Fiocruz conclui estudo de R$ 4 milhões sobre ações judiciais por cannabis no Brasil
Análise inédita mapeou processos movidos contra a União para acesso a tratamentos e busca subsidiar políticas públicas do Ministério da Saúde sobre a crescente demanda no SUS
Publicada em 26/09/2025

Este levantamento é parte de um convênio maior, de R$ 23,9 milhões, focado em qualificar a análise de processos judiciais de medicamentos em geral. Imagem: Leonardo Oliveira/FioCruz
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Ministério da Saúde, finalizou uma pesquisa detalhada sobre as ações judiciais de cannabis movidas contra a União. Concluído em agosto de 2025, o estudo contou com um investimento de R$ 4 milhões para analisar por que pacientes recorrem à Justiça para obter acesso a tratamentos à base da planta.
Este levantamento é parte de um convênio maior, de R$ 23,9 milhões, focado em qualificar a análise de processos judiciais de medicamentos em geral. O objetivo principal da meta sobre cannabis foi traçar um panorama claro da demanda no Sistema Único de Saúde (SUS) e fornecer subsídios técnicos para a tomada de decisão do Ministério da Saúde.
Resultados e lacunas regulatórias
Como resultado prático, a pesquisa já gerou artigos científicos que abordam o marco regulatório, a crescente demanda e a segurança dos produtos de cannabis disponíveis no país. A expectativa é que novas publicações sejam divulgadas ao longo do próximo ano, aprofundando as análises.
Um dos artigos, intitulado "A expansão do mercado da Cannabis medicinal no Brasil e as lacunas regulatórias", aponta que o mercado já movimenta mais de R$ 165 milhões em gastos públicos desde 2015.
O texto destaca que falhas normativas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) permitem o acesso a produtos não classificados como medicamentos e sem avaliação de eficácia ou segurança.
Níveis de evidência científica
O estudo também salienta a baixa qualidade das evidências científicas para muitas das indicações terapêuticas solicitadas nas ações judiciais de cannabis. Segundo o levantamento, apenas o canabidiol (CBD) para tratamento de epilepsias refratárias possui alto nível de evidência. Outras indicações foram apontadas com níveis médios de evidências, como:
- CBD para Doença de Parkinson;
- Nabiximóis (medicamento fitoterápico à base de Cannabis, também conhecido como Sativex ou Mevatyl) para dor crônica, espasticidade, sono e depressão;
- Dronabinol (forma sintética do tetrahidrocanabinol - THC) para dor crônica, perda de apetite e Síndrome de Tourette.
As autoras do artigo sugerem que a Anvisa precisa adotar uma postura mais assertiva na regulação desses produtos para garantir a segurança dos pacientes.
Como o estudo foi realizado?
Para a pesquisa, uma equipe multidisciplinar da Fiocruz analisou um vasto volume de dados do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde (DJUD/SE/MS). Foram investigados processos judiciais cadastrados entre janeiro de 2021 e dezembro de 2023.
A metodologia, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública (CEP/Ensp), extraiu 24 variáveis distintas dos processos. Com base nelas, foram calculados 18 indicadores-chave para traçar o perfil dos demandantes e entender como o sistema de Justiça tem respondido a esses pedidos.