Cannabis associada aos opioides ou álcool pode afetar reflexos e elevar níveis de sedação

Qual a interação da maconha com o efeito da anestesia? Paciente deve ficar por 24-72 sem uso antes da cirurgia. Entenda

Publicada em 27/11/2023

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Por Leandro Maia

A cannabis traz diversos benefícios para a saúde, proporcionando alívio à dor crônica, insônia e auxiliando no enfrentamento de condições como ansiedade, depressão e Transtorno de Estresse Pós-Traumático, permitindo uma avaliação mais plena da vida. Entretanto, é necessário destacar que a interação da cannabis com outros medicamentos pode ser complexa e, em determinadas situações, apresentar riscos consideráveis, especialmente no contexto da anestesia durante procedimentos cirúrgicos.

A fase de preparação para a cirurgia, naturalmente repleta de apreensões, torna-se ainda mais desafiadora diante da necessidade de considerar uma rotina de consumo de cannabis. Nesse sentido, abordaremos a importância crucial de informar ao anestesista sobre o uso da substância, bem como os diferentes métodos de consumo de cannabis e seu impacto na anestesia. Essa comunicação eficaz visa minimizar os riscos potenciais e prevenir complicações durante o procedimento cirúrgico.

Portanto, é essencial compreender a delicada interação entre cannabis e anestesia, ao mesmo tempo em que se estabelece um diálogo aberto com a equipe médica. Essas informações contribuem para um ambiente cirúrgico mais seguro, permitindo que os pacientes enfrentem o processo com maior tranquilidade e confiança.

Daniele Tondolo, médica. Foto | Arquivo Pessoal

De acordo com a anestesista Daniele Tondolo, ainda não existem muitos estudos direcionados para avaliar os níveis de complicações do uso de cannabis durante a anestesia.

"Os estudos existentes afirmam que o uso crônico de cannabis na forma inalatória pode cursar complicações respiratórias e cardiovasculares importantes nos períodos intra e pós-operatório. A recomendação é que o uso dos derivados canabinoides seja suspenso por 7 dias antes do procedimento cirúrgico, retomando 48h após, dependendo do nível de complexidade da cirurgia. Com o aumento do conhecimento dos canabinoides no corpo humano é possível entender que os mesmos podem ser benéficos e auxiliar na recuperação, interferindo de maneira positiva na cicatrização, desinflamação e controle da dor", afirmou.

Como os produtos da cannabis como o CBD e THC impactam a anestesia de maneira diferente

Em entrevista publicada no Portal Sechat, o Dr. Daniel King, membro da Associação Americana de Enfermeiros Anestesistas (AANA), explicou que existem muitas diferenças entre o impacto do THC e do CBD na anestesia. Em particular, os efeitos entre os dois nos sistemas cardiovascular e gastrointestinal são virtualmente opostos.

“O THC tem maior probabilidade de levar a ritmos cardíacos acelerados e pressão alta, enquanto o CBD diminui a frequência cardíaca e a pressão arterial”, disse King.

“No sistema gastrointestinal, o THC estimula o apetite, mas também foi associado à diminuição da motilidade gástrica com o uso de longo prazo – isso pode aumentar o risco de eventos adversos, como pneumonia por aspiração.”

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Segundo King, o THC é decomposto no corpo por um processo celular semelhante ao das drogas anestésicas comuns. Por isso, existe a preocupação de que uma alta tolerância ao THC possa exigir doses mais altas de anestesia.

King observou que “atualmente não temos o nível de evidência pesquisada disponível para fornecer recomendações formais para o uso de um ou de outro no período pré ou pós-operatório”.

Por exemplo, está revisão científica cita mais de um estudo no qual os consumidores de cannabis exibiram pontuações mais altas de dor e uma maior necessidade de medicamentos analgésicos após a cirurgia. Mais pesquisas sobre como o THC interage com as drogas anestésicas são definitivamente necessárias.

Como diferentes métodos de consumo de cannabis podem afetar a anestesia


Os provedores de anestesia estão intimamente familiarizados com a anatomia e a fisiologia das vias aéreas, já que os pacientes requerem rotineiramente procedimentos como intubação e ventilação mecânica durante a cirurgia. A gestão do sistema respiratório no que se refere ao fumo ou vapor de cannabis é uma grande preocupação.

“Pacientes que fumam ou vaporizam podem ter maior incidência de sintomas como tosse, respiração ofegante ou espasmo das cordas vocais e pequenas vias respiratórias”, disse King. “A cannabis queima a uma temperatura mais alta do que os cigarros. Isso pode levar ao potencial de enfraquecimento dos revestimentos das vias aéreas e até mesmo de possíveis cicatrizes no tecido pulmonar ao longo do tempo. Tudo isso torna o manejo respiratório mais preocupante se o paciente fuma ou vaporiza produtos quando comparado ao consumo oral.”

King fornece algumas recomendações básicas para consumo pré e pós-operatório. “Abstenha-se de usar a cannabis vaporizada ou fumada por 24-72 horas antes da cirurgia para diminuir a reatividade das vias aéreas e melhorar a cicatrização de feridas. Mas, de preferência, fique sem a cannabis pelo maior tempo possível”.

Portanto, os pacientes não devem retomar o consumo de cannabis até que os efeitos de seus anestésicos e analgésicos tenham passado completamente após a cirurgia.

Além disso, misturar cannabis com opioides ou álcool pode causar diminuição dos reflexos e aumento dos níveis de sedação, além de comprometer a memória e a função cognitiva, de acordo com King.