Desaparecimento de 770 quilos de maconha no Paraguai: um reflexo da contradição na política antidrogas

Caso envolvendo a SENAD levanta questões sobre a eficácia da luta contra o narcotráfico e o potencial econômico da legalização da cannabis no Paraguai

Publicada em 28/03/2025

  Desaparecimento de 770 quilos de maconha no Paraguai: um reflexo da contradição na política antidrogas

Imagem: IA

 

O recente desaparecimento de 770 quilos de maconha do escritório regional da Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) em Saltos del Guairá volta a colocar em dúvida a eficácia da política antidrogas no Paraguai. Enquanto o Estado persegue e destrói plantações de cannabis, as próprias instituições encarregadas de combater o narcotráfico se veem envolvidas em irregularidades que evidenciam falhas no sistema.

 

Uma apreensão que desapareceu 

 

A carga desaparecida foi detectada durante uma pesagem antes de sua incineração, gerando um escândalo que levou o Ministério Público a realizar uma operação na sede da SENAD. O Ministério Público apreendeu celulares dos funcionários e o DVR das câmeras de segurança, mas até o momento não há explicações claras sobre como a droga se perdeu.

O incidente expõe a contradição de um sistema que, por um lado, persegue pequenos produtores de cannabis e, por outro, não consegue garantir a transparência no manejo das apreensões. Esse caso reacende o debate sobre se a luta contra o narcotráfico é realmente eficaz ou se apenas administra um negócio que continua operando na clandestinidade.

 

A paradoxa de destruir uma indústria bilionária 

 

Segundo dados da SENAD, nos últimos 18 meses foram destruídos mais de 3.000 hectares de maconha, com um valor estimado de USD 321 milhões. Esse valor é quase 30 vezes superior ao orçamento anual da própria SENAD, que em 2024 chega a apenas USD 10,6 milhões.

Enquanto o Paraguai investe recursos para erradicar essas plantações, países como Estados Unidos, Canadá e Alemanha optaram pela regulamentação da cannabis, alcançando resultados econômicos positivos. Nos EUA, a indústria da cannabis já gerou mais de USD 100 bilhões em impostos e mais de um milhão de empregos diretos.

 

O potencial de uma indústria regulamentada 

 

O Paraguai é um dos maiores produtores de maconha da região, embora toda a sua produção seja destinada ao mercado negro. Legalizar e regulamentar a cannabis poderia transformar essa atividade em uma indústria formal com grandes benefícios econômicos.

Um cálculo baseado na média de produção anual do país indica que:

Aproximadamente 30.000 hectares de cannabis são cultivados.

Cada hectare rende pelo menos 1.000 quilos

Com um preço de USD 15 por grama e duas colheitas anuais, o mercado poderia alcançar USD 450 bilhões.

Aplicando um imposto de 18%, o Estado poderia arrecadar até USD 81 bilhões anuais, superando o orçamento de várias instituições públicas.

 

Corrupção e o custo da ilegalidade 

 

A operação na SENAD em Saltos del Guairá revela uma preocupante falta de controle interno. Todos os funcionários tinham acesso à carga apreendida e, segundo seus depoimentos, "tudo estava normal" até a pesagem final. Esse tipo de irregularidade demonstra que a proibição da cannabis apenas alimenta a corrupção e o enriquecimento ilícito dentro das próprias estruturas estatais.

Regularizar a produção e comercialização da cannabis não significa incentivar seu consumo sem controle, mas sim transformar um problema em uma oportunidade econômica. Com uma legislação adequada, o Paraguai poderia gerar empregos formais, arrecadar impostos e reduzir os custos associados à luta contra um negócio que, claramente, já opera na realidade do país.