Uso de cannabis reduz crises convulsivas de criança

Com mais qualidade de vida, Pedro abandona quatro medicamentos diários durante o tratamento com a planta.

Publicada em 14/12/2023

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Thaís Castilho

Para tentar controlar as mais de 40 crises convulsivas diárias de seu filho, diagnosticado com paralisia cerebral e epilepsia refratária, Patrícia Sarruf medicava o Pedro todos os dias com quatro medicamentos anti convulsivos nas suas doses máximas, ainda no seu primeiro ano de vida.

Os efeitos colaterais deixavam Pedro adormecido quase o dia todo e como consequência da dosagem, ele desenvolveu uma gastrite medicamentosa e uma infecção por conta da secreção que esses medicamentos causam. 

As pesquisas na internet em busca de uma alternativa menos danosa para controlar as crises de seu filho, mostraram à Patrícia que a cannabis era um caminho seguro e eficiente.

“Eu precisava encontrar uma forma de melhorar a vida do meu filho e pesquisando em artigos científicos eu me deparei com a cannabis medicinal que estava sendo utilizada nos EUA e em outros países. Consegui uma médica prescritora na minha cidade  e com a receita, comecei a  importar os óleos”, lembra Patrícia.

A Cannabis trouxe novas perspectivas

Após o primeiro mês de uso, as crises reduziram pela metade.

“A mudança foi da água pro vinho. Além de controlar as crises, ele passou a ficar mais acordado e mais alerta. Hoje, já tem cinco anos que ele toma cannabis e praticamente não tem mais crise e não usa nenhum outro medicamento, a não ser o canabidiol”,  conta Patrícia.

Antes do tratamento com seu filho, Patrícia só conhecia a cannabis para uso recreativo, porém as mudanças que ocorreram na família como um todo provaram que o potencial terapêutico da planta é capaz de transformar vidas.

“A nossa vida depois da cannabis é outra. Meu filho era totalmente dependente de mim, não havia perspectivas dele ir para a escola, por exemplo, dele ter outra cuidadora a não ser. São mudanças que impactam em todos nós e na sociedade à nossa volta”, pontua Patrícia.

Associativismo como caminho de acessibilidade

Os resultados do tratamento do seu filho despertaram o interesse de outras pessoas pela cannabis, que recorriam à patrícia em busca de informação.

Foi então, que ao lado de Kiara Cardoso, paciente de cannabis e doutora em Farmácia, decidiu fundar a AMO - Associação de Cannabis Medicinal.

“A ideia da Associação surgiu pelo fato de muitas pessoas, pacientes, nos procurarem para ajudar a ter acesso ao óleo. Depois que o Pedro começou a utilizar e os terapeutas começaram a ver e divulgar os resultados, muitas pessoas entraram em contato comigo pedindo ajuda. Então eu conheci a Kiara Cardoso, doutora em Farmácia, que é paciente de cannabis e tem habeas corpus para uso próprio. Ela teve a iniciativa de fundar a Associação AMO e me convidou. Hoje sou diretora de acolhimento”

Os embates do associativismo

O movimento associativo no Brasil vem crescendo a cada ano. Hoje em dia, segundo um relatório apresentado pela Kaya Mind, estima-se que mais de 100 instituições do terceiro setor fazem parte do movimento da cannabis no Brasil.

A principal luta dessas associações é pela acessibilidade ao tratamento e aos produtos de cannabis, já que as vias de acesso hoje em dia são através da importação, da venda nas farmácias, pela judicialização do SUS, pelos habeas corpus de cultivo ou pelas associações, porém poucas têm autorização de cultivo e, por isso, a maioria segue  operando na desobediência civil. 

Ainda sim, o modelo associativo é responsável por atender mais de 100 mil pacientes em todo o Brasil. 

“A nossa Associação passa pelas mesmas dificuldades de todas as outras. São os aspectos legais que regem o Brasil. Leis que não estão do lado do cidadão que sofre, que tem possibilidade de tratamento, mas não consegue por conta do atraso legal que não regulamenta o associativismo e o mercado como um todo. Hoje a AMO atende 300 pacientes. Temos estrutura de cultivo e laboratório para atender cerca de 2000 pacientes, mas ainda não temos nosso Habeas Corpus, por isso não conseguimos avançar para atender uma demanda maior de pessoas que precisam desse tratamento”, lamenta Patrícia.

É preciso que haja uma regulamentação efetiva do mercado da cannabis, tanto para as empresas, como para o terceiro setor. Além disso, investir na educação dos profissionais de saúde, para que saibam prescrever o tratamento com a cannabis e na informação à população para quebrar o preconceito em torno da planta.

“O associativismo cannabico vem mostrar que a população está atenta e buscando informações. As associações vem para desmistificar o assunto, quebrando o preconceito e mostrando que a ciência evoluiu. A cannabis é sim uma possibilidade de tratamento e de melhoria na qualidade de vida. As associações têm a capacidade de acolher os pacientes de forma que os deixam seguros quanto ao tratamento e lhe tragam apoio em suas necessidades específicas, pois sabemos que cada pessoa e cada patologia reage de uma forma diferente ao tratamento”, reforça Patrícia.