cânhamo, desde que orgânico, pode ser vantajoso com relação ao cultivo de algodão em monocultura por utilizar menos recursos hídricos e pesticidas. Vale lembrar que o algodão orgânico também é alternativa para diminuição do uso de recursos hídricos. O debate sobre fibras vegetais demanda discutir condições de trabalho digno, bem como técnicas não agressivas de agricultura. Por sua vez, o cânhamo tem a aptidão de melhorar o solo e proteger da erosão com seu sistema radicular profundo, desde que cultivado corretamente, por meio de rotação de com outras culturas, dispensando herbicidas, fertilizantes químicos e favorecendo as abelhas.  

O cânhamo pode captar bastante carbono, porém a depender do produto final como é o caso do têxtil há que se calcular a emissão de carbono quando de sua compostagem. A biodegrabilidade é possível, o que demanda também tecnologia apropriada de processamento das fibras.

Estes detalhes do cultivo e do processamento são importantes como destaca Eduarda Bastián, pois quem já comercializa produtos de cânhamo importados no Brasil alegando sustentabilidade é preciso que se comprove os benefícios ambientais para todo o ciclo produtivo do cânhamo para não praticar o greenwashing. Na língua portuguesa: rotulagem ou declaração ambiental sem comprovação técnica se conhece como propaganda abusiva e/ou também enganosa.

Na Colômbia, já existe regulamentação dos esquemas associativos de pequenos produtores para que pelo menos dez por cento da cota de produção de cânhamo seja adquirida por titulares de licenças de fabricação de derivados de cannabis.

No Brasil, aguarda-se regulamentação do cânhamo pelo Ministério da Agricultura e também no que se refere ao cultivo com fim de insumo farmacêutico pela Anvisa. De se garantir o plantio pela agricultura familiar com assistência técnica para boas práticas agrícolas.

Do cânhamo também se faz energia, biocombustível, porém isso não significa repensar os gastos energéticos de todo e qualquer processo produtivo. Não basta mitigar as emissões de carbono na atmosfera. A transformação ecológica da economia requer metas de descarbonização.

Quem capta carbono, conserva e melhora o solo presta um serviço ecossistêmico. Agricultores familiares, comunidades tradicionais, povos indígenas, cooperativas e associações civis têm prioridade no programa federal de pagamento de serviços ambientais. Considerando que o setor agropecuário ficou de fora do mercado regulado de carbono, por ora é possível pensar em pagamento de serviços ambientais para cultivo de cânhamo que preservem recursos hídricos e conservem solos por meio do manejo agroflorestal.

Com efeito, seria bem-vinda rubrica orçamentária para política federal de serviços ambientais para cultivo autorizado de cânhamo com incentivo a pequenos cultivos orgânicos para instituição de ambientes regulatórios experimentais com promoção à inovação para desenvolvimento de insumos farmacêuticos, sementes, mudas, produtos duráveis e compostáveis de cânhamo.


*Konstantin Gerber, advogado, doutor em Direito, PUC-SP. Membro da Associação Brasileira de Estudos da Cannabis (SBEC) | O artigo não reflete, necessariamente, a opinião do portal Sechat.


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