Canabidiol age diferente em machos e fêmeas, e ciclo hormonal influencia os efeitos

Estudo com ratas mostra que os efeitos do canabidiol variam de acordo com o ciclo hormonal. A pesquisa levanta pistas importantes sobre o uso do CBD na saúde emocional das mulheres

Publicada em 14/05/2025

Canabidiol age diferente em machos e fêmeas, e ciclo hormonal influencia os efeitos

Ciência aponta que depende do sexo e do ciclo hormonal | Imagem: CanvaPro

A resposta ao canabidiol (CBD) pode ser muito mais complexa do que parece, especialmente quando o corpo em questão é feminino. Uma pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP mostrou que, mesmo em animais, os efeitos do CBD variam de acordo com o sexo e, no caso das fêmeas, também são influenciados pelas fases do ciclo reprodutivo.


Sim, o comportamento hormonal das ratas fez toda a diferença nos resultados. E isso, mais do que curioso, é um dado poderoso: porque ajuda a explicar por que tantas mulheres relatam diferentes sensações ao usar medicamentos (inclusive o canabidiol) ao longo do mês.


"Vimos que as flutuações hormonais típicas do ciclo estral, que se assemelha ao ciclo menstrual humano, impactam diretamente a resposta ao CBD", explica Paloma Molina Hernandes, pesquisadora do Laboratório de Farmacologia do Comportamento da FMRP e autora principal do estudo, publicado na revista Behavioural Brain Research.
Quando o corpo muda, a mente também sente


Durante o estudo, as ratas foram expostas a situações que simulavam pânico. Em uma dessas experiências, os animais foram colocados em um ambiente com pouca oferta de oxigênio, o suficiente para gerar um comportamento típico de fuga, como saltos desesperados. E foi aí que a ciência se deparou com um detalhe revelador: as fêmeas em uma fase específica do ciclo, o diestro, reagiram de maneira muito mais intensa ao estresse do que os machos ou outras fêmeas em fase de proestro.


Mas quando essas mesmas fêmeas em diestro receberam o canabidiol, a resposta de pânico foi significativamente reduzida. O CBD não teve o mesmo efeito nos demais grupos.


“Isso nos leva a crer que o canabidiol pode ser especialmente eficaz em momentos específicos do ciclo reprodutivo feminino, o que abre portas para investigar seu potencial como tratamento para sintomas como a disforia pré-menstrual, por exemplo”, aponta Paloma. A condição, mais comum do que se imagina, é uma forma severa da conhecida TPM, e causa impacto real na qualidade de vida de muitas mulheres.


Machos, fêmeas, camundongos e diferenças


Outro dado interessante veio ao comparar espécies diferentes: enquanto nas ratas o ciclo hormonal influenciou diretamente a resposta ao CBD, nos camundongos fêmeas esse fator não teve o mesmo peso. E mais: nesses animais, as fêmeas precisaram de doses muito mais altas do canabidiol para sentir algum efeito. Já os camundongos machos não responderam ao CBD em nenhum nível.


O motivo? Pode estar no modo como o cérebro dessas espécies regula a progesterona. Enquanto nas ratas há uma variação que acompanha o sangue, nos camundongos, os níveis cerebrais seguem um ritmo próprio, independente da circulação sanguínea. Um pequeno detalhe biológico que muda tudo.


A importância de olhar para o corpo feminino na ciência


Apesar de parecer óbvio, a ciência nem sempre considerou essas diferenças biológicas. Na verdade, por muitos anos, as fêmeas foram sistematicamente excluídas dos estudos, tanto em testes com animais quanto em ensaios clínicos com humanos. A justificativa? Evitar as “complicações” causadas pelas oscilações hormonais.


Mas essa exclusão tem um preço: medicamentos menos eficazes (e até perigosos) para mulheres. “Sabemos que as mulheres têm mais chances de sofrer reações adversas a remédios que foram testados majoritariamente em homens”, alerta Paloma. “É por isso que insistimos na inclusão de variáveis sexuais nos estudos".


Políticas públicas como a do NIH (National Institutes of Health, dos EUA), que desde 2014 exige o uso equitativo de machos e fêmeas em estudos pré-clínicos, têm ajudado a corrigir esse desequilíbrio. No Brasil, a tendência é que essas diretrizes também se consolidem.


O que isso nos diz sobre o CBD e a saúde da mulher?


O estudo conduzido pela FMRP é mais uma peça no quebra-cabeça que tenta compreender o impacto do canabidiol no corpo, e mostra que esse impacto é tudo, menos uniforme. Varia entre sexos, espécies, fases do ciclo hormonal e, claro, contextos de saúde física e mental.


Para a ciência, isso é um convite: é preciso ouvir mais o corpo feminino, respeitar suas particularidades e deixar de lado a ideia de que um tratamento serve igualmente para todos. Para quem está do outro lado, mulheres que sofrem com ansiedade, dor, alterações de humor ou disforia pré-menstrual, essa é uma boa notícia: pode haver um caminho promissor no CBD, desde que olhado com atenção, sensibilidade e rigor científico.