O futuro da RDC 660: o debate sobre a resolução que garante o tratamento de milhares de pacientes no Brasil

Uma análise sobre a via de acesso aos produtos de cannabis importados

Publicada em 12/06/2024

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A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 660 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que regula a importação de produtos derivados de cannabis no Brasil, foi criada, em 2015, para atender a pacientes que necessitam de formulações específicas dos produtos derivados da cannabis. 

 

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Janeiro/2015 – Anvisa remove o canabidiol da lista de substâncias proibidas, regulamentando seu uso medicinal | Freepik

 

A RDC 660 foi emitida com base em uma determinação judicial, desse modo, ainda não está completamente decidida. É preciso lembrar que os produtos inseridos nessa resolução não passão por avaliação da Anvisa que estabelece diretrizes para as Boas Práticas de Fabricação (BPF) para a indústria nacional. 

De acordo com informações de uma fonte ouvida pela redação, a maioria dos produtos da 660 vem dos EUA. Lá, a Food and Drug Administration (FDA) trata esses produtos, mesmo sendo de uso medicinal, como suplemento alimentar, sendo que eles não são avaliados pelo órgão, ficando isentos de registro ou cadastro. Isto é, nem lá e nem aqui, os produtos passam por certificação. A própria RDC 660, reforça a agência sanitária, deixa a decisão à critério dos profissionais médicos, pacientes ou seus responsáveis legais.
 


Veja o trecho da resolução publicada pela Anvisa, clique leia na integra. 

 


“Art. 18 – A prescrição realizada pelo profissional e a solicitação de autorização pelo paciente ou seu responsável legal representam a ciência e o aceite por ambos da ausência de comprovação da qualidade, da segurança e da eficácia dos produtos importados, bem como pelos eventos adversos que podem ocorrer, sendo o profissional prescritor e o paciente ou seu responsável legal totalmente responsáveis pelo uso do produto”.  


De acordo com o ortopedista Jimmy Fardin, a RDC 660 permitiu que os pacientes tivessem acesso aos produtos derivados da cannabis que não eram permitidos no país, e isso contribuiu para diminuir consideravelmente síndromes epiléticas raras. Do ponto de vista de Fardin, foi um grande alento para muitas famílias. "Essa resolução cresceu, ganhou forma, um público alvo cada vez maior e muitos players, assim como as possibilidades de diferentes tipos de formulações e extratos."

Jimmy diz que "hoje, existem milhares de pacientes que usam diariamente extratos de diferentes tipos e uma gama de produtos distintos à disposição do prescritor. É importante lembrar que cada extrato traz consigo um quimiotipo, terpenos e flavonoides oriundos do processo de extração. Isso quer dizer que um paciente que faz uso de uma formulação importada e conseguiu estabilizar seus sintomas seria muito prejudicado caso sua medicação seja alterada ou tenha seu acesso proibido."

Fazendo uma análise do mercado, para alguns players do setor uma eventual extinção da RDC 660 poderia trazer consequências significativas, incluindo um aumento expressivo no número de ações judiciais requerendo acesso aos produtos importados.  

Allan Paiotti CEO da Cannect, empresa que facilita o acesso aos produtos de cannabis, destaca a importância da continuidade da regulamentação. "A curto prazo, não teremos medicamentos aprovados pelo RDC327 em variedade que consiga atender todas as demandas de tratamento atualmente existentes. Nesse contexto, RDC 327 e 660 devem co-existir de forma complementar, com critérios técnicos de qualidade cada vez mais exigentes e criando espaço para que os produtos importados de maior qualidade e eficiência sigam o caminho dos estudos clínicos para aprovação, assim como previsto na RDC 327”, argumenta o empresário que continua:

“Já a curto/médio prazo, uma eventual interrupção ou bloqueio da importação pela RDC 660 geraria um grande volume de demandas judiciais para preservar o direito de acesso aos tratamentos em andamento”.

No entanto, vale ressaltar que a via de acesso por meio de importação foi criada em 2015, quando não existia a 327 para preencher uma lacuna da falta de produtos no mercado nacional. Atualmente, existem quase 40 produtos autorizados, com previsão de ampliação desse número e, futuramente, das vias de administração, podendo adquirir os produtos com qualidade assegurada em qualquer farmácia do país.  

Em suma, o futuro da RDC 660 da Anvisa, que regula a importação de produtos de cannabis, permanece incerto e em debate judicial. Enquanto alguns defendem a continuidade dessa regulamentação para garantir o acesso a tratamentos necessários, a agência sanitária aponta para a necessidade de testes e certificações de BPF. A criação da RDC 327, que oferece uma alternativa, coloca em perspectiva a necessidade de uma coexistência complementar das duas resoluções.  

De todo modo a decisão final, que está nas mãos da justiça terá um impacto significativo tanto para os pacientes quanto para o mercado, exigindo um equilíbrio cuidadoso entre segurança, eficácia e acesso aos tratamentos.

A equipe do Sechat entrou em contato com assessoria de comunicação da Gerência de Produtos Controlados da Anvisa, responsável pela RDC 660, contudo, até o fechamento dessa matéria, não houve resposta.

Atualizada dia 13/06 às 16:24