Em área de 5,5 hectares, UNESP inaugura núcleo para pesquisa e cultivo de cannabis
NuDeCann terá expansão modular em três fases até 2028, com foco em ciência, saúde e sustentabilidade
Publicada em 01/10/2025

Croqui do projeto das instalações do NuDeCann no Sítio Aldeia da Mata, município de Ilha Solteira e gerenciado pela ABRAPPAC. Reprodução do resumo executivo do NuDeCann
No dia 12 de setembro, a Universidade Estadual Paulista (UNESP) e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) assinaram um protocolo de intenções para implementar o Núcleo de Desenvolvimento da Cannabis (NuDeCann). O projeto, sediado em Ilha Solteira (SP), busca consolidar um polo de pesquisa para avançar na produção e aplicação das potencialidades da cannabis.
A cooperação técnico-científica visa não apenas a pesquisa, mas também a melhoria da qualidade de vida de pacientes e o fomento à sustentabilidade. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, destacou que a iniciativa coloca a UNESP de Ilha Solteira em posição de protagonismo no cenário nacional.
“Estamos firmando um convênio com a Unesp para construir uma indústria farmacêutica baseada na cannabis, que tem uma produção muito forte no mundo. A ciência vem descobrindo cada vez mais o papel da cannabis para a saúde”, afirmou Teixeira durante o ato.
O NuDeCann será instalado em um sítio de 5,5 hectares, hoje utilizado pela Associação Brasileira de Pesquisadores e Pacientes de Cannabis (ABRAPPAC). A estrutura será modular, permitindo uma montagem ágil e escalável para expandir as áreas de cultivo ao longo de três fases, distribuídas ao longo de três anos.
O projeto será desenvolvido em três fases. A primeira, mais longa, terá duração de 12 semanas e concentrará o maior volume de investimentos. No ano seguinte, a segunda fase prevê a implementação de instalações para startups e a construção de novas estufas. Já a partir do terceiro ano, o foco passará a ser a expansão contínua das áreas de cultivo.
A gestão financeira dos recursos, que podem vir de fontes governamentais, privadas ou de outras entidades, ficará a cargo da Fundação da UNESP. O investimento total previsto para os três primeiros anos é de R$ 19.745.916,00.
Tecnologia nacional para a cadeia produtiva da cannabis

Um dos pilares do NuDeCann é o desenvolvimento de uma cadeia produtiva 100% brasileira, da genética das plantas à distribuição do extrato. O coordenador-geral do núcleo, Prof. Dr. Marcos Chiquitelli Neto, explica que o trabalho inicial tem como foco a pesquisa e padronização de processos.
“Precisamos desenvolver tecnologia nacional, não só do plantio e da genética, mas de todos os processos: desde o cultivo até a colheita, a secagem, o armazenamento e a identificação de cepas”, detalha Chiquitelli.
Para isso, o NuDeCann atuará em rede, aproveitando a infraestrutura já existente na universidade, como o Centro de Estudos de Venenos e Animais Peçonhentos da UNESP (CEVAP), primeira fábrica multipropósito de biofármacos para pesquisa clínica da América Latina. "Nessa fase inicial, faremos a produção e secagem da flor aqui e a enviaremos para o CEVAP, onde eles começarão os estudos de extração de cada canabinoide”, explica o coordenador.
Além da frente científica, o projeto tem um forte viés social, propondo-se a ser uma "incubadora de associações". O objetivo é oferecer suporte técnico e insumos para que as organizações atendam seus pacientes de forma segura e padronizada, democratizando o acesso.
A trajetória pessoal por trás do núcleo
A criação do núcleo está ligada à história pessoal de seu coordenador. Usuário de cannabis desde a juventude, o professor enfrentou preconceitos até mesmo dentro do ambiente acadêmico. Após muita luta, em 2022, Chiquitelli fundou a ABRAPPAC e começou a articular uma rede de pesquisadores interessados no tema. "A proposta do NuDeCann surgiu com esse sentimento, de que deveríamos unir os grupos minoritários, a agricultura familiar, as associações, a universidade e o governo", afirma.
Assim, o projeto foi desenhado para vincular assentados do Movimento Sem Terra (MST), associações, órgãos reguladores e a multidisciplinaridade da UNESP. O movimento culminou na criação da Rede Unesp Cannabis (Reunicam), que hoje formaliza o trabalho de dezenas de pesquisadores. "A rede já conta com 54 docentes e mais de 70 alunos de pós-graduação trabalhando com o tema", conclui o coordenador.