5 doenças comuns em idosos em que a cannabis pode ajudar

“Enquanto profissional da geriatria, entendo que em poucos anos não haverá tratamento para o idoso que deixe de perpassar pela terapia com os canabinoides”, destaca Dr. Marcelo Moren Netto

Publicada em 18/11/2022

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Por João R. Negromonte

A população brasileira está envelhecendo. Atualmente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, cerca de 29 milhões de brasileiros têm 60 anos ou mais e, à medida que os indivíduos envelhecem, o sistema imunológico torna-se menos eficaz, o que pode causar prejuízos à saúde dos mais velhos.

Por conta da perda da capacidade de distinguir antígenos estranhos e o atraso na produção de algumas células de defesa, aliadas com a incapacidade de se reproduzir certas proteínas, contribuem para o fato de que os idosos são mais vulneráveis a contrair determinados cânceres, infecções e distúrbio neurológicos.

Pensando nisso, listamos aqui cinco patologias comuns na velhice e dicas de como a terapia canabinoide pode ajudar tal população a recuperar sua qualidade de vida e bem-estar, muitas vezes perdidos em decorrência às patologias ou tratamentos convencionais com medicamentos tarja preta.

> Alzheimer

A Doença de Alzheimer (DA) é um transtorno neurodegenerativo progressivo e fatal que se manifesta pela deterioração cognitiva, de memória, comprometimento progressivo das atividades de vida diária e uma variedade de sintomas neuropsiquiátricos e de alterações comportamentais. 

A doença instala-se quando o processamento de certas proteínas do sistema nervoso central começa a dar errado. Surgem fragmentos de proteínas mal cortadas, tóxicas, dentro dos neurônios e nos espaços que existem entre eles. Por consequência dessa toxicidade, ocorre perda progressiva de neurônios em certas regiões do cérebro, como o hipocampo, que controla a memória, e o córtex cerebral, essencial para a linguagem e o raciocínio, memória, reconhecimento de estímulos sensoriais e pensamento abstrato.

A cannabis contra o Alzheimer

Em 2016, pesquisadores do Salk Institute, na Califórnia (EUA), encontraram evidências preliminares de que o tetrahidrocanabinol (THC) e outros fitocanabinoides presentes na Cannabis tinham potencial para remover a beta-amiloide, proteína que forma as “placas” no cérebro responsáveis pelo Alzheimer. Os testes foram conduzidos em neurônios cultivados em laboratório, mas forneceram pistas para o desenvolvimento de novas terapias contra a doença.

No ano seguinte, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (Anvisa) autorizou, pela primeira vez, a prescrição de óleo enriquecido com CBD para o tratamento de um paciente que sofria de Alzheimer no Brasil.

Recentemente, um estudo publicado no Journal of Medical Case Reports, reportou um caso inédito em que pesquisadores brasileiros da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), demonstraram melhoras significativas na memória afetada pelo Alzheimer de um paciente que fez uso de extrato de cannabis rico em THC, princípio ativo da planta.

“É preciso salientar que atualmente  existem apenas 4 medicamentos disponíveis para tratamento do Alzheimer no Brasil e todos eles são bastante limitados em sua eficácia, além disso, não conseguem retardar a progressão da doença como a cannabis foi capaz de fazer neste paciente” revelou o coordenador da pesquisa, Prof. Francisney Pinto Nascimento. 

> Doenças cardiovasculares

Alguns nomes como Infarto Agudo do Miocárdio, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e Hipertensão, são doenças cardiovasculares características do aumento do colesterol (composto gorduroso utilizado na produção das membranas celulares de alguns hormônios), responsáveis pelo entupimento de veias e artérias.

Só no Brasil, milhões de pessoas vivem com colesterol alto, número que significa 40% da população, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia. 

Claudinelli Alvarenga Aguilar, médica cardiologista e nutróloga, salienta que a dislipidemia (aumento de colesterol) pode ser adquirida por uma alimentação desequilibrada e rica em gorduras saturadas, alimentos processados, frituras em geral, bem como ser de origem genética.

