Regulamentação do cultivo de cannabis no Brasil é urgente e benéfica
O Brasil se encontra em um momento decisivo para o futuro da cannabis medicinal e do cânhamo industrial
Publicada em 28/02/2025

Imagem ilustrativa: Canva.
A professora Andrea Galassi, coordenadora do Centro de Referência sobre Drogas e Vulnerabilidades Associadas da Universidade de Brasília (UnB), destacou a necessidade urgente de estabelecer uma cadeia produtiva nacional de cannabis para garantir medicamentos de qualidade e ampliar o acesso aos pacientes. A declaração foi feita durante o evento "A Política Nacional sobre Drogas: Um Novo Paradigma", promovido pelo Brasil 247, TV 247 e Consultor Jurídico, com apoio do grupo Prerrogativas, em Brasília (DF).
Galassi ressaltou que a falta de uma produção nacional torna o Brasil dependente da importação, o que encarece os tratamentos e dificulta a regulação da qualidade dos produtos. "No campo da pesquisa, precisamos ter possibilidade de fazer pesquisa científica no país sem nenhum tipo de perseguição. Fizemos um ensaio clínico controlado com dependentes de crack fazendo o uso de cannabidiol. Foi uma epopeia realizar esse estudo por conta de toda a dificuldade de importação", afirmou a pesquisadora.
Ela também destacou a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que exige que o Ministério da Saúde apresente uma normativa para o plantio e acesso ao uso medicinal da cannabis. Para Galassi, a medida impõe responsabilidades ao governo: "O ministério, se não a Anvisa, é responsável por promover a cannabis para fins terapêuticos e medicinais, e essa decisão reforça essa missão, que já é prevista em lei".
A pesquisadora defendeu ainda a criação de um comitê interdisciplinar sobre políticas de drogas, reunindo especialistas de diversas áreas, para subsidiar o Executivo e o Judiciário na formulação de uma política mais justa. Segundo ela, é fundamental avançar na regulamentação da produção nacional de cannabis para reduzir barreiras de acesso e melhorar a qualidade dos medicamentos disponíveis.
Um mercado bilionário em potencial
A regulamentação do cultivo da cannabis no Brasil representa não apenas uma questão de saúde, mas também uma oportunidade econômica significativa. Estudos indicam que o setor pode movimentar bilhões de reais nos próximos anos, com impacto direto na indústria farmacêutica, no agronegócio e na geração de empregos. Atualmente, o país depende fortemente da importação de medicamentos à base de canabidiol (CBD), o que encarece os tratamentos e limita o acesso para milhares de pacientes. É preciso produzir nacionalmente.
O desenvolvimento de uma cadeia produtiva nacional não só reduziria custos, mas também impulsionaria a pesquisa e a inovação, permitindo a adaptação de cultivares ao clima e solo brasileiros. A Universidade Federal de Viçosa (UFV) já deu um passo importante nesse sentido ao iniciar um banco genético de cannabis, com cerca de 400 variedades da planta.
Impactos sociais e ambientais do cultivo local
Especialistas apontam que a regulamentação também traria ganhos ambientais e sociais. O relatório "Cânhamo: a Commodity do Futuro" destaca que a planta pode ser uma aliada na recuperação de áreas degradadas, consumindo menos água que culturas tradicionais e contribuindo para a captura de carbono da atmosfera. Além disso, o cultivo nacional pode estimular o desenvolvimento de comunidades agrícolas e fortalecer cadeias produtivas sustentáveis.
Por outro lado, a falta de regulação impede que pequenos produtores e cooperativas participem desse mercado, mantendo a concentração nas mãos de empresas que podem bancar os custos elevados da importação e da burocracia atual. Assim, um modelo regulatório inclusivo poderia garantir oportunidades para diferentes perfis de produtores, desde agricultores familiares até grandes indústrias.
Desafios e resistências na regulamentação
Apesar dos avanços, desafios políticos e burocráticos ainda precisam ser superados. Em dezembro de 2024, a Advocacia-Geral da União (AGU) solicitou uma prorrogação do prazo para regulamentação, alegando a necessidade de mais tempo para preparar normas e medidas de fiscalização. Essa ação gerou preocupação entre especialistas, que temem novos atrasos na implantação das regras.
Enquanto isso, outros países avançam na regulamentação e exploram os benefícios econômicos da planta. No Brasil, estados como Paraíba, Rio de Janeiro e São Paulo já possuem legislação própria para o cultivo e distribuição de produtos derivados de cannabis, demonstrando que a regulamentação federal é não apenas viável, mas também urgente.
O momento de agir é agora
A regulamentação do cultivo da cannabis no Brasil é uma necessidade iminente, tanto para a economia quanto para a saúde pública. A decisão do STJ representou um avanço significativo, mas sua efetivação depende da celeridade dos órgãos competentes. O Brasil tem a chance de se tornar um líder na produção e pesquisa da cannabis medicinal na América Latina. Para isso, é fundamental que a regulamentação ocorra de forma rápida, eficiente e inclusiva, garantindo benefícios para pacientes, associações canábicas, pesquisadores, agricultores e a economia como um todo.