80% dos pacientes sem efeitos com tratamentos convencionais podem responder à cetamina, diz médico
A cetamina como aliada no tratamento da depressão resistente e dos pensamentos suicidas
Publicada em 24/02/2025
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Imagem: Canva Pro
A cetamina, sintetizada em 1962 nos Estados Unidos, é um dos principais medicamentos usados como anestésico ou antidepressivo. Ao longo do tempo, seus efeitos de ação rápida e segurança foram reconhecidos pela comunidade científica internacional.
Em 2019, a FDA aprovou seu uso para depressões resistentes, e a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu a na Lista de Medicamentos Essenciais.
Estudos apontam que 55,4% dos pacientes com depressão resistente respondem ao tratamento com cetamina, enquanto a eletroconvulsoterapia (ECT) apresenta uma taxa de resposta de 41,2%.
Além disso, cerca de 55% dos pacientes com ideação suicida relatam a eliminação desses pensamentos em até 24 horas após uma única infusão de cetamina, com efeitos durando pelo menos sete dias.
O Dr. Ricardo Alencar, médico anestesista da clínica Mindclinsp, ressalta a segurança e eficácia do tratamento. “Não é um tratamento experimental, pois a droga é utilizada desde 1970, e os estudos para depressão vêm dos anos 2000”, destaca.
A cetamina e suas vias de administração
A cetamina é um anestésico geral de ação rápida que também apresenta propriedades antidepressivas. Seu uso é restrito ao ambiente hospitalar e clínico, sob supervisão médica, podendo ser administrado de diversas formas, cada uma com características.
A cetamina endovenosa é a via mais utilizada, sendo a principal forma de aplicação nos Centros de Cetamina. Já as vias oral e intranasal estão em fase de estudo, porém sem dados conclusivos suficientes para recomendações amplas.
Outras, como a subcutânea e intramuscular, também estão sendo investigadas para compreender melhor a biodisponibilidade do medicamento.
Na aplicação endovenosa, a biodisponibilidade - porcentagem do medicamento que chega à corrente sanguínea - é de 100%, enquanto na via intranasal pode atingir 54% (desde que não haja deglutição). Já a via sublingual e a via oral são 24% e 17%.
Protocolos de administração
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No protocolo adotado pela empresa, o tratamento divide-se em duas fases: ataque e manutenção.
Inicialmente, o paciente, indicado pelo psiquiatra, passa por seis infusões de ataque – realizadas duas vezes por semana, com intervalos de pelo menos um dia. Durante esse período, a dose padrão é de 0,5 mg por kg, administrada em bomba de infusão em cerca de 40 a 50 minutos.
“Após a fase de ataque, o paciente retorna ao psiquiatra para avaliar a necessidade do tratamento de manutenção, que pode incluir uma psicoterapia assistida por cetamina”, explica o Dr. Ricardo.
Quem pode ser paciente?
O tratamento é especialmente indicado para pacientes com depressão resistente – aqueles que não respondem a dois ou mais tipos de antidepressivos convencionais.
Estima-se que 30% a 40% dos pacientes não obtiveram resposta satisfatória aos tratamentos tradicionais, e, desses, 70% a 80% podem responder à cetamina, principalmente na redução da ideação suicida. “Podemos considerar a cetamina uma droga de primeira linha para o tratamento da ideação suicida”, comenta Ricardo.
Experiência do paciente
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Além da eficácia medicamentosa, é importante investir em um ambiente acolhedor e seguro para a realização das infusões. Uma sala climatizada, com iluminação adequada e música ambiente são fundamentais para a experiência dissociativa, garantindo o bem-estar durante a sessão.
“Comparada à eletroconvulsoterapia – que, apesar de eficaz, pode causar prejuízos temporários à memória e às funções neurocognitivas – a cetamina oferece uma alternativa menos invasiva e com menor risco de efeitos colaterais”, explica.
Dr. Ricardo também enfatiza que a cetamina nunca deve ser utilizada como monoterapia. “Ela tem que estar sempre associada a um antidepressivo convencional, mesmo que em alguns casos exclusivos isso não seja possível”.
Aplicação médica
O especialista ressalta que a administração da cetamina deve ser realizada por profissionais capacitados para lidar com sedação. “A especialidade que mais se aproxima desse perfil é a anestesia”, afirma.
Essa expertise permite ajustar com precisão a dose e o tempo de infusão, garantindo maior segurança e controle sobre os efeitos dissociativos da medicação.
Quanto à percepção médica, o especialista acredita que os desafios iniciais já foram superados. “A resistência ao tratamento com cetamina já foi vencida. Hoje ela faz parte dos protocolos clínicos no manejo da depressão resistente, e é essencial que os psiquiatras se atualizem para indicar esse tratamento que, literalmente, tem salvado vidas”, conclui.