Terapia canabinoide contra o colesterol

Segundo  estudo de 2012 publicado no  British Journal of Clinical Pharmacology, a aplicação direta de CBD causaria uma redução na pressão arterial vascular. Isto porque o  canabidiol tem ações diretas em artérias isoladas, provocando vasorelaxamento e, consequentemente,  protegendo contra os danos vasculares causados ​​por um ambiente com alto teor de glicose e inflamação.

O consumo de óleo de cânhamo pode ter um impacto positivo nos níveis de colesterol, dependendo da resposta do organismo, mas de qualquer forma, a maconha e o CBD, segundo alguns especialistas, ainda têm um longo caminho a percorrer.

> Ansiedade/Depressão

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), hoje em todo mundo, mais de 280 milhões de pessoas lutam contra a depressão e, estima-se que cerca de 265 milhões de indivíduos convivem com a ansiedade. Além daqueles que lutam contra ambos.

Embora, muitos ocasionalmente sintam ansiedade e depressão temporárias, devido a certos eventos da vida, para estas milhares de pessoas, tais distúrbios relacionados à saúde mental podem ser muito debilitantes, causando desconfortos que chegam ao ponto de perder a qualidade de vida , impedindo-os de desfrutar de uma vida social saudável, manter relacionamentos, empregos e até mesmo uma renda estável.  

Os efeitos da cannabis em pacientes com ansiedade/depressão

Nos últimos anos, houve um aumento crescente na procura de tratamentos fitoterápicos que trazem menos efeitos adversos para o organismo. Ao mesmo tempo, estudos que comprovam a eficácia da cannabis para o tratamento da ansiedade e da depressão também não param de surgir. 

Em pesquisa recente, realizada no Canadá, foram entrevistadas mais de sete mil pessoas, incluindo uma clínica licenciada, com relatos de pacientes que usam cannabis para ansiedade e depressão, que declararam melhorias. 

Para a realização da pesquisa, foram avaliados pacientes com uma idade média de 49 anos, sendo que, 53,1% eram do sexo feminino. Essas pessoas responderam questionários validados tanto para ansiedade quanto para depressão. Desse modo, aqueles pacientes que buscaram ativamente a cannabis para tratar um dos dois distúrbios, relataram melhoras em relação àqueles que não utilizaram da terapia.  

“Até onde temos conhecimento, tal estudo é o maior concluído até o momento, examinando o impacto do uso de cannabis medicinal nos resultados de ansiedade e depressão utilizando dados longitudinais e questionários validados”, destacam os autores da pesquisa.

> Dor crônica

A dor aguda é aquela que surge repentinamente e tem duração limitada. Geralmente, alerta o indivíduo sobre alguma lesão ou disfunção no organismo, como contusões, cólicas intestinais e queimaduras na pele. Já a dor crônica passa a ser danosa. 

Ela é reconhecida como sintoma crônico após três meses de sofrimento, mesmo que as causas já tenham sido removidas ou tratadas. As dores crônicas podem atingir pessoas de todas as idades, porém, são mais comuns em idosos. 

Os principais causadores são: problemas lombares, câncer, herpes-zoster, diabetes, cefaléia, enxaqueca, fibromialgia, osteoartrite e lesões musculares.

A cannabis no tratamento para dor crônica

Os opiáceos são drogas muito comuns no tratamento de dores. No entanto, a substância provoca forte dependência química e física, além de agredir o fígado. Por outro lado, a maconha medicinal pode trazer os mesmos efeitos analgésicos, sem causar danos, nem dependência. 

Em julho de 2019, um grupo de cientistas da Universidade de Guelph (Canadá) realizou um estudo para identificar as moléculas da cannabis que ajudam a combater a dor. No estudo, publicado pela revista Phytochemistry, os pesquisadores explicam como usaram uma combinação genômica e bioquímica para descobrir a forma como a planta produz canflavina A e canflavina B, duas moléculas que são 30 vezes melhores para combater uma inflamação do que a aspirina.

Já o estudo brasileiro “Uso de canabinoides na dor crônica e em cuidados paliativos”, realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e publicado na Revista Brasileira de Anestesiologia em 2008, mostrou que o THC puro e respectivos análogos apresentam aplicabilidade clínica, o que demonstra os benefícios contra diversos tipos de dor, inclusive a neuropática. O desenvolvimento das substâncias sintéticas puras, buscando a atenuação de efeitos psicoativos indesejáveis aponta para perspectivas favoráveis à sua utilização no futuro.

