Brasília discute ampliação do acesso à cannabis medicinal para autistas
Deputado propõe protocolo clínico e campanhas informativas para integrar a terapia ao SUS
Publicada em 23/04/2025

Imagem: Ângelo Pignaton/ Agência CLDF
Na terça-feira (22), a Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) debateu a ampliação do acesso à cannabis medicinal para autistas. A reunião reuniu especialistas, mães atípicas e representantes de associações para discutir estratégias de regulamentação do uso terapêutico da Cannabis sativa em casos de transtorno do espectro autista (TEA), epilepsia e dores crônicas. Também foi pautado o incentivo à pesquisa científica sobre os efeitos da planta.
Durante o encontro, o deputado Fábio Felix (PSOL), apresentou propostas para superar os entraves no acesso à cannabis medicinal no Distrito Federal. Entre elas, está a formação de um grupo de trabalho com o secretário de Saúde para desenvolver um protocolo clínico que viabilize a incorporação da terapia ao Sistema Único de Saúde (SUS). O parlamentar também defendeu a criação de materiais informativos – impressos e digitais – para combater o preconceito sobre o uso da substância.
“A falta de informação e a estigmatização do tema impactam na hora de criar um repertório de possibilidades para o tratamento [do autismo]”, afirmou Felix. “Esses elementos geram a impossibilidade de o tema ser abordado na formação profissional e na Secretaria de Saúde.”
Histórias de transformação com o uso do canabidiol
Mãe de uma criança com autismo, Aline Rodrigues Ferreira relatou que o tratamento com canabidiol (CBD) trouxe melhorias significativas para seu filho Daniel, principalmente na redução da irritabilidade, comportamentos repetitivos e dificuldades de socialização.
“Já faz dois anos que utilizamos o canabidiol. A terapia nos proporcionou qualidade de vida. Daniel aprendeu a lidar melhor com a ansiedade e conseguiu progredir na escola”, disse Aline.
Tatiane Borges, vice-presidente da associação Aliança Verde, compartilhou sua trajetória com o uso do CBD. Seu filho, autista e diagnosticado com Síndrome de Sotos e epilepsia refratária, chegou a ter 30 crises convulsivas por dia. Com o tratamento, as convulsões cessaram completamente.
“Quando tivemos acesso ao óleo integral da Aliança Verde, nossa vida mudou. Hoje, meu filho não tem nenhuma crise convulsiva. Ele frequenta escola regular, brinca e tem mais autonomia”, afirmou Tatiane.
Desafios regulatórios e financiamento público
A neurologista pediátrica Jeanne Mazza, do Hospital Universitário de Brasília (HUB-UnB), destacou que, apesar da liberação do uso compassivo do CBD pelo Conselho Federal de Medicina desde 2014, o fornecimento público é restrito a casos específicos de epilepsia.
“A regulamentação em 2020 foi extremamente conservadora. Apenas três tipos de epilepsia foram contemplados, o que exclui outras condições importantes, como o TEA”, pontuou Mazza.
O peso do preconceito
Para o presidente do Instituto Agroecológico de Fitoterapia Bioser, Igor Aveline, o estigma associado à cannabis ainda é um dos maiores obstáculos ao acesso. “O preconceito impede que famílias iniciem a terapia canábica precocemente. Isso é consequência de uma política de Estado que prioriza a guerra às drogas em detrimento da saúde pública”, criticou.
Aveline ainda destacou que, em 2024, o Governo do Distrito Federal gastou em média R$ 25 mil por paciente judicializado para acesso ao CBD. Já o Instituto Bioser, com apoio de um programa social, atendeu mais de 100 famílias, promovendo uma economia de R$ 2,5 milhões aos cofres públicos.
“Nossa proposta é utilizar esses recursos para abrir uma clínica pública, em parceria com outras associações, e garantir acesso seguro e contínuo ao tratamento”, explicou Aveline.
Conteúdo publicado originalmente em CLDF