A Cannabis poderia reduzir as dores e retardar a possível aposentadoria “precoce” de Luis Suárez?

Apesar de ser considerada uma doença da terceira idade, o crescente número de casos entre atletas como Suárez e praticantes de esporte têm sido preocupantes, despertando a atenção da ciência e levando a inúmeras pesquisas na área

Publicada em 15/07/2023

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Por Jimmy Fardin e Francisney Nascimento

Recentemente o atacante do Grêmio, o uruguaio Luis Suárez, manifestou sua possível aposentadoria precoce – embora já tenha 36 anos, porém ainda esteja jogando em alto nível - devido a dores pela artrose no joelho direito. Luisito, infelizmente não é o único a sofrer da osteoartrite entre atletas profissionais. 

Apesar de ser considerada uma doença da terceira idade, o crescente número de casos entre atletas como Suárez e praticantes de esporte têm sido preocupantes, despertando a atenção da ciência e levando a inúmeras pesquisas na área, pois qualquer pessoa pode desenvolver a doença em algum momento da vida.

Zico, um dos maiores atacantes do Flamengo, Bebeto, Tetracampeão mundial e o Rei Pelé, foram alguns dos que sofreram com dores nas juntas após uma carreira extenuante, porém não menos brilhante. 

A osteoartrite, como hoje é denominada a artrose, é a terceira maior causa de afastamento de trabalho no país, perdendo apenas das dores nas costas e da depressão. Além disso, a osteoartrite é a 4a doença que mais causa necessidade de aposentadoria, mesmo em pacientes  que não são atletas. 

Segundo o Ministério da Saúde, a enfermidade atinge, atualmente, 15 milhões de pessoas no país. No mundo, é a quarta que mais reduz a qualidade de vida, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Existem alguns fatores que podem contribuir com o aumento da inflamação articular, principalmente de joelhos, e quadris como obesidade, sedentarismo, fraqueza muscular, idade, dentre outros. 

Tratamentos convencionais x cannabis

Existem alguns métodos de tratamento para evitar que essa inflamação se perdure e cause a artrose, no entanto, de forma geral são pouco eficazes ou costumam induzir muitos efeitos adversos. Ingestão de ácido hialurônico, colágeno tipo 2, infiltração articular, PRP (plasma rico em plaquetas), fisioterapia, fortalecimento articular são medidas que podem ajudar a retardar o processo de degeneração. 

Não há ainda no mercado uma substância que renove a cartilagem ou regenere o que já foi degenerado. Somente com procedimentos cirúrgicos é possível reverter fisicamente o desgaste e impedir que o osso impacte no osso quando a cartilagem se foi.  

Alguns estudos com a cannabis medicinal já identificaram receptores canabinóides em proteínas onde as substâncias da planta, como THC e CBD, podem se ligar nas articulações. Além disso, experimentos em cobaias (ratos de laboratório) demonstraram benefícios no impedimento do curso da inflamação intra articular com o uso de canabinóides em forma de óleo oral. 

Sabemos que estes receptores canabinoides também estão presentes no líquido sinovial de pacientes com osteoartrite, e que a Cannabis pode ativar células chamadas de fibroblastos, que possuem envolvimento com a produção da cartilagem. 

Interessante mencionar também que no líquido sinovial de pacientes com osteoartrite foram encontrados os endocanabinoides anandamida e 2AG, que não estão presentes em pacientes saudáveis, o que evidencia a atuação do sistema endocanabinoide na tentativa de tratar esta doença.

Assim como na evidência clínica, na prática do dia-a-dia, podemos evitar que alguns pacientes fossem submetidos a procedimentos cirúrgicos de artroplastia (colocação de prótese nos joelhos). A cannabis ajuda no processo de modulação dessa inflamação articular, assim, o edema (inchaço) vai diminuindo e consequentemente também as dores, logo o paciente consegue fazer um fortalecimento mais adequado e uma proteção maior à sua articulação, retardando assim o processo de desgaste. 

Acreditamos que Suárez seria um grande candidato ao tratamento com a cannabis medicinal, porém, infelizmente a cannabis é vista como doping (uso de substância proibida) no futebol. De acordo com a legislação esportiva, ele poderia somente usar o CBD (canabidiol), que é apenas 1 dos mais de 140 canabinóides que poderiam ajudá-lo sem causar maiores problemas, como a WADA (Agência Mundial Anti-Doping) acredita. 

Embora existam estudos em animais demonstrando a eficácia de canabinoides em modelos de osteoartrite e são centenas ou milhares de casos clínicos que conhecemos na pŕatica do dia-a-dia, ainda não existem ensaios clínicos amplos e controlados avaliando os efeitos da Cannabis que demonstrem doses e protocolos específicos. 

Contudo, um dos projetos do grupo de pesquisa para 2023 da Universidade de Integração Latino-Americana (UNILA), executa um ensaio clínico, duplo-cego e controlado por placebo com duas doses de um extrato full spectrum de Cannabis em 48 pacientes com a doença. 

Esperamos que tenhamos resultados positivos, ou seja, redução da dor e aumento da qualidade de vida nestes pacientes e que possamos adicionar  conhecimento e protocolos específicos para tratamento desta doença que reduz muito a qualidade de vida do paciente e que, em atletas como Suarez, El Pistolero, pode inclusive ser fator para abandono da carreira. 

Neste momento, está sendo cogitado que Luisito passe pelo procedimento de artroplastia (prótese), o que acabaria com sua carreira. Desperdiçar a tentativa de tratamento com a cannabis por uma proibição controversa da cannabis no esporte, é algo triste e lamentável. Quantos mais irão sofrer sem que se possa ao menos tentar utilizar essa ferramenta medicinal tão efetiva e promissora?

Sobre os autores*

Jimmy Fardin - Médico ortopedista e traumatologista, com especialidade em cirurgia do joelho e artroscopia, especialista em medicina do esporte, possui amplo conhecimento sobre medicina canábica e colunista do portal Sechat

Francisney Nascimento – Farmacêutico, Doutor em Farmacologia e Pós-doutorado em Neurofarmacologia. Coordenador de pesquisas clínicas com Cannabis na UNILA.