Ativista e usuário de Cannabis medicinal critica nota de entidade contra PL 399: “declarações sem fundamento”

Juntos, filho e pai somam mais de uma década de experiência prática dos benefícios da maconha medicinal

Publicada em 25/08/2020

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Charles Vilela

Filipe Suzin tem 30 anos. Utiliza a Cannabis medicinal desde os 19 anos para amenizar os efeitos colaterais de seu tratamento para leucemia. Seu pai, Ivo, com 60 anos de idade, também faz uso da planta há um ano para atenuar as complicações do alzheimer. Juntos, filho e pai somam mais de uma década de experiência prática dos benefícios da maconha medicinal para suportar as doenças que sofrem e os efeitos colaterais pesados das drogas prescritas para eles utilizarem. Filipe luta pela sua saúde e de seu pai. Ele quer que seja reconhecido o direito de viver com mais de qualidade de vida. No caso, a sua própria qualidade de vida e a de seu pai.  

Na semana passada, a publicação de uma nota da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead) causou indignação em Filipe. “A nota tem várias declarações sem fundamento”, argumenta. “Como paciente, não concordo com a postura da associação. Estão usando uma representatividade e um poder de fala para atrapalhar a nossa causa enquanto pacientes e pessoas que sofrem pressão socialmente por isso.”

No comunicado, a entidade diz que “os produtos medicinais derivados da Cannabis, com os resultados que se têm hoje em pesquisas, ainda carecem de evidências científicas para sua indicação terapêutica formal.” O texto continua afirmando que “mesmo o canabidiol, cujo potencial clínico tem sido discutido tem restritas indicações com comprovada eficácia, sendo necessária a realização de novos estudos e que utilizem metodologias adequadas.”

Filipe escreveu uma extensa resposta à Abead e a publicou no Instagram. O perfil @curandoivo existe desde abril de 2019 e já soma quase 40 mil seguidores. Apresenta-se como “apenas uma família que compartilha seus tratamentos com maconha.” 

Ele questiona diversos pontos levantados pela entidade de direito privado. “Será mesmo, que todos os julgados que analisaram e aprovaram quase uma centena de habeas corpus para auto cultivo no país precisam rasgar seus diplomas e reverem o papel da prestação jurisdicional ao cidadão brasileiro? Todos os médicos e cientistas que estudam o tema também?”, questionou. 

“Será que todas as mães que bateram à porta da justiça, ou ainda aquelas que baterão em busca do mesmo benefício para seus filhos, crianças que sofrem com graves crises de epilepsia diariamente - já que todos os fármacos que tentaram não surtiram o mesmo efeito que a MACONHA - elas deveriam ter a sua liberdade ameaçada correndo o risco de apodrecerem na cadeia por isso?”, continua. 

Filipe conta as dificuldades que enfrentava com os efeitos colaterais da quimioterapia o fizeram pesquisar sobre o assunto. Em 2013, passou a compreender mais o tema e resolveu conversar com sua mãe. “Comecei a plantar, mas logo tive dificuldades e interrompi o cultivo e o tratamento”, conta.  Contudo, no ano de 2019, ele voltou a se tratar usando a Cannabis por meio de uma associação Goiânia, cidade onde reside. “Foi aí que começou na verdade (a minha luta). Antes disso eu não estava no meio, não tinha nada a ver com a questão maconha medicinal”, diz.

Foi depois que viralizou na internet o vídeo com a história de seu pai, em 23 de abril de 2019, que ele aderiu a causa. O vídeo tem quase 26 mil visualizações e mais de de três mil comentários. A partir daí, ele tem se posicionado publicamente cada vez mais de modo mais contundente, para “entender o porquê é tão difícil esse assunto nesse país”. Filipe já tem parte da resposta: “Justamente por falsas acusações igual a entidade fez.”

A nota que o Sechat reproduz a seguir foi publicada originalmente no perfil do Instagram @curandoivo em 21/8/20. 

“NOTA DE REPÚDIO CURANDO IVO EM RESPOSTA À NOTA DA “ABEAD - Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas”

Venho por meio desta carta expor minha indignação em relação à nota publicada pela “ABEAD - Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas” ao que se refere a PL399/15 que "altera o art. 2o da Lei no 11.343, de 23 de agosto de 2006, para viabilizar a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta Cannabis sativa em sua formulação".

