“O RN será uma âncora para maconha no país”, diz Isolda Dantas
Saiba como foi o processo de implementação da lei que permite o direito de qualquer cidadão com prescrição ter acesso ao tratamento com produtos à base de cannabis para uso medicinal no Rio Grande do Norte
Publicada em 31/01/2023

Por Lucas Góis
A Lei 11.055 de autoria da deputada Isolda Dantas (PT) foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte e sancionada pela governadora Fátima Bezerra (PT) no ano passado. A diretriz aborda o direito ao tratamento com produtos de cannabis, o incentivo à pesquisa sobre o uso medicinal e a divulgação de informações sobre a planta para o público geral.
O tema precisava ser ampliado segundo a parlamentar, que faz a defesa dos direitos da classe trabalhadora, a luta das mulheres, negros, agroecologia e economia solidária. “Participava de alguns debates sobre cannabis recreativa, mas não fui a fundo nisso. No entanto, vi que esse era um caminho importante para tratar”.
A deputada contou sobre o contato com associações de pacientes no estado e, uma delas foi a Reconstruir Cannabis. No surgimento da pauta, buscou-se uma trilha além dos debates, para criar uma legislação que pudesse contribuir para as pessoas.
“Fizemos várias reuniões e estabelecemos uma audiência pública. Tivemos a participação do Sidarta Ribeiro, senadora Zenaide Maia (PSD), médicos e diversos pacientes”, disse Isolda Dantas.
A audiência
A audiência teve papel fundamental na mudança de ideia da deputada do (PT) sobre o caminho que devia seguir o projeto para ser aprovado na assembleia legislativa. O primeiro passo foi trazer o tema do acesso à planta como carro-chefe, evidenciando o papel da ciência por trás disso e como levar esse conhecimento à população de forma acessível.
Após a audiência,ocorreram discussões sobre o acesso à cannabis, elaboração da proposta e diálogo com quem iria ser alcançado pelo PL que seria protocolado.
Segundo Isolda, existiram ressalvas sobre como iria ser apresentado o projeto por ser algo novo no RN e pelo preconceito estabelecido. “Tive muito cuidado, era parlamentar de primeiro mandato e isso seria provavelmente bombardeado de estereótipos, como, por exemplo, ser mulher e de esquerda. As pessoas poderiam criar notícias falsas em relação a isso. O projeto teve cada passo com muito cuidado e certeza”.
Na pandemia da Covid-19
Em 2020, veio a pandemia e ficou a dúvida sobre o que seria feito com o projeto de lei em plena quarentena, a decisão foi adiar e não apresentar. Com a chegada das vacinas e as atividades voltando ao normal, a deputada e a Associação Reconstruir começaram a pensar sobre como seria apresentado o PL. O ponto de vista debatido nas audiências públicas e projetos isolados com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) acabou sendo o caminho escolhido.
Num momento importante para aprovação do projeto, Isolda conta que várias tentativas foram feitas na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) com o intuito de evitar serem derrotados, pois só poderiam ser avaliados no ano seguinte, caso acontecesse.
“Quando íamos para a pauta, sabíamos que iríamos ser derrotados, porque os deputados presentes iriam votar contrário ao projeto , e isso aconteceu por três vezes. Na quarta vez, decidimos que o PL seria votado de qualquer maneira”.
Os testemunhos
Numa tentativa de evitar uma rejeição e tendo o conhecimento de pessoas da assembleia que usavam o óleo da planta, foi feito um pedido na comissão para ter o depoimento de pessoas externas, por cinco minutos.
“Houve uma grande tensão, não sabia o que poderia acontecer. Tivemos dois depoimentos, de uma mãe e um pai sobre o filho que reduziu as convulsões depois da cannabis, e de outro pai sobre o progresso do filho com o uso da planta”, disse a deputada estadual, Isolda Dantas.
Durante a votação, só houve uma abstenção e o projeto teve aprovação na CCJ. Ao chegar no plenário, a implementação foi unânime e a lei estabelecida. O fato trouxe grande repercussão aos potiguares de forma positiva. A parlamentar lembra que recebeu diversas mensagens pela coragem e sucesso.
A lei
Dentro da lei, emendas foram disponibilizadas com a Fundação de Amparo e Promoção da Ciência, Tecnologia e Inovação do RN (FAPERN), num edital de 300 mil reais para incentivo à pesquisa. Um grande passo no aproveitamento da lei foi a recente liberação da Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária) para a UFRN realizar pesquisas com a planta ativa.
Segundo a deputada, mais um projeto deve ser feito com base em outro PL aprovado em São Paulo sobre o tratamento pelo SUS. “Vamos complementar a nossa lei com o que já está sendo feito por lá, tendo o SUS como a principal porta de entrada para as pessoas, garantindo uma saúde acessível”, afirmou Isolda Dantas.
Em uma perspectiva futura da planta aqui no estado, a deputada eleita nas últimas eleições, afirma que o RN será uma âncora para a cannabis no país, pois conta com diversos pesquisadores, além da UFRN que pode ser pioneira em diversos resultados.
“Quero que daqui a quatro anos, o medicamento esteja disponível no SUS e quem usa poder comprar o seu remédio. A gente luta para não criar um cartel na indústria e sim para garantir acesso às pessoas", ponderou Isolda.