Decreto Segurança ameaça colapso do setor de canapa industrial na Itália, alerta Suprema Corte de Cassação

Relatório da Suprema Corte de Cassação aponta que o Decreto Segurança proíbe a produção e o comércio das inflorescências de canapa industrial, colocando em risco um mercado de 500 milhões de euros, milhares de empregos e a própria conformidade da Itália com o direito europeu

Publicada em 26/06/2025

Decreto Segurança ameaça colapso do setor de canapa industrial na Itália, alerta Suprema Corte de Cassação

Imagem Ilustrativa: Canva Pro

Na Itália, o artigo 18 do Decreto Segurança (decreto-lei 48/2025, convertido na lei 80/2025) impõe uma proibição absoluta sobre a importação, processamento, detenção, comércio e até o consumo das inflorescências de canapa industrial, ameaçando eliminar mais de 90% do mercado de exportação dessas flores e causando um impacto econômico devastador. O setor, que atualmente movimenta cerca de 500 milhões de euros anuais, emprega diretamente 30 mil trabalhadores e gera 150 milhões de euros em arrecadação fiscal, corre sério risco de colapso, segundo análise detalhada da Suprema Corte de Cassação divulgada em 23 de junho de 2025.

A Relazione n. 33/2025, elaborada pelo Escritório do Massimário e do Rol da Corte, destaca que a nova norma revoga o modelo jurídico consolidado pela lei 242/2016, que permitia a produção de Cannabis sativa L. a partir de sementes certificadas com teor de THC até 0,2%, possibilitando a utilização das inflorescências para diversos fins agroindustriais, alimentares e cosméticos. O artigo 18, entretanto, proíbe expressamente todas as atividades relacionadas às inflorescências, incluindo extratos, resinas e óleos, independentemente da concentração de THC, sujeitando infrações a penalidades severas previstas no d.P.R. 309/1990.

 

Única exceção

 

A Corte observa que a única exceção, que permite o processamento dos flores para produção de sementes, é na prática inviável devido à complexidade, custo e dificuldade de comprovação dos processos de separação e rastreabilidade exigidos, tornando-a um paliativo sem aplicação real.

Do ponto de vista constitucional, a Suprema Corte aponta a ausência dos critérios de “necessidade e urgência” que justificariam a edição de um decreto-lei para regular uma matéria agrícola, configurando possível violação do artigo 77 da Constituição. Além disso, o decreto fere o princípio da legalidade estrita e da clareza, previstos no artigo 25, ao criminalizar práticas anteriormente permitidas sem definir claramente os limites da conduta ilícita, o que compromete a previsibilidade jurídica e a segurança dos produtores.

No âmbito europeu, a Corte faz referência à jurisprudência da Corte de Justiça da União Europeia, citando especialmente a decisão Kanavape de 2020, que reconhece o direito à livre comercialização da cannabis na sua totalidade, desde que as variedades utilizadas estejam registradas e respeitem os limites máximos de THC. O artigo 18, ao criar uma proibição seletiva, constitui uma barreira técnica injustificada, em violação ao artigo 34 do TFUE, o que pode resultar em procedimento de infração contra a Itália e confere ao Judiciário nacional o dever de desconsiderar normas internas incompatíveis com o direito europeu.

 

Exportação das inflorescências

 

As consequências práticas dessa norma incluem a destruição súbita de cadeias produtivas inteiras, que dependem majoritariamente da exportação das inflorescências, com efeitos devastadores para empresas — muitas delas jovens e inovadoras — que apostaram em modelos de produção sustentável e rastreável. A transição abrupta de um regime administrativo para um sistema sancionatório penal também cria uma insegurança jurídica que pode gerar litígios e pedidos de indenização contra o Estado.

A associação Imprenditori Canapa Italia considera as conclusões da Suprema Corte uma confirmação das graves falhas técnicas e jurídicas do decreto e reforça o apelo por uma intervenção imediata do Governo e do Parlamento para corrigir o artigo 18, restabelecendo a disciplina conforme a lei 242/2016, em sintonia com o direito europeu, e garantindo segurança e previsibilidade ao setor.

 

Conteúdo publicado originalmente em 23 de junho de 2025, no Imprenditori Canapa.