Sistema Endocanabinoide pode ser chave para tratar doenças gastrointestinais, aponta estudo de revisão
Revisão científica destaca o papel dos canabinoides na regulação da motilidade intestinal, inflamação e dor, abrindo caminho para novas terapias
Publicada em 18/03/2025

Imagem ilustrativa: Canva.
Uma revisão abrangente publicada na International Journal of Molecular Sciences analisou o papel do Sistema Endocanabinoide (SEC) no funcionamento do trato gastrointestinal e nas doenças digestivas. Como destaca o CannaReporter, o estudo, conduzido por pesquisadores do Instituto Nacional de Gastrenterologia de Bari, na Itália, concluiu que os canabinoides podem influenciar a motilidade intestinal, a inflamação e a dor abdominal, sugerindo novas possibilidades terapêuticas para problemas digestivos.
O que é o Sistema Endocanabinoide e como ele atua no intestino?
O SEC é um sistema biológico composto por moléculas chamadas endocanabinoides (como a Anandamida e o 2-araquidonoilglicerol, ou 2-AG), além de receptores específicos conhecidos como CB1 e CB2. Esses receptores estão distribuídos pelo sistema nervoso e pelo sistema imunológico, regulando diversas funções corporais, incluindo o equilíbrio do trato digestivo.
No intestino, os receptores CB1 estão localizados no sistema nervoso entérico (o "segundo cérebro" do intestino), além de terminais sensoriais dos nervos vagais e espinhais, controlando a liberação de neurotransmissores. Já os receptores CB2 estão predominantemente no sistema imune, desempenhando um papel fundamental na modulação de inflamações intestinais.
Ou seja, o funcionamento saudável do sistema digestivo depende da regulação do SEC, que impacta diretamente a motilidade intestinal, a secreção de enzimas e a percepção da dor visceral.
SEC e o controle da motilidade intestinal
A motilidade intestinal — ou seja, o movimento do intestino que permite a digestão e absorção dos alimentos — é um dos principais pontos analisados na revisão.
Os pesquisadores destacam que a ativação dos receptores CB1 reduz a velocidade do trânsito intestinal. Isso pode ser útil para tratar distúrbios caracterizados por hiperatividade intestinal, como a síndrome do intestino irritável (SII) em sua forma diarreica. Por outro lado, o bloqueio desses receptores pode ser benéfico para tratar casos de constipação.
Esse mecanismo sugere que a modulação do SEC pode oferecer alternativas para o tratamento de distúrbios gastrointestinais associados à motilidade, ajustando o trânsito intestinal de acordo com a necessidade de cada paciente.
O papel do SEC na inflamação intestinal
Outro aspecto essencial analisado na revisão é a relação entre o SEC e as doenças inflamatórias intestinais, como a doença de Crohn e a colite ulcerativa.
A ativação dos receptores CB2 demonstrou reduzir a inflamação intestinal ao modular a resposta do sistema imunológico. Isso ocorre porque os CB2 regulam a atividade das células imunes, evitando reações inflamatórias excessivas que podem causar danos ao tecido intestinal.
Esses achados sugerem que substâncias que ativam os receptores CB2 poderiam ser utilizadas para o tratamento de doenças inflamatórias intestinais, reduzindo sintomas e melhorando a qualidade de vida dos pacientes.
Endocanabinoides e a percepção da dor visceral
A dor abdominal crônica é uma queixa comum em pacientes com distúrbios gastrointestinais, e os tratamentos convencionais nem sempre são eficazes ou estão associados a efeitos colaterais significativos.
A revisão científica aponta que os compostos do SEC podem regular a percepção da dor visceral, o que poderia levar ao desenvolvimento de novas abordagens para aliviar o desconforto abdominal sem os efeitos adversos dos analgésicos tradicionais.
Isso é especialmente relevante para pacientes com síndromes de dor funcional, como a síndrome do intestino irritável, que frequentemente não respondem bem a tratamentos convencionais.
O potencial das terapias à base de canabinoides
Os pesquisadores também analisaram o uso de canabinoides exógenos, ou seja, substâncias derivadas da Cannabis sativa e seus análogos sintéticos, no tratamento de distúrbios gastrointestinais.
Estudos clínicos já indicam que esses compostos podem aliviar sintomas como náuseas, vômitos e dor abdominal, reforçando o potencial terapêutico dessas substâncias. No entanto, os autores alertam que ainda são necessários mais ensaios clínicos para confirmar a eficácia e a segurança dos canabinoides no contexto da gastroenterologia.
Desafios e perspectivas futuras
Apesar do potencial promissor, a aplicação clínica dos canabinoides enfrenta desafios, como possíveis efeitos psicoativos e variações na resposta entre os pacientes.
Os cientistas destacam que, para garantir a segurança e eficácia dos tratamentos à base de canabinoides, é essencial realizar mais pesquisas sobre como o SEC interage com outros sistemas do corpo. Além disso, abordagens personalizadas podem ser necessárias para ajustar os tratamentos conforme as características individuais de cada paciente.