> Parkinson

O Mal de Parkinson, como é popularmente conhecido, é uma doença degenerativa do sistema nervoso central crônica e progressiva, causada por uma diminuição intensa da produção de dopamina, um neurotransmissor que ajuda na comunicação de mensagens entre as células nervosas.

A dopamina auxilia na realização dos movimentos voluntários do corpo de forma automática. Essa substância presente no cérebro, faz com que não seja necessário pensar em cada movimento que os músculos realizam.

Quando há a falta dela, especificamente em uma pequena região encefálica chamada substância negra, o controle motor do indivíduo é perdido. Portanto, ocasiona sinais e sintomas característicos.

Ao longo do envelhecimento, os indivíduos classificados como saudáveis apresentam morte progressiva das células nervosas que produzem dopamina. Por outro lado, algumas pessoas perdem essas células num ritmo muito acelerado e, assim, acabam por manifestar os sintomas da doença. 

Os principais sintomas são: lentidão motora, rigidez entre as articulações do punho, cotovelo, ombro, coxa e tornozelo. Além dos tremores de repouso notadamente nos membros superiores e geralmente predominantes em um lado do corpo quando comparado com o outro e, finalmente, o desequilíbrio. É possível ocorrer também “sintomas não-motores”, diminuição do olfato, alterações intestinais e do sono, por exemplo. 

Uso da cannabis no tratamento de Parkinson

Uma pesquisa, considerada uma das maiores já realizadas no mundo, observou, em 2019, 1.348 relatos de pacientes relacionando o uso medicinal da cannabis com o tratamento da patologia. O estudo usou um periódico da Associação Alemã de Parkinson, que é distribuído em todo o país, por meio de relatos ambulatoriais de pacientes portadores da doença.

As perguntas separavam os grupos de pesquisados em usuários frequentes, moderados e não usuários da planta. Com idade média de 71 anos, os entrevistados revelaram que, entre aqueles considerados usuários frequentes, 54% relataram melhora significativa dos sintomas da doença. Além disso, mais da metade, daqueles que se consideraram utilizadores frequentes e moderados, disseram que a cannabis apresentou maior eficácia que os medicamentos tradicionais usados no tratamento da doença, como o Levodopa.

Já a utilização terapêutica da cannabis sativa ou dos respectivos derivados é conhecida há muitos anos e, depois de vários estudos, o uso do canabidiol foi liberado em algumas condições neurológicas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), inclusive a paralisia cerebral.

Opinião do especialista

Para o Dr. Marcelo Moren Netto, médico, pós graduado em pediatria pela Facis/SP e geriatra pela IBCMED/SP, além de prescritor de cannabis medicinal com especialização e certificação internacional, o equilíbrio dos sistemas corporais são fundamentais para a manutenção da saúde e, de fato, a produção de endocanabinoides e seus receptores no organismo diminuem à medida que se envelhece.

Dr. Marcelo Moren Netto (imagem: arquivo pessoal)

“A população idosa está suscetível ao desenvolvimento e progressão de uma série de disfunções e patologias. Entretanto, a terapia canábica promove o equilíbrio do organismo por meio da reposição adequada de fitocanabinoides (derivados da planta), promovendo o controle do apetite, balanço energético, modulação da dor, neuroproteção, respostas inflamatórias, bem como auxilia na redução da polifarmácia com a diminuição dos efeitos iatrogênicos e consequentes admissões hospitalares”, ressalta Moren. 

O médico destaca também, que caberá ao profissional médico atenção na prática prescritiva com relação ao perfil de risco para ocorrência de efeitos adversos e interações medicamentosas. “Portadores de doenças cardiovasculares graves e instáveis, assim como os portadores de doenças psiquiátricas não tratadas, demandam a devida atenção para o manejo da terapia”.

E conclui: “Eu, enquanto profissional da geriatria, entendo que em poucos anos não haverá tratamento para o idoso que deixe de perpassar pela terapia com os canabinoides, especialmente diante de sua eficácia e segurança”.