Em busca do novo

Em sua coluna de estreia no Sechat, a designer de moda Maria Ribeiro da Luz compartilha sua experiência pessoal na descoberta do universo da cannabis, propondo reflexões importantes sobre ciência, política e história

Publicada em 23/03/2021

capa
Compartilhe:

Coluna de Maria Ribeiro da Luz*

Alice Walker, 77 anos, é das escritoras mais relevantes do contemporâneo. Se você assistiu o filme "A Cor Púrpura", leu de alguma maneira a romancista, poetisa e ativista norte-americana. Inspirei-me no texto de Alice para me apresentar porque essa é a minha primeira coluna aqui, e é consequência de uma transformação em pleno movimento, algo que ela descreve muito bem no trecho do livro "Living by the Word: Essays", que compartilho a seguir:

"Alguns períodos do nosso crescimento são tão confusos que nem sequer reconhecemos que o crescimento está acontecendo...Nunca nos ocorreria, a menos que tropeçássemos num livro ou numa pessoa que nos explicasse, que estávamos de fato no processo de mudança, de nos tornarmos de fato maiores, espiritualmente, do que éramos antes. Sempre que crescemos, tendemos a senti-lo, como uma jovem semente deve sentir o peso e a inércia da terra ao procurar sair da sua casca no seu caminho para se tornar uma planta. Muitas vezes a sensação é tudo menos agradável. Mas o que é mais desagradável é não saber o que está acontecendo. Aqueles longos períodos em que algo dentro de nós parece estar à espera, prendendo a respiração, sem saber qual deve ser o próximo passo, acabam por se tornar os períodos que esperamos, pois é nesses períodos que nos damos conta de que estamos sendo preparados para a fase seguinte da nossa vida e que, muito provavelmente, um novo nível da personalidade está prestes a ser revelado."

Ao ler esse texto, com clareza e recuo, pude identificar o processo e o que me levou para o universo da Cannabis. 

Venho há algum tempo explorando o mercado e a cultura cannábica com respeito, estudos, e assumo, um certo frio na barriga, característico de qualquer nova empreitada.

Venho há algum tempo explorando o mercado e a cultura cannábica com respeito, estudos, e assumo, um certo frio na barriga, característico de qualquer nova empreitada. Prefiro deixar claro logo ao chegar: entre Brasil e França, venho de 20 anos de experiência profissional num mercado bem diferente do canábico, o mercado da moda.

Não foi um processo automático, foi acontecendo primeiro internamente, para depois se confirmar por meio da troca com pessoas à minha volta, naturalmente divididas por 3 principais movimentos:

Pelo papo dos conservadores, que me disseram sem vacilar, que consagrar meu tempo estudando maconha não seria uma ideia muito inteligente, ainda mais com uma carreira bem traçada no mundo da moda.

Pelo interesse e curiosidade (ainda que hesitante) de pessoas que quiseram entender como a maconha, essa substância tão marginalizada quanto celebrada, "virou" remédio.

Pelo incentivo daqueles que, hoje considerados vanguardistas, vibraram com a minha nova escolha.

Este processo de diversificação profissional, e a vontade de expandir meu conhecimento, se confundem com a evolução da aceitação da planta, que vem se desenvolvendo para ocupar o espaço, que há muito tempo lhe foi podado.

Este processo de diversificação profissional, e a vontade de expandir meu conhecimento, se confundem com a evolução da aceitação da planta, que vem se desenvolvendo para ocupar o espaço, que há muito tempo lhe foi podado.

Em tempos como o de hoje, em que a ciência é lamentavelmente questionada, é de extrema importância que ela se fortaleça cada vez mais. Assim, falar, estudar e desmistificar a Cannabis, especialmente em 2021, é algo fundamental e urgente. Afinal, validar as propriedades de uma planta é uma resolução científica e não política, como tem acontecido nos últimos dois séculos.

Apesar da atmosfera de controvérsia e preconceito em que a cannabis está inserida, ela vem sendo cultivada e utilizada em suas mais diversas formas desde os primórdios das civilizações. A maconha estava listada no mais antigo livro de medicina chinesa, a farmacopeia imperador Shennong Bencao Jing, de 2800 a.C. 

Apesar da atmosfera de controvérsia e preconceito em que a cannabis está inserida, ela vem sendo cultivada e utilizada em suas mais diversas formas desde os primórdios das civilizações. A maconha estava listada no mais antigo livro de medicina chinesa, a farmacopeia imperador Shennong Bencao Jing, de 2800 a.C. 

Quando analisamos o contexto histórico e científico da cannabis, os estudos atuais validam a utilização farmacológica da planta nos primórdios, através dos diversos relatos de exploradores, historiadores e etnofarmacólogos espalhados geograficamente pelo mundo. De fibra têxtil à recurso medicinal para enfermidades intratáveis, a complexidade bioquímica da planta e seus diversos e exclusivos canabinóides possibilitaram à humanidade um leque de funcionalidades terapêuticas. 

