Cânhamo na entressafra: potencial da planta como cultura de cobertura

Benefícios agronômicos, ambientais e econômicos tornam o cânhamo uma alternativa promissora no manejo sustentável

Publicada em 05/09/2025

Cânhamo na entressafra: potencial da planta como cultura de cobertura

“O cânhamo tem dupla aptidão”, explica o engenheiro agrônomo, pesquisador e doutorando pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), Robert Gandra. “Além de cumprir a função de planta de cobertura, é uma commodity. Você pode extrair fibra e ainda deixar um r

O uso do cânhamo, variedade da cannabis com baixo teor de THC, como cultura de cobertura vem crescendo na agricultura sustentável. Cultivado entre ciclos produtivos, ele ajuda a conservar o solo, reduzir impactos climáticos e aumentar a biodiversidade, ao mesmo tempo em que pode gerar valor econômico por meio de fibras e grãos.

Robert Gandra, pesquisador e doutorando.jpg
Robert Gandra, engenheiro agrônomo. Imagem: Arquivo pessoal

“O cânhamo tem dupla aptidão”, explica o engenheiro agrônomo, pesquisador e doutorando pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), Robert Gandra. “Além de cumprir a função de planta de cobertura, é uma commodity. Você pode extrair fibra e ainda deixar um resíduo com bom aporte de matéria orgânica, protegendo o solo.”

Segundo Gandra, os ganhos incluem a formação de palhada para plantio direto, melhoria da infiltração e retenção de água, quebra de ciclos de pragas e doenças e redução da temperatura do solo.

“O crescimento rápido e o plantio adensado cobre o dossel depressa, dificultando a entrada de luz para plantas daninhas e reduzindo a necessidade de herbicidas”, acrescenta.

 

Solo mais fértil e controle biológico natural

 

Como outras culturas de cobertura, o cânhamo protege o solo contra chuvas fortes e ventos, prevenindo erosão e perda de nutrientes. Seus resíduos oferecem matéria orgânica que melhora a fertilidade e a retenção de água.

O cultivo também ajuda a controlar pragas naturalmente. “Um exemplo é o percevejo. Como não encontra o cânhamo como hospedeiro, sua população diminui, reduzindo o risco para a próxima safra”, afirma Gandra.

Um estudo europeu, conduzidos por três anos, mostraram que os resíduos do cânhamo aumentam o carbono do solo quando incorporados no início da primavera. A decomposição mais lenta protege o solo por mais tempo e favorece o sequestro de carbono, embora a liberação de nitrogênio seja mais gradual.

 

Vantagens agronômicas do cânhamo

 

Entre os atributos da planta estão a alta produção de sementes, que permite cobrir grandes áreas, e a resiliência em condições de estresse hídrico moderado.

O caule, rico em lignina e hemicelulose, se decompõe lentamente, mantendo a palhada sobre o solo por mais tempo — efeito semelhante ao milho. “O cânhamo fecha rapidamente a área, restringindo a entrada de luz para plantas competidoras e reduzindo a necessidade de herbicidas”, explica Gandra.

 

Sustentabilidade e sequestro de carbono

 

Os benefícios ambientais também são expressivos. Em termos de biomassa, o cânhamo pode superar culturas tradicionais.

“Enquanto o milho produz de 10 a 12 toneladas de matéria seca por hectare, o cânhamo pode chegar a 25. Cerca de 40% desse volume permanece no campo como resíduo, representando um aporte relevante de carbono”, compara Gandra.

Além disso, parte do carbono se mantém sequestrada nos produtos derivados da planta, como papel, tecidos, cordas e até concreto, retardando seu retorno à atmosfera.

 

Experiências internacionais e potencial futuro

 

O cânhamo já foi testado como cultura de cobertura em países como Estados Unidos e Nova Zelândia. Na Pensilvânia, mostrou potencial para melhorar o solo e gerar renda extra com fibras. Na Nova Zelândia, pesquisas avaliam o cultivo entre pomares, ocupando as entrelinhas sem competir com a cultura principal.

Para Gandra, essas experiências reforçam o futuro promissor do cânhamo: “Ele pode ser utilizado tanto na entressafra quanto em rotações de culturas ou consórcios. Reúne benefícios produtivos, ambientais e econômicos.”

Experimentos do Rodale Institute, nos EUA, destacam o rápido crescimento da planta, que pode atingir até 3,6 metros em 85 dias, cobrindo o solo e reduzindo plantas daninhas. Técnicos também ressaltam a importância do sistema radicular na estruturação do solo, essencial para o planejamento agrícola.