Autorização judicial abre portas para tratamento médico com maconha 

Conheça os casos de Viviane e Piero, que conseguiram entrar legalmente no Brasil com flores de cannabis in natura

Publicada em 06/10/2023

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No cenário mundial em constante evolução das políticas relacionadas à cannabis, o Brasil viu dois casos notáveis que destacaram a importância da autorização judicial para o uso terapêutico da planta. Viviane Stuhlmiller, uma brasileira que reside na Alemanha há 15 anos, e Piero Liebman, um advogado argentino, encontraram uma saída legal para ingressar no Brasil com flores de cannabis in natura, proporcionando alívio para suas condições médicas. 

Uma jornada de esperança 

Viviane Stuhlmiller sofre com condições médicas crônicas que acometem milhões de pessoas em todo o mundo: a fibromialgia e a doença de Chrow (doença inflamatória que afeta, normalmente, a parte inferior do intestino delgado, o intestino grosso ou ambos).  

Depois de enfrentar anos de tratamentos tradicionais e sentir pouca melhora, Viviane decidiu explorar outras alternativas terapêuticas. Foi então que ela se deparou com as evidências crescentes do potencial dos compostos da cannabis. 

“Em decorrência dessas doenças, desenvolvi ansiedade e depressão. Contudo, quando descobri a cannabis, minha vida mudou. Hoje trato tudo com cannabis medicinal em flor 24% Tetrahidrocanabinol (THC) e até os próprios médicos ficaram surpresos com os meus resultados”, destacou a paciente que completa: “cheguei a usar Tilidina e Fentanil e acredite, nada deu tão bons resultados como a cannabis”.  

Após pesquisa e consulta com médicos na Alemanha, Viviane recebeu uma autorização do governo alemão para usar cannabis medicinal no controle de suas patologias. Com ela em mãos, decidiu visitar sua terra natal, o Brasil. No entanto, trazer a cannabis para o país estava longe de ser uma tarefa simples. 

Foi aí que ela embarcou em um voo com 300 gramas de flores de cannabis in natura. Ao desembarcar em terras brasileiras, enfrentou uma série de desafios legais, mas, com sua autorização judicial alemã e a ajuda da advogada criminalista Marcela Sanches, que representou Viviane em seu pedido de Habeas Corpus (HC), ela defendeu sua necessidade médica e, finalmente, obteve permissão para continuar o tratamento em seu país de origem. 

“Tenho que renovar meu HC de ano em ano e, no caso da Alemanha, pego uma autorização direto com ministério da saúde em um órgão tipo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para ter a permissão de viagem na Europa. No caso do Brasil, minha autorização vale pela data que acompanha a minha passagem. Por exemplo, esse ano levei 100g de flor, que é o que eu ganho mensalmente do governo alemão por não ter condições de arcar com os altos custos”, explica Viviane.  

Piero Liebman: advocacia pela cannabis medicinal 

Piero Liebman é um advogado argentino que, como Viviane, encontrou alívio nas propriedades medicinais da cannabis. Ele também buscou a autorização judicial em seu país para tratar uma condição médica crônica com cannabis medicinal. Com a permissão em mãos, ele viajou para o Brasil com 40 gramas de flores de cannabis in natura. 

Ao desembarcar por aqui, Piero enfrentou um processo semelhante ao de Viviane, mas a defesa baseada na autorização judicial argentina e na necessidade médica resultou na autorização para prosseguir com o tratamento no país. 

“Desde abril, nosso escritório de advocacia começou a trabalhar na possibilidade de poder levar flores de cannabis para o Brasil. Começamos a esgotar a via administrativa, tivemos que falar com o consulado brasileiro, que nos encaminhou para a alfândega, controlada, neste caso, pela Anvisa”, diz o advogado em entrevista ao El Planteo

Mesmo não obtendo as respostas que procurava, visto que as autoridades brasileiras simplesmente não atenderam ao pedido, Liebman gostaria que fosse respeitado seu direito à saúde consagrado na Argentina através do Reprocann

“Todos os Estados, pelo menos aqueles com os quais partilhamos os mesmos conceitos de Direitos Humanos, têm de respeitar a saúde dos habitantes uns dos outros quando estão no seu próprio território”, defendeu o advogado. 

No entanto, a partir da falta de resposta da Anvisa e com apoio dos advogados brasileiros especializados no tema, Italo Coelho e Emilio Figueredo,  Liebman entra com uma ação contra o Estado brasileiro por negar meu direito à saúde, conseguindo que o Ministério Público se pronunciasse a meu favor, autorizando a entrada de 40g de flores in natura no Brasil para fins medicinais. 

O impacto da autorização judicial para cannabis  

Os casos de Viviane Stuhlmiller e Piero Liebman ilustram a importância de um sistema legal que permita o uso terapêutico da cannabis. A autorização judicial não apenas protege os pacientes que buscam alívio em tratamentos alternativos, mas também estabelece um precedente significativo no debate sobre a legalização da cannabis no país. 

À medida que mais pessoas descobrem os benefícios medicinais da planta, é essencial que o Brasil e outros países continuem a desenvolver políticas que garantam o acesso seguro e regulamentado a essa opção terapêutica. Os casos mostram que a cannabis medicinal pode oferecer esperança e qualidade de vida a muitos que sofrem, desde que haja um sistema legal que permita seu uso de maneira responsável e controlada. 

No Brasil, a cannabis é classificada como droga pela lei 11.343, de 2006, ainda que a Anvisa reconheça sua eficácia terapêutica por meio de resoluções que regulam prescrição, autorização de importação, comercialização e fiscalização de produtos para fins medicinais. Assim, em muitos casos, para a entrada no país com flores in natura, o HC é necessário para garantir o direito à saúde de todos os cidadãos, sejam eles brasileiros ou não.