O segredo de Portugal: engenheiro agrônomo revela o que está por trás do sucesso português no mercado canábico

José Martins, uma das maiores referências sobre o tema em toda a Europa, falou sobre cultivo, cânhamo, indústria e as condições que impulsionam Portugal para a liderança

Publicada em 29/01/2025

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José Martins. Foto fornecida por ele próprio.

Portugal tem se destacado no mercado europeu, tanto no que diz respeito à cannabis plantada para uso medicinal quanto em relação ao cânhamo, que tem uso industrial. Atualmente, o país detém a maior extensão de terras europeias dedicadas ao cultivo da planta e o maior mercado exportador do continente. 

Em 2024, os portugueses exportaram cerca de 25 toneladas de cannabis. Lá, o cultivo de cânhamo para fins industriais foi legalizado em agosto de 2020. Eles já têm mais 80 empresas trabalhando com o cânhamo para fins industriais, cultivado em rotação com trigo e milho, por exemplo, e em torno de 60 empresas com autorização para o plantio da cannabis medicinal. 

A maior delas é a Fai Therapeutics, da qual faz parte a Agrovete, onde José Martins trabalha como diretor técnico. Ele cuida de cerca de 5,5 hectares de cultivo de cannabis para uso terapêutico e mais de 300 hectares de cânhamo industrial entre Portugal e Espanha.

Para entender melhor como o cânhamo e a cannabis medicinal têm se enraizado definitivamente no solo lusitano, conversamos com o José:
 


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1) José, eu vi na matéria da Agence France-Presse (AFP) o seu depoimento dizendo que, em toda a Europa, Portugal talvez tenha as melhores condições ambientais para o plantio de cannabis. Quais características do solo e do clima portugueses contribuem para isso?

José: Em Portugal temos condições muito favoráveis. Na Europa, somos o país com mais horas de luz solar, um fator essencial para o crescimento das plantas. Aliado a isso, temos temperaturas altas que nos permitem semear mais cedo e prolongar as plantas por mais tempo, tornando-as mais produtivas. Essas altas temperaturas e a baixa precipitação de chuva durante o verão levam a que seja muito baixa a incidência de doenças nas plantas. Os solos são de boa estrutura, bem drenados, embora a matéria orgânica seja baixa. Todo o processo produtivo pode ser feito em modo biológico, preservando o meio ambiente e obtendo uma qualidade superior nos produtos finais.

 

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José Martins no 1º Congresso Ibérico de Cânhamo, em Badajoz, Espanha.


2) Aqui no Brasil, a Universidade Federal de Viçosa (UFV) mapeou a aptidão brasileira para o cultivo de cannabis. O mapeamento, chamado Potencial brasileiro para o cultivo de Cannabis sativa para uso medicinal e industrial, revelou que no Brasil 80% das terras cultiváveis são aptas para a produção da cannabis industrial. Vocês têm mapeamento desses em Portugal? Caso sim, que informações você destacaria?

José: De norte a sul, temos sim. Aqui, as fábricas não podem ter uma distância maior de 200 km da plantação, porque a rentabilidade baixa, os galhos se perdem. Também destacaria que é muito importante distinguir o cânhamo industrial da cannabis medicinal, são culturas que precisam ser feitas de forma diferente e com finalidades diferentes.

3) Para plantar cannabis em larga escala, é mais vantajoso o plantio com agrofloresta, com agroecologia ou com monocultura? Por quê?

José: Em larga escala, só é possível plantar o cânhamo. A cannabis medicinal, não, por causa dos custos com segurança, que são muito altos.

A cultura em rotação é a melhor, não a monocultura. É possível plantar em “modo biológico”, como se diz na Europa (agroecológico, por exemplo, no Brasil), porque é uma planta que tem baixas pragas e doenças, por ser uma cultura mais rara. Caso contrário, teria que ser em modo convencional, usando fungicidas naturais.

