Autorização polêmica: Conselho afirma que biomédicos estão aptos a prescrever cannabis, mas Anvisa questiona competência

A Resolução nº 365 do Conselho Federal de Biomedicina, que autoriza a prescrição de produtos fitoterápicos tradicionais à base de canabidiol por biomédicos, esbarra em resoluções da agência sanitária

Publicada em 24/07/2023

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Por João Negromonte

Uma decisão  do Conselho Federal de Biomedicina (CFBM), que autoriza os profissionais biomédicos a prescreverem derivados de cannabis, publicada no Diário Oficial da União no último mês, tem gerado debates e divergências com as resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Enquanto o CFBM enxerga amedida como um avanço significativo no campo da saúde, oferecendo novas possibilidades terapêuticas para pacientes que buscam alternativas naturais, a Anvisa contesta essa autorização, reforçando sua competência no controle e monitoramento dos produtos derivados de cannabis.

De acordo com a resolução publicada pelo CFBM, o uso de fitoterápicos à base de canabidiol pode ser realizado por biomédicos habilitados em Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura. A decisão tem apoio na literatura e na tradição oriental, que menciona as propriedades analgésicas dos fitoterápicos à base de cannabis. O CFBM destaca a importância dos biomédicos possuírem formação e conhecimento aprofundado sobre o uso seguro e eficaz da substância, além de seguirem critérios para dosagens, levando em consideração as necessidades específicas de cada paciente.

Questionados se a autorização da inclusão dos biomédicos na prescrição dos derivados da cannabis veio por meio de regulação junto à Anvisa, o Conselho disse em nota ao portal Sechat:

“O Conselho é a autarquia responsável por determinar a área de atuação dos profissionais. Não houve interferência da Anvisa. Na RDC No 660, de 30 de março de 2022 da agência sanitária, em seu artigo 1°, estabelece os critérios e os procedimentos para produtos derivados de cannabis mediante “prescrição de profissional legalmente habilitado para tratamento de saúde”, destaca a nota.

Conselho Federal de Biomedicina (CFBM) autoriza precrição de cannabis medicinal por profissionais da área.

A nota reforça ainda que: “Segundo a própria Anvisa, compete aos conselhos profissionais normatizar o exercício profissional e a incorporação de novas tecnologias e terapêuticas, com base em evidências científicas, por meio de pesquisas e estudos que comprovem a eficácia e a segurança destes produtos. Assim, uma vez reconhecida a prática, procedimento ou terapia, por órgãos competentes, caberá à agência regulamentar e fiscalizar o cumprimento dos critérios sanitários a serem seguidos.” 

Por outro lado, a Anvisa contradiz a decisão, argumentando que a espécie vegetal cannabis está listada expressamente no Anexo I da RDC nº 26, de 2014, que trata da "lista de espécies que não podem ser utilizadas na composição de produtos tradicionais fitoterápicos". Além disso, a Anvisa esclarece que o canabidiol é considerado um fitofármaco, e não um fitoterápico ou produto da Medicina Tradicional Chinesa, conforme a RDC nº 24, de 2011. 

Em nota ao portal Sechat, a agência enfatiza que o controle e a dispensação de produtos derivados da cannabis estão sujeitos aos requisitos estabelecidos na Portaria SVS/MS n° 344 de 1998, que direciona a prescrição de medicamentos de controle especial apenas para médicos ou odontólogos.

Para o Conselho, na possibilidade da Anvisa não permitir a prescrição de biomédicos na terapia canabinoide, o caminho pode ser a justiça:

“Não é do escopo da Anvisa permitir prescrição por biomédicos, por isso, caso haja algum tipo de judicialização vamos defender a atividade, assim como ocorreu na fisioterapia e na nutrição, que ganharam causa judicial permitindo a prescrição”, consta ainda na nota.

Diante dessa situação, é possível que ocorram debates mais aprofundados e revisões nas regulamentações para definir de forma clara e consensual os critérios de prescrição de produtos derivados de cannabis. 

É importante que os interesses dos pacientes, a segurança e a eficácia dos tratamentos sejam considerados, buscando um equilíbrio entre o acesso a alternativas terapêuticas inovadoras e a garantia da supervisão adequada por profissionais de saúde qualificados.