A humanidade precisa de cura. O atributo fundamental da cannabis é a cura, a terapia, o apoio. Uma nova coexistência do ser humano com a Cannabis tem potencial de gerar transformações profundas e necessárias. 

Portanto, começo aqui nesse espaço, propondo um olhar novo, e com mais benevolência para todos esses estados de confusão que precedem um período de crescimento, de evolução.

Portanto, começo aqui nesse espaço, propondo um olhar novo, e com mais benevolência para todos esses estados de confusão que precedem um período de crescimento, de evolução.

Eu passei por esse processo. Talvez você  esteja vivenciando esse lugar agora. Certamente o mercado da Cannabis está nesse estágio no Brasil. Olhar para o novo e para a transformação sem preconceitos é necessário para a integração de uma perspectiva possivelmente reveladora de uma realidade mais humana e coerente.

Essa é uma boa hora para reavaliar, erradicar preconceitos e se colocar como agente transformador do mundo que já cansamos de criticar. Deixo esse convite para você. 

Essa é uma boa hora para reavaliar, erradicar preconceitos e se colocar como agente transformador do mundo que já cansamos de criticar. Deixo esse convite para você. 

E, aqui, me coloco no papel de porta voz da cannabis, para amplificar a mensagem e ressignificar as perspectivas da maconha, devolvendo o seu atributo essencial: o de ser uma planta com poder da cura.

*Maria Ribeiro da Luz é graduada em design de moda no Brasil e na França e colunista do Sechat

As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e de responsabilidade de seus autores.

Veja outros artigos de nossos colunistas: 

Alex Lucena 

– Inovação e empreendedorismo na indústria da Cannabis (19/11/2020)

– Inovar é preciso, mesmo no novo setor da Cannabis (17/12/20)

 Sem colaboração, a inovação não caminha (11/02/2021)

Fabricio Pamplona

– Os efeitos do THC no tratamento de dores crônicas (26/01/2021)

 Qual a dosagem ideal de canabidiol? (23/02/2021)

Fernando Paternostro

– As multifacetas que criamos, o legado que deixamos (11/3/2021)

Jackeline Barbosa

 Cannabis, essa officinalis (01/03/2021)

Ladislau Porto

– O caminho da cannabis no país (17/02/2021)

Marcelo de Vita Grecco

– Cânhamo é revolução verde para o campo e indústria (29/10/2020)

– Cânhamo pode proporcionar momento histórico para o agronegócio brasileiro (26/11/2020)

– Brasil precisa pensar como um país de ação, mas agir como um país que pensa (10/12/2020)

– Por que o mercado da cannabis faz brilhar os olhos dos investidores? (24/12/2020)

– Construção de um futuro melhor a partir do cânhamo começa agora (07/01/2021)

– Além do uso medicinal, cânhamo é porta de inovação para a indústria de bens de consumo (20/01/2021)

 Cannabis também é uma questão de bem-estar (04/02/2021)

– Que tal CBD para dar um up nos cuidados pessoais e nos negócios? (04/03/2021)

- Arriba, México! Regulamentação da Cannabis tem tudo para transformar o país (18/03/2021)

Paulo Jordão

– O papel dos aparelhos portáteis de mensuração de canabinoides (08/12/2020)

– A fórmula mágica dos fertilizantes e a produção de canabinoides (05/01/2021)

– Quanto consumimos de Cannabis no Brasil? (02/02/2021)

 O CannaBioPólen como bioindicador de boas práticas de cultivo (02/03/2021)

Pedro Sabaciauskis

– O papel fundamental das associações na regulação da “jabuticannábica” brasileira (03/02/2021)

 Por que a Anvisa quer parar as associações? (03/03/2021)

Ricardo Ferreira

– Da frustração à motivação (03/12/2020)

– Angels to some, demons to others (31/12/2020)

 Efeitos secundários da cannabis: ônus ou bônus? – (28/01/2021)

 Como fazer seu extrato render o máximo, com menor gasto no tratamento (25/02/2021)

Rodolfo Rosato

– O Futuro, a reconexão com o passado e como as novas tecnologias validam o conhecimento ancestral (10/02/2021)

– A Grande mentira e o novo jogador (10/3/2021)

Rogério Callegari

– Sob Biden, a nova política para a cannabis nos EUA influenciará o mundo (22/02/2021)

– Nova Iorque prestes a legalizar a indústria da cannabis para uso adulto (17/03/2021)

Stevens Rehen

 Cannabis, criatividade e empreendedorismo (12/03/2021)

Waldir Aparecido Augusti

– Busque conhecer antes de julgar (24/02/2021)

Wilson Lessa

– O sistema endocanabinoide e os transtornos de ansiedade (15/12/2020)

– O transtorno do estresse pós-traumático e o sistema endocanabinoide (09/02/2021)

– Sistema Endocanabinoide e Esquizofrenia (09/03/2021)