Já temos 6 medicamentos à base de cannabis na Europa. E temos 2 projetos, o medicinal, que vimos na matéria da AFP, e o cânhamo industrial, para tijolos de construção. O tijolo de cânhamo é fácil de mexer porque é um tijolo leve, se comparado com o convencional. Ele permite que a casa respire, controlando perfeitamente a temperatura interna, e não pega fogo. Ele ainda troca o ar, de dentro para fora e de fora para dentro.

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4) Vi que você participou do 1º Congresso Ibérico de Cânhamo. Como foi? Quais informações sobre o tema que circularam por lá ou que você mesmo expôs você destacaria?

José: E também participei do 1º Congresso Mundial de Cânhamo, na França. Foi muito interessante! Toda a indústria, desde o agricultor até o cliente final, tem bastante interesse nessa cultura. Existe alta atratividade nesses congressos, os fóruns estão sempre lotados, muito cheios, recheados de projetos em áreas distintas do cânhamo, que vão desde o uso do cânhamo para fazer papel até usos tecnológicos, têxteis, na confecção de sapatos, na construção, enfim, a indústria toda está com interesse no cânhamo.

O melhor é aproveitar a cultura no seu todo. Quem quer fibra longa normalmente só pensa em fazer cultura para fibras longas, quem quer para curta só pensa em cultura para curtas, assim como para sementes. Mas tentamos aglomerar tudo isso, enviar as fibras longas para a indústria têxtil e de automóveis, as curtas, para papel e construção civil, depois as sementes, o pó para nutrição. Em Portugal dizemos "do porco, nós aproveitamos tudo": o cânhamo é o porco.

Podemos aproveitar todos os subprodutos para outras coisas, dando maior valor econômico para o produto e melhores salários para os trabalhadores das fazendas, dando melhores condições de vida para eles.

5) É verdade que o plantio de cânhamo pode beneficiar o solo e o clima? Como o cânhamo industrial pode ajudar a combater os problemas ecológicos da atualidade?

José: O cânhamo é uma planta com particularidades que nenhuma outra planta tem, como a capacidade de absorver metais pesados do solo como nenhuma outra. Podemos usá-lo para descontaminar solos, uma vantagem ambiental tremenda.

Ele faz captação de CO2. Não existe nenhuma outra planta no mundo com tamanhas capacidades. São onze a catorze toneladas de carbono captadas por ano por hectare (10 mil m²), é como uma floresta de eucalipto por vinte anos. Isso é essencial, porque queremos baixar os níveis de CO2. Eu acredito que, nos próximos quadros econômicos, as culturas vão ser pagas por sequestro de CO2, e o cânhamo faz isso.

Além do mais, ele é uma planta que não necessita de grande quantidade de fertilizantes e produz quase sem produtos químicos, sem fungicidas, o que permite fazer uma cultura amiga do meio ambiente.

6) Você comentou sobre a baixa incidência de doenças nas plantas. Aqui no Brasil, a Universidade Federal de Lavras (UFLA) está pesquisando a incidência de ácaros e insetos em plantações de cannabis. Que “pragas” aparecem mais nas plantações de cannabis em Portugal? Como vocês fazem o manejo delas?

José: O que mais nos causa prejuízo na cannabis medicinal é uma lagarta. Ela aparece na altura da floração e causa grandes prejuízos na quantidade e na qualidade das flores. Tratamos isso de modo preventivo, com bacillus thuringiensis. Com umidade, também surge a botrytis (podridão), tratada com produtos biológicos, como óleo de laranja. No Brasil, se fosse quimicamente, seria mais fácil, mas na Europa temos sido obrigados a deixar os químicos.

7) Por fim, você gostaria de fazer considerações finais?

José: A cultura do cânhamo industrial está num ritmo grande, porque foi proibida por muito tempo. Há questões de pesquisa fundamentais para desenvolver agora para trazer confiança para o processo, todo dia se descobrem novas utilidades para o cânhamo. Sobre a cannabis medicinal, temos vários estudos na Europa para tratamento de câncer e doenças muito complicadas com resultados muito positivos. É uma cultura do passado, por ter milhares de anos, mas com um futuro extraordinário.

 

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