Há uma semana, associação cuida de 60 plantas de cannabis dentro da Delegacia da Polícia Federal

"Não aguentam mais uma semana", diz representante da Ascamed sobre plantas apreendidas na operação Desvio Verde

Publicada em 21/03/2025

Há uma semana, associação cuida de 60 plantas de cannabis dentro da Delegacia da Polícia Federal

Plantas e frascos de óleo apreendidos pela Polícia Federal. Imagem: Arquivo pessoal

Hoje completa uma semana que representantes da Associação Cannábica Medicinal (Ascamed) ingressam na Delegacia da Polícia Federal em Santa Maria, Rio Grande do Sul, para regar pés de maconha. O fato curioso teve inicio na última sexta-feira (14), após a operação "Desvio Verde", onde a policiais confiscaram cerca de 64 plantas e 350 frascos de óleos.

Todos os dias, às 11h, o presidente da associação, Matheus Hampel, e o diretor de produção, Henryque Benetti, entram na sede da PF, munidos de regadores, para cuidar das plantas confiscadas. Segundo a associação, a situação das plantas é crítica.

O espaço onde as plantas estão mantidas é pequeno, mal iluminado e sem ventilação adequada, o que tem prejudicado o crescimento das plantas. “Elas precisam urgentemente sair de lá, não aguentam mais uma semana”, afirmou Júlia Silvester, diretora social da Ascamed.

De acordo com Júlia, a Polícia Federal tem colaborado com a manutenção das plantas. Anderson Rodrigo Andrade de Lima, chefe da delegacia, foi quem autorizou a entrada dos representantes da associação.

Quanto à devolução dos materiais apreendidos, a PF entende que é de competência do judiciário.    

 

Entenda o caso

 

Na manhã de sexta-feira (14), a Polícia Federal executou um mandado de busca e apreensão em três propriedades ligadas à Ascamed. Além das plantas e dos frascos de óleo confiscados, aproximadamente 900 plantas foram incineradas e outros materiais destruídos.

Segundo Júlia, os cultivadores foram tratados de forma agressiva durante a operação, inclusive com armas apontadas para eles. Agora, a Ascamed, que conta com cerca de 900 associados, enfrenta a incerteza sobre o futuro dos tratamentos de seus pacientes e busca apoio de outras associações para suprir a demanda.

 

A operação "Desvio Verde"

 

A ação da Polícia Federal foi deflagrada após a descoberta de uma plantação de cannabis em uma propriedade rural em 2024. Segundo a PF, a Ascamed teria utilizado indevidamente um Habeas Corpus, concedido ao presidente Matheus Hampel, para cultivar e comercializar óleo de cannabis sem a autorização devida.

No entanto, a associação argumenta que está em processo para obter a regularização desde 2023, contando com um parecer favorável do Ministério Público Federal, que autorizou temporariamente o cultivo até decisão judicial definitiva.

A Ascamed também afirma que a operação foi um “flagrante preparado”, alegando que a Polícia Federal divulgou informações antes da conclusão da ação.

 

“O trabalho não pode parar”

 

Apesar das incertezas, a Ascamed continua a se movimentar e fomentar o debate. Na quinta-feira (20), Matheus Hampel esteve presente na reunião da Comissão de Segurança, Serviços Públicos e Modernização do Estado do Rio Grande do Sul, onde denunciou a ação da Polícia Federal ao presidente do colegiado, Leonel Radde.

Durante a reunião, Hampel fez um apelo por ações estaduais que protejam os pacientes que dependem da cannabis medicinal. “Precisamos de um marco regulatório estadual para garantir um ambiente legal para as associações de cannabis medicinal, sem o medo de perseguições e sem depender das lentas decisões da Justiça Federal”, destacou.

Hampel também mencionou o “vácuo legislativo” existente no país. "As associações não são criminosas. Somos a prova de que o Estado falhou ao não garantir o acesso democrático à cannabis medicinal", afirmou, reforçando que os trabalhos da Ascamed devem continuar.

Para exigir justiça, a Ascamed realizará neste domingo (23), em Santa Maria, um ato público para denunciar a recente operação policial que "apreendeu a saúde" dos pacientes. O evento reunirá pacientes, familiares, profissionais de saúde, ativistas e lideranças locais para discutir a regulamentação do cultivo associativo de cannabis medicinal e a exigência de justiça para aqueles que tiveram seu tratamento interrompido.

A reportagem procurou a Polícia Federal de Santa Maria, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.