Como paciente com autorização judicial para cultivar e produzir medicamentos de MACONHA tanto para meu tratamento de Leucemia quanto para o do meu pai que sofre de Alzheimer, estudo o assunto há muito tempo e conheço na PRÁTICA todos os benefícios da MACONHA para nossa SAÚDE e QUALIDADE DE VIDA, posso afirmar com propriedade que esta nota está totalmente equivocada e induz toda a população e seus associados ao erro, e também ferindo de morte histórias como a do “CURANDO IVO”.

Meu pai só não ficou acamado, fase comum no estágio final do Alzheimer, porque se trata ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE há mais de ano com ÓLEO FULLSPECTRUM DE MACONHA, ou seja, feito a partir de extração das flores de predominância em THC, assim como todos os outros canabinoides da planta. O tratamento, que tem o respaldo de toda metodologia científica criada pelo homem, é feito com acompanhamento do médico prescritor, nutricionista e a melhora de todos os quadros da doença foi e é amplamente registrada e divulgada em vídeos e depoimentos em meus perfis nas redes sociais.

O meu tratamento para Leucemia, detectada há mais de 10 anos, é feito com quimioterápicos diários, tendo as mais variadas reações, que complicam e abalam o meu organismo em um todo e, dos quais não devo e não posso abrir mão. Sem o tratamento com MACONHA que utilizo via INALATÓRIA (vaporizada ou fumada) e também com ÓLEO FULLSPECTRUM, que alivia todos estes efeitos adversos, e me proporciona qualidade de vida, eu já teria desistido há anos e consequentemente perecido! A lembrando que minha autorização abrange FUMAR!

 Ambos PROVAMOS os benefícios da planta e resultados a nossa saúde na prática e na JUSTIÇA, ou seja, será que ela é realmente tão perigosa quanto falam?

Será mesmo, que todos os julgados que analisaram e aprovaram quase uma centena de habeas corpus para auto cultivo no país precisam rasgar seus diplomas e reverem o papel da prestação jurisdicional ao cidadão brasileiro?

Todos os médicos e cientistas que estudam o tema também?

Será que todas as mães que bateram à porta da justiça, ou ainda aquelas que baterão em busca do mesmo benefício para seus filhos, crianças que sofrem com graves crises de epilepsia diariamente - já que todos os fármacos que tentaram não surtiram o mesmo efeito que a MACONHA - elas deveriam ter a sua liberdade ameaçada correndo o risco de apodrecerem na cadeia por isso?

Muitas mães (negras e pobres em sua maioria esmagadora) foram ou serão encarceradas devido às nossas leis injustas e ideias absurdas como as expostas nesta carta.

A nota afirmou que o canabidiol (CBD) que é apenas UM dos vários compostos terapêuticos que temos na planta, tem seu potencial clínico discutível e com restrita eficácia comprovada. Tal afirmativa, de que não há estudos relevantes sobre CANNABIS sativa/ MACONHA é ignorar a evolução da espécie, é fingir que sites reconhecidos mundialmente pela comunidade científica como o "PUDMED” com mais de 23 mil publicações científicas relacionadas à MACONHA, simplesmente não existem.

A ciência existe, a ciência que explica a relação do sistema ENDOCANABINÓIDE que todos os seres humanos, animais, todos os seres vivos deste planeta possuem, com a MACONHA também EXISTE!

Como explicam então todos os países que valorizam e estimulam a pesquisa científica e por isso já legalizaram a MACONHA?

Países em sua grande maioria de primeiro mundo, onde se pode comprar SUPLEMENTOS à base de MACONHA no supermercado, onde crianças tem acesso a PIRULITOS COM CBD, onde você pede adicional de CBD na PIZZA, como é no caso de vários estados nos Estados Unidos e no Canadá.

Infelizmente a ABEAD enche a boca para falar que “substâncias que possam produzir modificações neurobiológicas têm que ter sua regulamentação muito bem feita e controlada”, mas não é compreensivo a preocupação demasiada com a MACONHA que é uma PLANTA, com potencial IN NATURA e FITOTERÁPICO COMPROVADO, sendo que tantas outras drogas legalizadas e SOCIALMENTE ACEITAS, com uso instigado por campanhas publicitárias milionárias, matam milhões todos os dias no país e no mundo.

