Registros e patentes “made in Brazil”

Em sua nova coluna para o Sechat, Marcelo De Vita Grecco analisa os benefícios da adoção de um modelo eficiente de patentes e registros, visto o protagonismo crescente que o Brasil vem obtendo no desenvolvimento de pesquisas e inovações do mercado da

Publicada em 13/05/2021

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Coluna de Marcelo De Vita Grecco*

Abordar patentes e registros parece árido demais à primeira vista, mas buscarei óticas que estabelecem conexões com tudo o que buscamos de mais prático para o desenvolvimento do ecossistema da indústria legal da cannabis no Brasil. Sempre defendo que o melhor caminho para consolidar a cadeia produtiva em torno da cannabis passa por inovação. Nesse sentido, ter um modelo sistematizado e eficiente de patentes e registros traz proteção e segurança para as organizações que concebem e desenvolvem produtos inovadores.

Apesar do Brasil estar aquém do cenário mais favorável para a indústria legal da cannabis, encontrado em países mais desenvolvidos, existe uma movimentação efervescente por aqui.

Apesar do Brasil estar aquém do cenário mais favorável para a indústria legal da cannabis, encontrado em países mais desenvolvidos, existe uma movimentação efervescente por aqui. Segundo o relatório Pesquisa, Inovação e Tendências de Mercado, focado exclusivamente no mercado da cannabis, com dados da Clarivate e Derwent, adaptado para o Brasil pela The Green Hub, o País está entre os dez com mais proteção à inovação. Esse movimento tem grande relação com registros no mercado doméstico, mas é importante ter esse sistema funcionando bem para proteger as inovações.

No Brasil, todo o movimento em prol da exploração da cannabis sempre foi muito enraizado em questões do uso medicinal. Desta forma, os primeiros avanços efetivos ocorreram a partir do momento em que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamentou, por meio da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 327/2019, procedimentos para a autorização de fabricação, importação, prescrição, comercialização e fiscalização de produtos à base de cannabis para fins medicinais.

Essa liberação revelou importante horizonte em relação às patentes, pois a indústria farmacêutica ainda domina o setor. Esse segmento tem empresas que investem fortemente em pesquisa e desenvolve tecnologias, ávidas por sair à frente com suas patentes. A partir daí, temos uma corrida em ascensão. Atualmente, existem cerca de 100 pedidos de patente no Brasil relacionados à cannabis e fitocanabinoides.

Só para não deixar passar em branco, haveria muito mais pedidos de patentes e registros se não tivéssemos um verdadeiro imbróglio criado deliberadamente no Brasil, a partir de posicionamentos políticos-ideológicos, deixando à margem do processo o fator mais importante: as evidências científicas. O mercado também é mantido fora dos debates. Alguém duvida que esses dois aspectos podem tornar qualquer regulamentação ineficiente? Ontem, tivemos mais um capítulo que exemplifica a confusão premeditada, com novo adiamento da votação do Projeto de Lei 399/15, que regulamenta o cultivo da cannabis para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais.

Trazendo os reflexos dessa morosidade negligente na regulamentação e da relação do sistema de patentes e registros com o mundo real, as indefinições prejudicam, por exemplo, o acesso da população às medicações. Por outro viés, retarda o desenvolvimento do mercado no País, atrasando evoluções tecnológicas e conquista de projeção econômica, que geraria novos negócios, receitas e arrecadação de tributos.

Pioneirismo brasileiro

Ao pensar em inovação e patente de novos produtos e serviços, muitos podem considerar o Brasil distante do protagonismo. Se analisarmos a história, essa percepção não poderia ser mais enganosa. Tomando novamente o caminho do uso medicinal como exemplo, o Brasil é pioneiro em pesquisa e detentor de um dos maiores volumes de produção científica.

A Universidade de São Paulo (USP), por meio do grupo de trabalho da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), tem a maior produção científica mundial sobre canabidiol (CBD), considerando mais de 1,1 mil artigos científicos, de 1940 a 2019, entre os mais relevantes, de acordo com as principais bases de dados internacionais.

Atualmente, os frutos obtidos pela instituição vêm do louvável trabalho realizado por professores e pesquisadores como Francisco Silveira Guimarães, Antonio Waldo Zuardi, José Alexandre Crippa e Jaime Hallak, entre outros grandes cientistas.

Nesse sentido, sou obrigado a citar a brilhante trajetória de Elisaldo Carlini. O médico, professor e pioneiro no estudo da psicofarmacologia, falecido em 2020, dedicou mais de meio século a pesquisas na área, incluindo foco especial na Cannabis sativa.

Ele foi um dos primeiros a descrever os efeitos terapêuticos do CBD para convulsões e epilepsia.

Ele foi um dos primeiros a descrever os efeitos terapêuticos do CBD para convulsões e epilepsia. Também foi apontado pelo jornal The New York Times como o responsável pela descoberta de evidências que despertaram o interesse mais profundo dos Estados Unidos no CBD, evidenciando o potencial do composto nos grandes círculos científicos. Atualmente, esse elemento derivado da cannabis é hype no país norte-americano.

De fato, a qualidade das pesquisas realizadas na USP é incontestável e há muitos cientistas brasileiros que estão mudando a história da planta. Não à toa, o trabalho da instituição acadêmica já foi destacado pela Nature, uma das principais publicações científicas do mundo.

Tendências globais

Pensando no presente e visando o futuro, vale sinalizar os caminhos para pesquisa e inovação na indústria legal da cannabis, balizando decisões de quem pretende ingressar ou ampliar investimentos nesse setor. Hoje, as empresas mais prolíficas são as focadas em cannabis. Ou seja, especialização está sendo determinante para ser bem sucedido no trabalho em torno da planta e seus derivados como centro de suas ofertas, independentemente da localização geográfica do empreendimento e de seu porte.

O surgimento de produtos relacionados ao uso medicinal ainda está no topo, mas as inovações estão despontando além dos canabinóides tradicionais. Muito em breve vocês ouvirão falar muito do canabigerol. Além disso, as aplicações voltadas aos bens de consumo ganham projeção, como cosméticos, alimentos, bebidas, têxteis, tabaco, entre outras. 

Os Estados Unidos e o Canadá dominam o tráfego mundial de patentes. O país governado por Joe Biden detém 50% de toda a atividade global de pesquisa. O Canadá vem logo atrás.

o Brasil tem potencial e especialistas para estar em boa posição nesse páreo.

O legado de Elisaldo Carlini comprova que o Brasil tem potencial e especialistas para estar em boa posição nesse páreo. Essa construção acontece no dia a dia e precisa ser intensificada, pois a patente do amanhã precisa ser trabalhada desde já.

*Marcelo De Vita Grecco é cofundador, head de Negócios da The Green Hub e colunista do Sechat

As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e de responsabilidade de seus autores.

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