Como fazer seu extrato render o máximo, com menor gasto no tratamento

Em mais um texto repleto de exemplos da prática clínica, o colunista Ricardo Ferreira trata de um dos temas mais relevantes para os pacientes que fazem uso medicinal dos derivados da cannabis: o modo de escolher o produto, a dosagem correta, e a melh

Publicada em 25/02/2021

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Coluna de Ricardo Ferreira*

Independente da sua composição, concentração ou origem, os óleos de cannabis são produtos extremamente caros. Existem vários fatores que explicam porque produtos à base de cannabis são tão caros, isso poderá ser abordado em uma próxima coluna, mas, independentemente destas causas, conseguir aproveitar ao máximo o conteúdo de cada frasco é uma das formas mais inteligentes para fazer com que o tratamento com extratos de cannabis caiba no orçamento.

Todos nós tendemos a olhar apenas para o preço de cada frasco para estimar se um tratamento é barato, caro, ou até mesmo com custo proibitivo. Mas, em relação ao uso medicinal da cannabis, isso não é tão óbvio assim.

Todos nós tendemos a olhar apenas para o preço de cada frasco para estimar se um tratamento é barato, caro, ou até mesmo com custo proibitivo. Mas, em relação ao uso medicinal da cannabis, isso não é tão óbvio assim.

Primeiro porque, dependendo da marca e produto, o tipo e quantidade de princípios ativos por mililitro são extremamente diferentes. Sem contar que vários dos produtos disponíveis no nosso mercado não são aferidos quanto a quantidade de miligramas de canabinoides por ml, e em muitos casos é difícil confiar no que está escrito no rótulo. 

Além desta primeira variável, em relação ao tratamento com cannabis é impossível determinar uma dose diária padrão em função de determinada doença ou características físicas do paciente (gênero, peso e idade). Independente da doença, todos os tratamentos canábicos devem ter sua dosagem definida através da titulação de dose; ou seja,  iniciamos o tratamento com uma dose bem baixa, e vamos subindo lenta e progressivamente até encontrar a quantidade de extrato que é capaz de minimizar seus sintomas.

A titulação progressiva de dose é sem dúvida a melhor forma para o paciente encontrar qual é a menor quantidade de extrato capaz de lhe proporcionar melhora, com o mínimo de efeitos colaterais e menor custo mensal de tratamento.

A titulação progressiva de dose é sem dúvida a melhor forma para o paciente encontrar qual é a menor quantidade de extrato capaz de lhe proporcionar melhora, com o mínimo de efeitos colaterais e menor custo mensal de tratamento.

Mas mesmo entendendo que a titulação é o caminho de aproveitar melhor cada gota do seu óleo, existem ainda alguns macetes que podem fazer que doses ainda menores sejam capazes de promover os mesmos efeitos de quantidades muito maiores. E estes macetes tem direta relação com um conceito em farmacologia chamado biodisponibilidade.

A biodisponibilidade define-se como a quantidade e velocidade que um determinado princípio ativo é absorvido e se torna capaz de promover algum efeito sobre o organismo. Ela varia de acordo com vários fatores, sendo os principais: quem tem o poder de diluir este ativo (solubilidade), e o local onde é colocado para ser absorvido.

A biodisponibilidade define-se como a quantidade e velocidade que um determinado princípio ativo é absorvido e se torna capaz de promover algum efeito sobre o organismo. Ela varia de acordo com vários fatores, sendo os principais: quem tem o poder de diluir este ativo (solubilidade), e o local onde é colocado para ser absorvido (ex. pele, mucosa oral, tubo gastrointestinal e etc.).

Quanto à solubilidade: os canabinoides são definidos como substâncias lipossolúveis, ou seja, eles se dissolvem em óleos e gorduras. Esta diluição é importante para aumentar a área de contato entre o extrato e a parede que fará a absorção dos canabinoides, tornando sua absorção mais rápida e eficiente ao longo do tempo que este extrato estiver em contato com esta superfície. No caso da via gastrointestinal, o que não for absorvido no trajeto entre a boca e o ânus é eliminado junto com as fezes.

Desta forma, fazer uso do extrato logo após ter se alimentado é sem dúvida uma forma de aumentar a velocidade de absorção e diminuir as perdas.

Alguns destes estudos demonstraram aumento em mais de 10 vezes na capacidade de absorção de canabinoides em pessoas que haviam ingerido grande quantidade de alimentos gordurosos antes de fazer uso de extratos de cannabis pela boca.

Estudos a respeito da interferência da alimentação na absorção de canabinoides pela via gastrointestinal já foram publicados e confirmam o que observamos na prática. Alguns destes estudos demonstraram aumento em mais de 10 vezes na capacidade de absorção de canabinoides em pessoas que haviam ingerido grande quantidade de alimentos gordurosos antes de fazer uso de extratos de cannabis pela boca.

Obviamente recomendar que todo mundo encare uma feijoada ou uma bela pizza quatro queijos antes de fazer uso do seu extrato trará consequências a médio e longo prazo que não haverá economia de produto que justifique fazer isso; entretanto, acredito ser razoável fazer a ingesta de forma consciente de alguma gordura animal ou vegetal na refeição que preceder a tomada do extrato. Por exemplo: incluir algum derivado de leite, proteína animal ou carregar um pouco mais no azeite de oliva pouco antes de usar o óleo.

Sobre a superfície de absorção: Sabemos que a mucosa oral é muito mais efetiva para absorção de canabinoides do que a gastro intestinal. Ser mais eficiente significa que os canabinoides presentes no extrato são mais rapidamente absorvidos quando em contato direto com a mucosa interna da boca do que a do aparelho digestivo.

Estudos estimam que na maior parte das pessoas a absorção na mucosa oral tende a ser até 40 vezes mais rápida do que na intestinal. Assim, além de promover o efeito desejado de forma mais rápida, aquilo que não for absorvido é engolido e será absorvido de forma mais cadenciada ao longo do trajeto por todo o tubo digestivo, fazendo dois ciclos diferentes e não concorrentes de absorção. 

Estudos estimam que na maior parte das pessoas a absorção na mucosa oral tende a ser até 40 vezes mais rápida do que na intestinal. Assim, além de promover o efeito desejado de forma mais rápida, aquilo que não for absorvido é engolido e será absorvido de forma mais cadenciada ao longo do trajeto por todo o tubo digestivo, fazendo dois ciclos diferentes e não concorrentes de absorção. 

Com base nestes conhecimentos farmacológicos e com o que observamos na nossa prática, fazer uso de extratos logo após alguma refeição que contenha uma quantidade aceitável de alimentos gordurosos, e deixar o extrato na boca o máximo de tempo possível antes de engolir, são estratégias simples e inteligentes para se obter o máximo de eficácia do tratamento com menor consumo de extrato a cada tomada; o que representará um menor custo mensal do tratamento, podendo viabilizar um tratamento que, a primeira vista, parecia ser economicamente inviável.

*Ricardo Ferreira é médico especialista no tratamento de doenças da coluna vertebral e controle da dor e colunista do Sechat.

As opiniões veiculadas nesse artigo são pessoais e de responsabilidade de seus autores.

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