Uma grande preocupação que deveria ser o abuso desenfreado do álcool, o maior causador de mortes no trânsito, FATO COMPROVADO por incontáveis pesquisas, a ABAED, hipocritamente, tenta inverter os papéis e relaciona o uso da MACONHA com estes fatos antagônicos, bem como com o aumento da violência doméstica.

Será que o cigarro, que onera o estado e mata milhões por ano não preocupa a associação também, ou só uma foto chocante no maço desta droga mortal, mas socialmente aceita já é o suficiente?

Como está o controle ao acesso de menores que encontram facilmente TODAS estas drogas mortais e legalizadas em qualquer esquina? Quantos bilhões em saúde pública são gastos por causa do álcool e do cigarro e que não gera toda esta indignação extremista em vocês?

Por que tanto afinco na perseguição a uma PLANTA, com EFEITOS TERAPÊUTICOS COMPROVADOS CIENTIFICAMENTE?

Gostaria de saber quais as fontes de pesquisa, em quais artigos a ABEAD se baseou para afirmar tão categoricamente que a legalização da MACONHA em alguns países está diretamente relacionada ao aumento de acidentes de trânsito e alto consumo entre adolescentes.

A ABAED afirma que MACONHA causa depressão, mas as inúmeras PESQUISAS CIENTÍFICAS comprovam o oposto. A cada novo dia os casos em nosso país crescem, são pacientes que detêm o devido respaldo científico e assim, conseguem AUTORIZAÇÃO JUDICIAL para cultivar MACONHA! Vejam só, para tratamento de DEPRESSÃO, ANSIEDADE, vocês se baseiam nesses dados também?

Muito contraditório também é a associação citar o aumento da violência de grupos de traficantes, sendo que tais grupos somente existem por conta da criminalização que a associação tanto ajuda a perpetuar, juntamente com o preconceito social e racial, raízes da proibição iniciada no Brasil no século 18 e espalhada como vírus mortal pelo mundo em 1930 pelos EUA.

Mais questionável ainda é que dentre todas essas substâncias que a associação diz “pesquisar e entender”, a MACONHA é a única que tem em sua composição fitocanabinóides como THC, CBD, que são moléculas similares às que produzimos naturalmente em nosso corpo (canabinóides endógenos) e mais uma vez, com seus efeitos terapêuticos amplamente comprovados.

A CANNABIS sativa/MACONHA tem sido utilizada por humanos há mais de 10.000 anos, descrita em detalhes na farmacologia chinesa desde o Império de Shen-Nung (2700 aC) e em diversas outras culturas milenares ao redor do mundo, utilizada como medicamento, mas também na produção de fibras, azeites, alimentação, rituais sagrados, uso social.

Hoje em dia, além do inegável potencial medicinal, temos também uma gama de SUBPRODUTOS SUSTENTÁVEIS da MACONHA na construção civil, nas indústrias têxtil, alimentícia, cosmética, produção de plástico biodegradável, biocombustível, descontaminação de solo entre tantos outros potenciais de uma lista bem longa, basta dar uma rápida pesquisada.

Sendo assim, ao invés de manter a população na ignorância sobre seus reais benefícios, deveriam como associação se informar melhor em fontes confiáveis sobre FATOS relacionados a MACONHA assim como em sua divulgação para finalmente entenderem que a LEGALIZAÇÃO ou DESCRIMINALIZAÇÃO é o primeiro passo para acabar de vez com a injustiça, com o preconceito, com a demonização de uma PLANTA com diversos potenciais dos quais vocês negam.

Uma PLANTA que oferece tantos benefícios ao ser humano, animais e meio ambiente. Que proporciona avanços na ciência, medicina e possibilita que façamos a reparação social com tantos pais, mães, filhos e filhas que são encarcerados injustamente por buscarem saúde e bem estar para os seus.

Nós, cidadãos, esperamos mais seriedade de associações como a ABEAD!

Uma associação que afirma “zelar pela ética e pelo alto padrão científico na divulgação das informações na área e da prática clínica dos profissionais associados” não deveria prestar um desserviço deste nível, nem à população e muito menos aos seus associados!

EQUIPE CURANDO IVO”