Psicodélicos no Brasil: avanços, desafios e o que você precisa saber sobre a regulamentação

Estudo recente reúne 28 artigos científicos e aponta os principais avanços e desafios bioéticos no uso terapêutico de psicodélicos no Brasil, destacando a necessidade de regulamentação, segurança, consentimento informado e acesso justo às terapias

Publicada em 13/08/2025

Psicodélicos no Brasil: avanços, desafios e o que você precisa saber sobre a regulamentação

Imagem Ilustrativa: Canva Pro

 

A regulamentação dos psicodélicos no Brasil permanece bastante restrita. A única exceção é a ayahuasca, liberada para uso religioso e, indiretamente, terapêutico, após regulamentação pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD) em 2010. Outras substâncias, como psilocibina, LSD e MDMA, são classificadas como controladas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que impede seu uso clínico regular. Entretanto, cresce o interesse e a pesquisa sobre o potencial terapêutico dessas drogas, com expectativa de mudanças regulatórias para tratamentos psiquiátricos.

 

Pesquisa bibliográfica recente destaca bioética e segurança

 

Um estudo publicado em julho de 2024 analisou 28 artigos científicos nacionais e internacionais para entender os aspectos bioéticos do uso terapêutico de psicodélicos. Com base em premissas da bioética latino-americana, a pesquisa dividiu os resultados em três grandes eixos: liberdade de investigação científica; consentimento, autonomia e respeito à vulnerabilidade; e igualdade, justiça e equidade no acesso.

O estudo reforça que as questões bioéticas são centrais para garantir que o uso de psicodélicos seja seguro, acessível e benéfico, protegendo potenciais pacientes de danos.

 

Retomada das pesquisas científicas e avanços tecnológicos

 

O interesse científico pelos psicodélicos vem crescendo desde o início do século, após anos de estigma ligado à “guerra às drogas”. Pesquisas atuais utilizam tecnologias avançadas, como neuroimagem, e métodos rigorosos, incluindo estudos controlados randomizados, considerados viáveis para essa área.

Para evitar barreiras éticas e regulatórias, as pesquisas focam em substâncias menos estigmatizadas, como a psilocibina, seguindo protocolos rigorosos de segurança para prevenir efeitos adversos. Os resultados são promissores no tratamento de condições como ansiedade, depressão, enxaqueca e transtorno obsessivo compulsivo.

 

Consentimento informado e proteção à vulnerabilidade

 

O estudo destaca que nenhuma pesquisa ou intervenção deve ocorrer sem o consentimento informado e livre dos participantes, que devem poder revogá-lo a qualquer momento. A autonomia é fundamental, mas deve-se reconhecer que condições de saúde mental, socioeconômicas e educacionais podem afetar a capacidade de consentimento.

No caso dos psicodélicos, o desafio é maior: os efeitos variam muito e podem gerar estados de sugestionabilidade aumentada, o que exige cuidado redobrado no processo de informação e consentimento. Além disso, é fundamental acompanhar os participantes durante e após o uso das substâncias para garantir segurança e bem-estar.

 

Acompanhamento especializado: papel dos terapeutas

 

Nos contextos clínicos, o suporte psicológico durante o uso dos psicodélicos é obrigatório, embora ainda haja debate sobre a melhor forma de oferecê-lo. Terapeutas devem ser especialmente treinados para conduzir essas sessões, respeitando a integridade do paciente e evitando interferências indevidas, especialmente diante da suscetibilidade à sugestão.

A relação entre terapeuta e paciente demanda cuidado com dinâmicas de poder e diversidade, principalmente com grupos sub-representados, como população negra e LGBTQ+. A capacitação adequada dos profissionais é vista como um ponto-chave para o avanço seguro das terapias.

 

Desafios de acesso e justiça social

 

Apesar da eficácia e rapidez dos tratamentos com psicodélicos indicados por estudos, o acesso ainda é restrito. O modelo clínico tradicional exige a presença de equipes especializadas, o que eleva custos e limita a disponibilidade do tratamento, que, no Brasil, está restrito principalmente a contextos cerimoniais ou pesquisas científicas.

Críticas também são feitas ao protocolo que prevê a presença simultânea de terapeutas de gêneros diferentes, por reproduzir concepções familiares e sexistas e não considerar a diversidade e preferências dos pacientes.

O estudo ressalta a importância da diversidade entre terapeutas e no movimento da ciência psicodélica, atualmente majoritariamente formado por homens brancos de classe média, para garantir que os benefícios cheguem a todos.


Perspectivas para o Brasil diante do cenário internacional

 

Enquanto países como Estados Unidos e Canadá avançam na regulamentação e aprovação do uso terapêutico de psicodélicos. No Brasil, a regulamentação dos psicodélicos para uso medicinal ainda é restrita e cautelosa, avançando principalmente por meio de pesquisas clínicas e decisões judiciais que desafiam a rigidez regulatória.