Executivos em busca de transformação: psicodélicos e o novo caminho para a liderança empresarial
líderes empresariais buscam nas viagens psicodélicas um caminho para uma evolução espiritual e profissional
Publicada em 07/01/2025
Imagem: Canva Pro
Escondida ao pé das Montanhas Rochosas canadenses, há uma casa de madeira que serve como um centro de retiro, construída em pinho e abeto, decorada com esculturas de cogumelos, tapeçarias azuis e livros como "O Cérebro Doutrinado", todos revelando uma transformação prometida: entre como um CEO e saia como alguém iluminado.
Em uma terça-feira à noite, em outubro, um grupo de executivos vestindo moletons e leggings chegou, carregando a energia nervosa de quem desembarca no acampamento de verão. Eles estavam ali para um retiro chamado “The Psychedelic CEO”, que foi observado por Emma Goldberg, repórter do The New York Times.
O guia, Murray Rodgers, já foi um executivo agressivo no setor de petróleo e gás. Cerca de uma década atrás, após uma exibição e o fracasso de uma oferta pública inicial, Rodgers, em seu aniversário de 60 anos, assistiu a comédias românticas e questionando sua vida. Isso levou a uma jornada de autodescoberta, que incluiu ioga e, eventualmente, ayahuasca na Costa Rica, seguida de várias experiências com cogumelos e noites psicodélicas. Aos 69 anos, ele se considera espiritualmente, psicologicamente e profissionalmente transformado.
Rodgers escreveu um livro, “The Psychedelic CEO”, e começou a organizar retiros. Em outubro, ele guiou cinco líderes empresariais, todos administradores de pequenas empresas na área de Calgary. Após chegarem, se acomodaram e, enquanto tomavam sopa de lentilhas, Rodgers apresentou uma pauta.
A primeira atividade foi uma microdose de psilocibina, uma substância presente nos cogumelos alucinógenos. Depois de distribuir as pílulas, ele trouxe um "mapa da consciência", que mostrava estados mentais como vergonha, culpa e iluminação, e pediu que cada um identificasse sua condição atual. Com um ar de sessão corporativa alternativa, ele perguntou: “Quem está nervoso com amanhã?”, e quando algumas mãos se levantaram, ele respondeu: “Do outro lado do medo está o amor.”
Psicodélicos e líderes corporativos: uma relação antiga
A relação entre líderes corporativos e psicodélicos já tem décadas, como detalhado no livro de Michael Pollan, “How to Change Your Mind”. Na década de 1950, o entusiasta Al Hubbard mostrou-se pelos Estados Unidos apresentando LSD a executivos de grandes empresas, astros de Hollywood e até políticos, promovendo os efeitos das drogas psicodélicas. A popularidade foi crescendo, com publicações como a revista Life e programas de TV trazendo à tona histórias de encontros místicos com psilocibina.
Nos anos 1960, as drogas psicodélicas chegaram ao Vale do Silício, onde engenheiros e executivos participaram de sessões experimentais em busca de soluções criativas. Myron Stolaroff, um executivo de tecnologia, ajudou a criar um centro de pesquisa para essas experiências.
Com o tempo, porém, os psicodélicos se associaram à contracultura hippie e ao movimento de "ligar, sintonizar, largar", popularizado por Timothy Leary, levando à sua nomeação no início dos anos 1970. Mas o interesse dos líderes empresariais nunca foi isolado. Figuras como Steve Jobs consideraram o LSD uma experiência fundamental, e recentemente, Sam Altman e Elon Musk também expressaram apoio ao uso de substâncias psicodélicas.
Em 2023, estima-se que cerca de oito milhões de adultos nos Estados Unidos obtiveram psilocibina. Esse interesse crescente gerou uma indústria de retiros psicodélicos voltados para líderes empresariais, como o “The Journeymen Collective”. Rodgers, por exemplo, cobrou cerca de US$ 4.000 por retirada.
O lado médico e os riscos
Embora a popularidade esteja aumentando, os psiquiatras alertam que o uso de psicodélicos fora de um ambiente controlado e acompanhado por profissionais pode ser arriscado, especialmente para quem tem histórico de transtornos psiquiátricos. Charles Nemeroff, da Universidade do Texas, destacou os riscos potenciais de pânico e ansiedade. Além disso, o Dr. Bryan Roth, da Universidade da Carolina do Norte, mencionou a possibilidade de microdosagem crônica causar danos às válvulas cardíacas.
Ainda assim, o estigma em torno dos psicodélicos está atrapalhando o mundo empresarial. Um afrouxamento das normas culturais e a valorização crescente da imaginação e abertura emocional nas empresas têm preparado o terreno para essa mudança. Alguns líderes veem nos psicodélicos uma ferramenta de transformação pessoal, embora outros temam que o abandono do ego possa levar à perda de ambição ou de suas cargas, como alertado por um CEO de inteligência artificial que disse que muitos fundadores de empresas de tecnologia deixaram seus cargos após experiências psicodélicas.
Transformação pessoal e empresarial
Rodgers avisou que os participantes de seus retiros "se renderiam" e redefiniriam suas expectativas. Na manhã seguinte ao primeiro encontro, ele guiou o grupo em uma caminhada silenciosa, enquanto se preparava para uma jornada psicodélica. Lisa Stickle, uma conhecida de Rodgers no setor de petróleo e gás, também esteve lá para supervisionar, em sua nova função de “trip sitter”.
Antes da experiência principal com psilocibina, Rodgers lembrou a todos sobre a importância da respiração e da concentração, destacando que a jornada seria única para cada um. O que torna esses retiros especiais é a promessa de uma renovação interna que, segundo Rodgers, pode redefinir a relação dos líderes com o mundo, com os seus negócios e, principalmente, consigo mesmos.
Conteúdo publicado originalmente em The New York Times