Colômbia aposta em certificações para impulsionar mercado da cannabis medicinal

Em meio às tensões comerciais com os EUA, indústria colombiana busca ampliar presença internacional com foco em qualidade e boas práticas

Publicada em 28/03/2025

Colômbia aposta em certificações para impulsionar mercado da cannabis medicinal

Imagem Ilustrativa: Canva Pro

 

Nas últimas semanas, temos acompanhado os sinais de uma possível guerra comercial, iniciada pelo aumento das tarifas alfandegárias impostas pelo governo do presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que gerou reações de países como Canadá, México, China e também da União Europeia, que preparam suas economias para enfrentar esses impactos. Essa conjuntura também afeta a indústria da cannabis na Colômbia, já que suas principais oportunidades de crescimento estão nos mercados externos, além de depender do comércio internacional para a importação de insumos necessários à sua operação.

 

Diante da aparente estagnação do setor — reflexo da perda de força de iniciativas legislativas como a regulamentação do uso adulto ou a recente discussão sobre o uso medicinal da flor seca, entre outros exemplos —, este é um momento oportuno para refletir sobre a situação atual da indústria da cannabis e as lições aprendidas após quase nove anos Lei 1787, aprovada em 6 de julho de 2016 pelo Congresso da Colômbia, estabeleceu um marco legal para regulamentar o uso médico e científico da cannabis no país. A iniciativa, liderada pelo ex-senador Juan Manuel Galán, teve como objetivo garantir aos pacientes o acesso seguro e controlado aos tratamentos à base de cannabis, além de incentivar pesquisas sobre seus benefícios terapêuticos.

 

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Ludy Valero Morales Imagem: Reprodução LinkedIn 

"O que no início parecia uma grande oportunidade para posicionar a Colômbia como líder na região, hoje enfrenta desafios-chave que têm freado seu crescimento e estabilidade", afirma Ludy Valero Morales, CEO da GMP Solutions, com mais de seis anos de experiência na liderança operacional e regulatória de uma das maiores empresas de cannabis da Colômbia, com foco na exportação B2B. À frente da empresa, com mais de 12 anos de atuação, ele  está focado em qualidade, conformidade regulatória e certificações internacionais para as indústrias farmacêutica e da cannabis.

 

De acordo com executivo, "foi graças ao conhecimento e experiência prévios que compreendeu a importância de integrar o rigor do setor farmacêutico à inovação da cannabis medicinal para construir operações sólidas e sustentáveis".

 

Com a promessa de se tornar uma indústria estratégica de interesse nacional, muitos investidores e empresários apostaram alto no desenvolvimento de um setor capaz de impulsionar o emprego e a economia do país. No entanto, por ter sido historicamente associada à política criminal e não pensada como uma atividade agrícola e industrial, essa expectativa foi freada.

 

Para Valero Morales, o setor é inspirador por reunir ciência, sustentabilidade e desenvolvimento econômico com impacto social. Porém, aponta que não foi estruturado de forma prática; os funcionários encarregados de regulamentar e implementar as normas tiveram que aprender no processo, e a falta de apoio contínuo do governo acabou favorecendo interpretações subjetivas das regras.

 

Diante desse cenário, o principal conselho para pequenas e grandes empresas é a padronização de seus processos — ironicamente, também seu maior desafio.

 

No momento em que a Colômbia começa a explorar o uso medicinal da flor seca, é fundamental lembrar que a flor de cannabis de grau farmacêutico exige controles rigorosos quanto ao perfil de canabinoides, teor de terpenos, níveis de umidade e ausência de contaminantes microbiológicos ou metais pesados, entre outros critérios. 

 

"Na minha experiência, na Colômbia já contamos com empresas que possuem cultivos certificados segundo padrões internacionais, com Boas Práticas Agrícolas (GACP), além de derivados e produtos finais que seguem as Boas Práticas de Fabricação (GMP). No entanto, o desafio está no fato de que nem todas as empresas alcançaram esses níveis de conformidade, o que pode criar uma lacuna entre aquelas prontas para competir no mercado da flor seca e aquelas que ainda têm um caminho a percorrer", afirma Valero Morales.

 

A GMP Solutions oferece um amplo portfólio de serviços para a indústria da cannabis medicinal, incluindo consultoria regulatória, desenvolvimento de estratégias de negócios, capacitação e formação para empreendedores. Para empresas mais experientes, disponibilizam consultoria em formulação, desenvolvimento e fabricação de produtos derivados da cannabis (como extratos e óleos), implementação de sistemas de gestão da qualidade (GxP), orientação técnica em manejo de cultivos, colheita, processos de extração e produção, montagem e certificação de plantas GMP para Ingredientes Farmacêuticos Ativos (IFA) e produtos acabados, identificação de oportunidades de inovação para aprimorar produtos e processos, além de apoio para expansão de mercados e diversificação da oferta.

 

Ao longo de sua trajetória acompanhando processos de certificação na indústria da cannabis na Colômbia e no setor farmacêutico global, Valero Morales presenciou empresas que conseguiram se diferenciar e conquistar mercados internacionais — e outras que ficaram pelo caminho por não cultivarem uma cultura de qualidade. "Qual é a diferença entre elas? A chave está na estratégia com que encaram a certificação e na cultura de qualidade que constroem desde o início", reflete.

 

Conhecedora dos requisitos e desafios que envolvem os processos de certificação, ela acredita que as empresas devem, antes de tudo, definir objetivos claros e escolher a certificação adequada ao mercado que desejam alcançar: "O segredo está em pesquisar, planejar a longo prazo e optar pela certificação que realmente agregue valor à empresa, em vez de buscá-la apenas para cumprir um requisito", aconselha.

 

Nesse sentido, Valero Morales também destaca uma percepção equivocada em torno dos processos de certificação. Em sua visão, a certificação não se obtém apenas com documentos e auditorias, mas com uma cultura de qualidade que deve ser cultivada desde o início. "A certificação precisa ser entendida como uma ferramenta para fortalecer processos, e não como uma barreira que dificulte a operação", conclui.

 

Atenta à agenda legislativa e aos pronunciamentos de entidades como o Instituto Colombiano Agropecuário, o Instituto Nacional de Vigilância de Medicamentos e Alimentos, o Fundo Nacional de Entorpecentes e o Ministério da Justiça, a indústria da cannabis na Colômbia continuará em constante renovação e reinvenção para não perder o terreno conquistado. Por isso, é urgente que o governo promova maior integração da indústria da cannabis à agenda do Ministério da Agricultura, bem como uma política comercial clara que favoreça a expansão de um setor com potencial para desenvolver produtos de alto valor agregado, como é o caso da cannabis medicinal e industrial.