Desmistificando a legalização da cannabis
Mitos e verdades sobre os impactos sociais, econômicos e na saúde pública de uma política de drogas mais progressista
Publicada em 24/06/2024

Planta de cannabis | Imagem: Freepik
A legalização da cannabis é um tema que suscita muitas controvérsias e mitos. Em países como Uruguai e diversas regiões dos Estados Unidos, onde a planta foi regulamentada para uso medicinal, industrial e recreativo, existem dados e estudos que desmentem muitas crenças populares. Vamos explorar como as normativas nesses lugares afetaram questões como criminalidade, uso de outras substâncias e mortes relacionadas ao uso dos derivados da planta.
Mito 1: A legalização aumenta o tráfico e a criminalidade
Um dos principais argumentos contra a legalização da planta é a crença de que ela resultaria em um aumento do tráfico de drogas e da criminalidade. No entanto, dados de regiões onde a cannabis foi legalizada mostram uma realidade diferente. No Uruguai, por exemplo, “a lei parece estar cumprindo o seu objetivo de reduzir o tráfico de drogas, uma vez que a presença de acesso por essa via diminuiu de 58,2% em 2014 para 24% em 2022”, segundo o documento do setor, publicado em abril de 2023 pela agência governamental Uruguai XXI.

Já nos EUA, onde alguns estados legalizaram o uso recreativo da cannabis, estudos indicam uma queda nos crimes violentos e contra a propriedade. Segundo relatório produzido pelo FBI, de 2023 a 2024, crimes violentos caíram 15,2% e os homicídios diminuíram 26,4% em todo o país, mesmo em estados onde o uso da planta é regulamentado.
Mito 2: A legalização incentiva o uso de outras drogas
Outro mito comum é que a legalização da cannabis pode levar ao aumento do uso de outras substâncias. No entanto, evidências sugerem o oposto. Pesquisa publicada na revista científica Science Direct, revelou que os estados americanos com leis de cannabis medicinal apresentam taxas de mortalidade por overdose de opioides 25% menores do que aqueles sem tais leis. Outro dado importante, é que o uso de medicamentos à base de ópio, caíram drasticamente em regiões onde existem dispensários de cannabis, amplamente utilizados como uma alternativa para o alívio da dor, ajudando a reduzir a dependência em outros compostos.
Mito 3: Mortes causadas por uso de cannabis
No Uruguai, desde a legalização, não houve um aumento nas mortes relacionadas ao uso de cannabis. Estudos indicam que a regulamentação trouxe uma maior conscientização sobre o uso responsável e reduziu o consumo de substâncias mais perigosas. Nos estados americanos, dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) também não mostram um aumento nas mortes por overdose de cannabis, contudo, o órgão reforça o risco de dependência, mostrando que 3 a cada 10 jovens norte-americanos faz uso contínuo da planta e seus derivados.
O caso do Brasil
Enquanto países avançam em suas políticas de legalização, o Brasil segue um caminho cauteloso. Apesar do uso medicinal da cannabis apresentar um crescimento exponencial, o uso industrial e adulto ainda enfrentam barreiras significativas.
“A criminalização continua a sobrecarregar o sistema prisional, com muitos indivíduos presos por posse de pequenas quantidades de drogas. Dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) indicam que cerca de 28% da população carcerária está detida por crimes relacionados à maconha, principalmente por tráfico de pequenas quantidades”, lembra o advogado especializado em direito canábico, Natan Duek.
O jurista ressalta ainda que a manutenção da política proibicionista no Brasil não tem contribuído para a redução da criminalidade ou do consumo de drogas. Pelo contrário, perpetua a violência associada ao tráfico e impede o desenvolvimento de uma indústria que poderia trazer benefícios econômicos e medicinais ao país.
Os exemplos do Uruguai e EUA demonstram que a legalização da cannabis pode ser implementada de forma segura e benéfica. A redução da criminalidade, diminuição do uso de opioides e queda nas prisões por posse de drogas são alguns dos benefícios observados.
“Para o Brasil, seguir o exemplo desses países poderia não só aliviar o sistema prisional, mas também trazer avanços na saúde pública e na economia, mostrando que uma política de drogas mais progressista é tanto possível quanto desejável”, conclui Duek.