O cânhamo têxtil: perspectivas e desafios para um futuro mais sustentável
Eduarda Bastian, do Fibershed Brasil, fala sobre as potencialidades e barreiras do cânhamo na indústria têxtil e destaca a necessidade de práticas sustentáveis no cultivo.
Publicada em 03/01/2025
Imagem Ilustrativa: IA
Não é de hoje que se diz que o cânhamo têxtil tem se destacado como uma solução promissora para o setor de moda e agricultura, oferecendo vantagens ambientais e produtivas em comparação ao algodão. Com menor consumo de água, maior resistência a pragas e alto rendimento por hectare, a fibra vem conquistando atenção como uma alternativa sustentável. Entretanto, desafios relacionados à regulamentação, infraestrutura e conscientização do consumidor ainda precisam ser enfrentados para consolidar o cânhamo como protagonista na indústria têxtil brasileira.
As vantagens do cânhamo sobre o algodão
Eduarda Bastian, do Fibershed Brasil, ONG dedicada ao fortalecimento de sistemas têxteis regenerativos e circulares, com foco em materiais-primas locais e mão de obra loca, destaca que o cânhamo possui características agronômicas que podem superar as do algodão em termos de sustentabilidade: “No geral, em relação ao contexto na produção de cânhamo e de algodão, diversos estudos confirmam que o cultivo do cânhamo industrial de fato necessita de menos água que o cultivo do algodão. É uma planta com maior rendimento de fibra por hectare e com baixa necessidade de insumos agrícolas”.
Porém, ela alerta que “a verdadeira sustentabilidade do cânhamo depende de práticas agrícolas responsáveis e ecológicas”. Dados do Instituto Ficus corroboram essa perspectiva, apontando que o cânhamo pode regenerar solos degradados, capturar até 16 toneladas de carbono por hectare e reduzir significativamente a pegada ecológica em comparação a outras culturas convencionais.
Barreiras para a adoção em larga escala
Quando questionada sobre as barreiras para a adoção do cânhamo na indústria têxtil, Eduarda aponta para a legislação e a infraestrutura como os principais desafios: “O principal desafio enfrentado pela indústria relacionado à produção de fibras de cânhamo se relaciona com questões legislativas, na maioria dos países, além de questões técnicas (muitos países, como o Brasil, não possuem maquinário adequado para o beneficiamento das fibras de cânhamo)”.
Essa falta de maquinário reflete um problema identificado no relatório do Instituto Ficus, que aponta para a ausência de uma cadeia produtiva robusta no Brasil. Segundo o relatório, o país possui condições climáticas ideais para o cultivo, mas carece de infraestrutura e políticas públicas que fomentem o desenvolvimento do setor. Além disso, a fragmentação do mercado e a falta de incentivos governamentais são apontados como barreiras significativas.
Moda e conscientização ambiental
Eduarda também reforça a importância da moda como ferramenta de conscientização: “O cânhamo tem potencial de ser protagonista na conscientização de questões ambientais - desde que cultivado de maneira correta”. Ela explica que a maioria dos tecidos de cânhamo atualmente utilizados passa por processos para se misturar ao algodão, o que pode comprometer parte dos benefícios sustentáveis da fibra: “Esse processo não só enfraquece e elimina da fibra várias características que seriam sustentáveis, mas também aumenta a pegada de carbono do material”.
O Instituto Ficus enfatiza que a transparência na cadeia produtiva e a adoção de padrões sustentáveis são cruciais para que o cânhamo realmente contribua para uma moda circular e regenerativa.
Estratégias para ampliar a percepção do consumidor
Questionada sobre como aumentar a conscientização do consumidor sobre o cânhamo, Eduarda destaca: “Para que a indústria aumente essa percepção, são necessárias mais informações baseadas em dados científicos para evitar o greenwashing”. Ela sugere que a indústria invista em educação do consumidor e parcerias com agricultores locais para promover práticas sustentáveis.
Dados do Instituto Ficus também apontam que campanhas de conscientização e incentivos fiscais poderiam impulsionar o consumo de produtos de cânhamo no Brasil, ajudando a desmistificar a planta e ampliando sua aceitação.