Para Mechoulam, falta de estudos sobre canabidiol faz com que se percam muitas vidas

A declaração foi dada durante a última edição do TGH Talks, programa produzido pela The Green Hub e veiculado pela startup em seu canal do Youtube nesta quarta-feira (26)

Publicada em 27/08/2020

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Charles Vilela

O médico e cientista israelense Raphael Mechoulam considera que a saúde mundial está perdendo tempo e deixando de salvar vidas por não dedicar atenção a estudos que investiguem mais profundamente os benefícios do canabidiol. “Estamos perdendo muita coisa”, constatou. “O canabidiol é um excelente exemplo de droga que causa essencialmente nenhum efeito colateral e não é tóxico. Se os (testes) clínicos modernos fossem feitos com o canabidiol e seus derivados, teríamos novos tipos de drogas (disponíveis) para (tratar) várias outras doenças.”

A declaração de Mechoulam, que é considerado a maior autoridade mundial em pesquisas sobre a Cannabis medicinal, foi dada durante a última edição do TGH Talks, programa produzido pela The Green Hub e veiculado pela startup em seu canal do Youtube nesta quarta-feira (26). Participam ainda da conversa Marcelo De Vita Grecco, cofundador da The Green Hub; Edson Cordeiro, diretor do Merck Group; Stevens Rehen, cientista, pesquisador e professor titular da UFRJ; e Daniel Jordão, diretor do Sechat, portal dedicado à maconha medicinal e os negócios da Cannabis. A atração é apresentada por Alex Lucena, diretor de Inovação da The Green Hub. 

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Mechoulam citou o estudo do médico e pesquisador brasileiro Elisaldo Carlini, considerado um marco que colocou o canabidiol no mapa da ciência brasileira e do mundo quando o assunto é o tratamento de convulsões. A pesquisa foi realizada na Escola Paulista de Medicina, em São Paulo, e teve a participação da equipe da Universidade Hebraica de Israel, que agregou nomes como o de Mechoulam.

Ele contou que em certo ponto do estudo, estava reunido com Carlini para discutir sobre o fato de as possibilidades de uso dos canabinoides no tratamento da epilepsia já serem conhecidas há muito tempo, em literatura popular registrada por diversas gerações, mas haver poucos estudos a respeito. “Há informações do século 15 sobre isso, mas não havia um trabalho moderno, embora alguns grupos estivessem desenvolvendo experimentos com animais”, disse. “Carlini e eu decidimos que deveríamos fazer um teste clínico e, então, isolamos (em Israel) quase meio quilo de canabidiol a partir do haxixi para mandar ao Brasil.” 

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Outra possibilidade de tratamento com canabidiol é a diabetes de tipo 1. Foram realizados testes em animais que possuem exatamente os mesmos mecanismos de defesa dos humanos e foi descoberto que o canabidiol é uma droga que apresenta resultados excelentes. “Normalmente esse tipo de ratos pega diabetes muito cedo e morre jovem”, exemplificou. “Nós administramos em alguns desses animais o canabidiol, e os que receberam viveram muito mais tempo de vida do que os que não receberam. Houve algo ali, o canabidiol definitivamente agiu. Conhecemos bem esse mecanismo, que, nesse caso, é exatamente igual aos dos humanos nesse caso.”

Para Mechoulam, é uma lástima a carência de estudos mais robustos sobre o canabidiol, pois, possivelmente, diversas doenças poderiam ser tratadas. Segundo ele, há uma necessidade da produção de novas drogas para diversas enfermidades. No caso do diabetes tipo 1, nem todos os pacientes são tratados atualmente. “Por que isso ocorre se temos um componente, o canabidiol, que tem excelentes resultados em animais? Então, deveriam haver testes clínicos e mesmo assim não há. Essa é uma questão que envolve aspectos legais, pois não há uma patente, o que dificulta que as empresas realizem testes clínicos.”

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Outro exemplo de estudo promissor é o do psiquiatra e pesquisador alemão Markus Leweke. Há cerca de três anos, ele conduziu um teste clínico com canabidiol para tratar a esquizofrenia, que é doença de tratamento complicado porque nem todos os pacientes conseguem ser tratados com as drogas que estão no mercado atualmente. Embora a maioria responda positivamente ao que se tem disponível, outros não, além de os medicamentos provocarem efeitos colaterais sérios. “Muitas pessoas preferem não fazer uso. Já o canabidiol não tem grandes efeitos colaterais e não é tóxico”, disse, ao lembrar que Leweke usou canabidiol em pacientes com esquizofrenia e os resultados publicados foram bastante positivos. Houve, ainda, um segundo teste com pacientes com esquizofrenia que foi publicado por outro grupo de pesquisadores e, mais recentemente, um terceiro que descobriu que em concentrações pequenas o canabidiol não age, pelo menos não como Leweke mostrou no começo. 

Mesmo com essa série de estudos mostrando que o canabidiol é uma droga muito promissora para a esquizofrenia, nada de prático aconteceu nos últimos anos. “Nós, cientistas, poderíamos estar ajudando os pacientes, e eu poderia dar muitos exemplos”, disse. “Temos uma situação em que há muitos trabalhos pré-clínicos e um grande número de doenças, mas infelizmente muito poucos estudos se direcionando para a clínica.” Mechoulam sugere que seria importante preparar derivados ainda mais potentes do que o canabidiol sozinho e disponibilizar essas patentes para as empresas utilizarem em testes clínicos. Ele cita como exemplo de componente o ácido de canabidiol, que já é produzido por uma empresa, mas muitos outros poderiam estar sendo investigados e utilizados em testes clínicos.