Anvisa simplifica trilha regulatória para o mercado da cannabis medicinal

Mas o grande “problema” do mercado da cannabis brasileiro continua sendo a falta de maturidade regulatória

Publicada em 09/05/2024

Anvisa proíbe atividades da Cannect no mercado nacional de cannabis 

Por Claudia de Lucca Mano

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Advogada especializada em assuntos regulatórios Anvisa OAB SP 151.039

No último dia 02 de maio, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamentou a obtenção de certificado de boas práticas para produtos de cannabis, medicamentos, produtos, biológicos e insumos farmacêuticos, mediante sistema de confiança com órgãos reguladores internacionais. A publicação da normativa facilita a trilha regulatória para o mercado da cannabis medicinal e outros medicamentos.

A IN 292/24 permite a utilização de relatórios de autoridades estrangeiras equivalentes para o processo de inspeção e certificação do Código de Boas Práticas de Fabricação (CBPF). A abordagem reduz a sobreposição de esforços de agências regulamentares e mitiga a burocracia e o tempo de espera para as empresas.

Na norma recente, a Anvisa reconheceu como Autoridades Reguladoras Estrangeiras Equivalentes (AREE) a EMA da Agência Europeia de Medicamentos, o FDA - Food and Drug Administration, dos Estados Unidos, e uma lista imensa de mais quarenta países com quem o Brasil mantém, agora, relação de confiança regulatória em medicamentos, como, por exemplo, Reino Unido, Portugal, México, Japão, França e até Ucrânia.

Importante destacar que há anos empresas que fabricam medicamentos ou produtos médicos hospitalares, em todo o mundo, são compelidas a passar por inspeção da Anvisa, para verificação de cumprimento de normas de boas práticas brasileiras.

Desde que a exigência começou, a Anvisa e o mercado enfrentam o principal gargalo regulatório do país: o prazo muito grande para obtenção da certificação de boas práticas de fabricação (ou GMP - Good Manufacturing Practices). Isso porque os técnicos brasileiros precisam viajar e conduzir inspeção in loco no país estrangeiro.

Para contornar o problema, e tomando consciência de que é impossível visitar todas as fábricas do planeta, a Agência vem estabelecendo mecanismos de confiança e cooperação com governos e organismos certificadores internacionais que possibilitam que as inspeções locais sejam reaproveitadas para o necessário certificado de BPF brasileiro.

As importadoras que pretendem liberação sanitária de produtos de cannabis para o mercado brasileiro, sob a autorização sanitária da RDC 327/19, agora podem ter o processo de CBPF bastante facilitado pela cooperação da Anvisa com agências internacionais.

Mas o grande “problema” do mercado da cannabis brasileiro continua sendo a falta de maturidade regulatória. Hoje, há predominância de produtos importados sem registro, estrutura regulatória da RDC 660, que permite ao paciente trazer, com receita médica e visto da Anvisa, o remédio que não existe no Brasil.

Já para as marcas que obtiveram a autorização sanitária pela RDC 327, cerca de 30, o tique-taque do relógio regulatório continua incomodando. Isso porque aos cinco anos da autorização sanitária vencerá o prazo para que as indústrias apresentem estudos clínicos de eficácia e segurança e elaborem dossiês para registro como medicamento, cumprindo todo o rigor regulatório, que hoje a Anvisa ainda excepciona para produtos de cannabis.

Resta saber quando a Agência deve retomar a revisão da RDC 327, timidamente iniciada em 2023, mas que pouco evoluiu. Interlocutores dos setores técnicos da Anvisa admitem que a pandemia dificultou o início das análises clínicas por parte das empresas, o que escusaria a demora maior do que o normal e esperado.

Mas não há sequer um texto de Consulta Pública proposto pela Agência para discussão. A medida aguarda a conclusão da Análise de Impacto Regulatório, prometida para setembro do ano passado.

Enquanto isso, o mercado segue em regime regulatório de exceção, trazendo insegurança jurídica para empresas, médicos e pacientes que aderiram à medicina canabinoide.