Boas práticas e ética: como a indústria da cannabis pode mitigar riscos na pesquisa

Enquanto o governo propõe reformas no sistema de saúde, especialistas apontam que a ausência de diretrizes éticas na pesquisa com cannabis medicinal prejudica a confiança dos médicos e o acesso dos pacientes

Publicada em 10/02/2025

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Imagem Ilustrativa: Canva Pro

Atualmente, o governo colombiano está apresentando uma reforma no sistema de saúde para promover um acesso “sem barreiras e com equidade”, visando uma mudança estrutural que torne o sistema mais eficiente e sustentável. Nesse contexto, diferentes setores da opinião pública têm exposto seus argumentos sobre temas como o novo enfoque na prevenção e detecção de doenças, os custos, a oferta de serviços e a transparência da informação, entre outros. No entanto, pouco se tem falado sobre o papel de conquistas importantes, como a eutanásia e o uso medicinal da cannabis, nessa discussão.

 

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Diana Bernal Camargo, codiretora da especialização em Direito Médico Sanitário e de Maestria em Bioderecho e Bioética da Universidade do Rosário em Bogotá. Imagem | Arquivo Pessoal

Diana Bernal Camargo, coordenadora da especialização em Direito Médico Sanitário e da Maestria em Biodireito e Bioética da Universidade do Rosário, em Bogotá, conhece as dinâmicas da indústria e já trabalhou com algumas empresas na mitigação de riscos éticos no tratamento de materiais biológicos e dados associados à pesquisa. Ela considera que a Colômbia está atrasada na incorporação de uma abordagem de conformidade ética na pesquisa sobre cannabis medicinal e que, sem isso, não apenas persistirão os conflitos bioéticos, mas também a justa reticência dos profissionais médicos em prescrever cannabis medicinal no país.

 

Escassez de pesquisa acadêmica sobre conflitos éticos e bioéticos na Colômbia

 

Como em outros países, a indústria da cannabis medicinal apresenta assimetrias que devem ser corrigidas em favor do bem-estar e da saúde pública. No entanto, além dos conflitos éticos clássicos associados à prescrição de cannabis medicinal devido à falta de evidências científicas suficientes, Diana considera que a Colômbia também enfrentou dificuldades relacionadas à ausência de consenso multidisciplinar sobre o uso de cannabis em diferentes cenários, às barreiras de comunicação entre profissionais de saúde e pacientes e ao custo de acesso a medicamentos ou serviços.
 

 

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“Na Colômbia, devido a essas assimetrias, prevalece o princípio da precaução por parte da comunidade médica ao falar sobre a prescrição de cannabis, incluindo a flor seca. No entanto, isso gera uma tensão em relação ao respeito pela autonomia dos pacientes. Por exemplo, no caso de enfermidades de alto custo, nem todos os pacientes encontrarão um profissional de saúde dentro do plano obrigatório de saúde que conheça e prescreva cannabis, ao contrário do que pode ocorrer com profissionais da prática privada, que podem fazê-lo por terem mais informações”, indica. “Isso sem mencionar o alto custo, que envolve não apenas uma consulta médica particular, mas também os próprios medicamentos ou fórmulas magistrais, o que entra em conflito com o direito humano à saúde.”

Na prática, essa falta de informação leva os pacientes a recorrerem a tratamentos e promovidos por influenciadores nas redes sociais, em vez de consultarem um profissional de saúde para esclarecer suas dúvidas. Como aponta o professor Bernal, “as normas atuais não preveem nada sobre a informação para o consumidor final; apenas se refere à suspensão da publicidade, mas se esquecem de que não há regulamentação de boas práticas éticas, o que torna o tema da cannabis medicinal ainda mais arriscado”.

 

As demoras na expedição do regulamento de ensaios clínicos também impactaram a produção científica na Colômbia

 

De acordo com a Consulta de Opinião Médica realizada pelo Observatório Colombiano da Indústria de Cannabis (OCIC) em 2023, os médicos entrevistados não se sentiam altamente preparados para responder às perguntas de seus pacientes sobre cannabis medicinal, mas também concordaram que era necessário um protocolo para a prescrição de cannabis no país.

Segundo o professor Bernal, as experiências da indústria farmacêutica também podem ser extrapoladas para a cannabis medicinal e, da mesma forma, é essencial aprender com as lições decorrentes da falta de um regulamento sobre práticas indevidas, da limitação do direito à saúde imposta pela ausência de uma tarifa padrão e das consequências da incapacidade de fornecer medicamentos a pacientes com doenças prevalentes ou de alto custo.

“A Colômbia tem, desde 2012, um CONPES sobre política farmacêutica nacional, e desde então se discute o fortalecimento da soberania farmacêutica do país. Isso deveria auxiliar na produção de medicamentos para os cuidados paliativos de doenças como o câncer. No entanto, seguimos atrasados ​​na atualização das normas sobre ensaios clínicos. Muitas dessas resoluções foram expedidas há mais de 30 anos e, embora tenhamos avanços em Mesas Técnicas com o Ministério da Saúde nesse sentido, todos os esforços foram feitos antes da pandemia global de COVID-19”, menciona o professor Bernal.

 

Conclusões para a indústria da cannabis a partir dos avanços na investigação acadêmica da Universidade do Rosário

 

Diana Bernal tem uma ampla trajetória acadêmica e, em suas publicações, aborda temas como a prestação de serviços no consumo de substâncias psicoativas, a regulamentação de medicamentos de origem biológica e os princípios e normas que orientam a avaliação de ensaios clínicos, entre outros, sempre com o respaldo institucional da Universidade do Rosário. Acredita-se que a Colômbia enfrentará um panorama desafiador no que diz respeito ao abastecimento de medicamentos à base de cannabis medicinal e que, enquanto não houver estudos multicêntricos com outros países, a prescrição de flor seca não avançará no país.

No entanto, Bernal adianta que a Universidade do Rosário e o Observatório de Direito e Bioética estão avançando em uma proposta para realizar uma revisão constitucional sobre o acesso à cannabis medicinal na Colômbia, com base em falhas de tutela, como uma estratégia para desenvolver linhas de discussão estratégica a partir da voz dos pacientes, dentro do ambiente acadêmico.

A indústria da cannabis medicinal tem muitas oportunidades de cooperação e sinergia com a academia. É notável que, na Colômbia, especialistas como a professora Diana Bernal estão abordando a incorporação de uma dimensão essencial, como a mitigação de riscos na pesquisa científica sobre cannabis medicinal. Além disso, esses esforços são treinados para fortalecer a confiança entre profissionais de saúde e pacientes, promovendo uma comunicação mais humanizada e eficaz.