“Caminho sem volta”: redes de pesquisa se fortalecem e aguardam aval para cultivar com cannabis
Para Fritz Eduardo Kasbaum o ecossistema científico está pronto para expandir, mas ainda depende de mudanças na regulação nacional
Publicada em 10/11/2025

"As redes têm se preparado para esse momento. O esforço tem que ser conjunto, porque é um tema muito complexo, multifacetado, mas o pontapé inicial já foi dado", afirma Fritz Eduardo Kasbaum, Gerente Científico da FAPEG. Imagem Ilustrativa: Canva Pro
As redes de pesquisa estão em plena articulação, buscando parcerias e se preparando para um cenário de expansão da cannabis no Brasil. Esses grupos colaborativos, que unem competências para metas comuns, enfrentam, no entanto, um obstáculo central, a falta de uma regulamentação que permita o plantio para fins de pesquisa em muitas regiões.

A avaliação é de Fritz Eduardo Kasbaum, Gerente Científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG). Durante o 4º Congresso Brasileiro da Cannabis Medicinal, o especialista identificou um claro movimento de preparação dos grupos de pesquisa para o que está por vir.
"As redes têm se preparado para esse momento. O esforço tem que ser conjunto, porque é um tema muito complexo, multifacetado, mas o pontapé inicial já foi dado", afirma.
Kasbaum destaca a importância da colaboração multidisciplinar. "Percebemos hoje a movimentação do Poder Executivo. Os grupos de pesquisa estão interagindo entre si e com o setor produtivo, buscando alternativas." Ele menciona também a interação com "empreendedores, com outros profissionais que são necessários também, como advogados, especialistas em assuntos regulatórios."
Para o gerente da FAPEG, a expansão do uso da planta é uma realidade inevitável. "É um caminho sem volta. Esse tema tem ganhado muita notoriedade e daqui a pouco a gente vai ter a cannabis, não só no âmbito medicinal, mas em diferentes frentes", opina.
O gargalo das Redes de Pesquisa
Apesar do otimismo e da articulação do ecossistema, o principal entrave para o desenvolvimento do setor é a regulamentação. Kasbaum usa o estado de Goiás como exemplo prático desse gargalo.
"Em Goiás há exímios pesquisadores, capacitados na parte de produção de plantas, melhoramento genético. Goiás é um polo muito voltado para o agro, então tem pesquisadores de ponta", destaca.
"Só que Goiás não tem, as universidades não têm autorização para poder fazer plantio", lamenta. O impacto dessa limitação é direto na cadeia de inovação. "Se você não planta, você não pesquisa melhoramento genético, você não desenvolve produto", explica Kasbaum.
"Então, eu acho que essa evolução regulatória e a permissão, ainda que gradativa, inicialmente para fins medicinais, daqui a pouco vai abrir todo um leque de possibilidades", completa.
Fomentando das pesquisa com cannabis em Goiás
Em Goiás, a FAPEG tem atuado proativamente para estruturar o ecossistema local. Kasbaum cita o lançamento de um edital voltado para pesquisas em cannabis como um "caso de sucesso" que permitiu à fundação identificar e mobilizar os pesquisadores do estado.
"A partir desse edital a gente conseguiu mapear os grupos de pesquisa do nosso estado e com esse mapeamento nós estamos agora criando uma rede. Provavelmente a rede goiana de cannabis medicinal", revela.
O edital em questão (nº 24/2024) destinou mais de R$ 730 mil para financiar 14 projetos de pesquisa inovadores sobre o uso terapêutico da cannabis.
As propostas selecionadas, oriundas de instituições como a Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal de Jataí (UFJ) e Instituto Federal Goiano (IF Goiano), abrangem desde técnicas de cultivo e formulações clínicas até a análise de aspectos legais e sociais, visando fortalecer as redes de pesquisa cannabis.
Embrapa também se mobiliza
O movimento visto em Goiás reflete uma tendência nacional, na qual a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) surge como um ator de peso. A instituição, vinculada ao Ministério da Agricultura, também identificou a regulamentação como o principal entrave para que o Brasil utilize seu potencial agrícola no setor.
Recentemente, a Embrapa solicitou formalmente autorização à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar suas próprias pesquisas com a planta. O objetivo é criar um banco de germoplasma (banco genético) para estudar a adaptação de diferentes variedades de cannabis ao solo e clima brasileiros.
Paralelamente, a Embrapa tem trabalhado ativamente nas discussões regulatórias, especialmente para o cânhamo industrial. A empresa firmou parcerias estratégicas, como o acordo com a The Green Hub e o Instituto Ficus, para impulsionar a pesquisa e a regulamentação do cânhamo.
Juntas, as instituições apresentaram um documento que propõe avanços regulatórios, incluindo a atualização da Portaria 344/1998, para estruturar a cadeia produtiva no país, em linha com decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), definindo prazo para regulamentação do cultivo medicinal para maço de 2026.



