Uso medicinal da cannabis: Alzheimer

Perda de memória, dificuldades cognitivas e agressividade, são alguns do sintomas da doença que afeta cerca de 50 milhões de pessoas em todo mundo

Publicada em 30/10/2022

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Por João R. Negromonte

A Doença de Alzheimer (DA) é um transtorno neurodegenerativo progressivo e fatal, que se manifesta pela deterioração cognitiva, de memória, comprometimento progressivo das atividades de vida diária e uma variedade de sintomas neuropsiquiátricos e de alterações comportamentais. 

A doença, que segundo estimativas da Alzheimer’s Disease International atinge cerca de 50 milhões de pessoas em todo mundo,  ocorre quando o processamento de certas proteínas do sistema nervoso central começam a falhar. Surgem, então, fragmentos de proteínas mal cortadas, tóxicas, dentro dos neurônios e nos espaços que existem entre eles. Por consequência dessa toxicidade, ocorre perda progressiva de neurônios em certas regiões do cérebro, como o hipocampo, que controla a memória e o córtex cerebral, essenciais para a linguagem, raciocínio, memória, reconhecimento de estímulos sensoriais e pensamento abstrato.

Quais são os sintomas do Alzheimer?

O primeiro sintoma e o mais característico do Mal de Alzheimer, é a perda de memória recente. Com a progressão da doença, vão aparecendo sintomas mais graves como, a perda de memória remota (ou seja, dos fatos mais antigos), bem como irritabilidade, falhas na linguagem e prejuízo na capacidade de se orientar no espaço e no tempo. 

(Imagem: Freepik)

Entre os principais sinais e sintomas do Alzheimer estão:

– Falta de memória para acontecimentos recentes;

– Repetição da mesma pergunta várias vezes;

– Dificuldade para acompanhar conversações ou pensamentos complexos;

– Incapacidade de elaborar estratégias para resolver problemas;

– Dificuldade para dirigir automóvel e encontrar caminhos conhecidos;

– Dificuldade para encontrar palavras que exprimem ideias ou sentimentos pessoais;

– Irritabilidade, suspeição injustificada, agressividade, passividade, interpretações erradas de estímulos visuais ou auditivos, tendência ao isolamento.

Cannabis no tratamento do Alzheimer

Em 2016, pesquisadores do Salk Institute, na Califórnia (EUA), encontraram evidências preliminares de que o tetrahidrocanabinol (THC) e outros fitocanabinoides presentes na Cannabis tinham potencial para remover a beta-amiloide, proteína que forma as “placas” no cérebro responsáveis pelo Alzheimer. Os testes foram conduzidos em neurônios cultivados em laboratório, mas forneceram pistas para o desenvolvimento de novas terapias contra a doença. No ano seguinte, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (Anvisa) autorizou, pela primeira vez, a prescrição de óleo enriquecido com CBD para o tratamento de um paciente que sofria de Alzheimer no Brasil.

Revisão dos estudos existentes

Uma revisão literária classificou diversos artigos publicados em bancos de dados científicos, como o da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), EBSCO e PubMed, em diferentes datas. A princípio, os conteúdos foram selecionados por terem vasto acervo de trabalhos científicos publicados sobre a área de Ciências da Saúde. Em síntese, a revisão revelou que, além dos fármacos comumente empregados nas terapias tradicionais, os estudos têm demonstrado o grande potencial terapêutico dos compostos da cannabis na recuperação da memória e na melhora da cognição e do comportamento ao atuarem como protetores do sistema nervoso e limitarem o processo neurodegenerativo na doença de Alzheimer.

No entanto, segundo o diretor científico do Sechat, Dr. Pedro Pierro, neurocirurgião funcional, com especialidade em dor, transtornos de movimentos, epilepsia, cirurgia psiquiatra, além de pioneiro na prescrição de cannabis medicinal no Brasil, “O THC e o CBD não restauram áreas cerebrais já danificadas, mas o tratamento pode trazer mais qualidade de vida aos pacientes ao ajudá-los a reaprender atividades simples como escovar os dentes, arrumar a cama e se alimentar, sem auxílio de outras pessoas”.

Caso real

Recentemente pesquisadores brasileiros demonstraram por meio de testes, que microdoses de canabinoides podem reverter a perda de memória causada pela doença. O estudo publicado no Journal of Medical Case Reports, trata-se de um caso inédito onde os cientistas da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), trataram um paciente com extrato de cannabis rico em THC por 22 meses, demonstrando sua eficácia no controle dos danos à memória.

O paciente, um agricultor chamado Carlos (79), foi diagnosticado com a doença há 3 anos e, ao apresentar perda de memória, cognição e movimentos, procurou os pesquisadores da universidade, que de imediato iniciaram o tratamento com os derivados da planta.

Hoje, após sete anos de seu diagnóstico e quatro anos de tratamento com o extrato de cannabis, o Sr. Carlos leva uma vida normal, isto é, os compostos presentes na planta o mantiveram estável e aumentaram sua capacidade cognitiva e de memória durante todo o estudo.

Para o professor da UNILA e coordenador da pesquisa, Prof. Francisney Pinto Nascimento: “É preciso salientar que atualmente  existem apenas 4 medicamentos disponíveis para tratamento do Alzheimer e todos eles são bastante limitados em sua eficácia, além disso, não conseguem retardar a progressão da doença como a cannabis foi capaz de fazer neste paciente”. Os pesquisadores destacam ainda que mais testes em relação à terapia canabinoide e o Alzheimer já estão em andamento, mas os primeiros resultados são promissores.