Projeto da UFV pode desembarcar nos EUA, China e Europa
Com miniestaquia e biochar de cannabis, pesquisadores brasileiros querem posicionar o país como referência mundial no cultivo de cânhamo industrial
Publicada em 09/07/2025

Cultivo de cânhamo na Universidade Federal de Viçosa (UFV), em parceria com a startup Buds INC. Imagem: Arquivo pessoal: Gustavo Baêsso
Ainda em fase de pesquisa e desenvolvimento, mas com os olhos voltados para o mercado global. É assim que o projeto conduzido pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), em parceria com a startup Buds INC, começa a dar os primeiros passos rumo à internacionalização da tecnologia nacional voltada ao cultivo do cânhamo industrial.
A técnica de miniestaquia, desenvolvida no laboratório mineiro, promete revolucionar a produção de mudas de cannabis e já desperta o interesse de gigantes do setor.
“Iniciamos recentemente contatos com potenciais interessados nos Estados Unidos, especialmente em relação à miniestaquia aplicada ao cânhamo”, afirma o engenheiro florestal Gustavo Baêsso, pesquisador da Buds INC e um dos coordenadores do projeto. Uma viagem técnica ao país está prevista ainda em 2025.
Além dos norte-americanos, outras potências do setor, como China, Canadá e Holanda, também estão no radar. A meta é clara. Colocar o Brasil entre os protagonistas da cadeia global da cannabis, assim como já ocorre com a soja, carne e celulose.
“Nosso objetivo é demonstrar que o país tem não apenas condições naturais, mas também capacidade técnica e alto potencial de inovação”, enfatiza Baêsso.
Inovação brasileira no cultivo de cannabis

O projeto nasceu com o propósito de construir uma base científica sólida para impulsionar o cânhamo industrial no Brasil. A primeira grande inovação veio com a miniestaquia, uma técnica de clonagem vegetal que garante alta taxa de enraizamento e reduz o ciclo de produção.
As mudas ficam prontas para replantio em 11 a 15 dias, um intervalo altamente competitivo para a produção em escala industrial.
Os testes envolveram cerca de 15 diferentes genéticas de cannabis, com taxas de enraizamento variando entre 80% e 100%, e uma média geral superior a 90%. “Esse índice é considerado altíssimo, especialmente para uma espécie com características fisiológicas tão particulares como a cannabis”, explica o pesquisador.
Resíduos também em jogo

Outro avanço importante do projeto é o desenvolvimento do primeiro biochar brasileiro feito com resíduos de cannabis. O material é obtido por meio da pirólise de folhas, galhos, raízes e caules descartados no cultivo, transformando resíduos em um insumo agrícola de alto valor.
Os primeiros testes de aplicação do biochar estão sendo realizados em mudas de eucalipto, com resultados promissores no aumento da retenção de nutrientes no solo.
Sustentabilidade como diferencial competitivo
A proposta da UFV e da Buds INC não é apenas científica, é também ambiental e econômica. O modelo de cultivo propõe uma cadeia carbono neutro, com uso de materiais biodegradáveis e aproveitamento integral dos resíduos.
“A ideia é estruturar uma cadeia com geração mínima, ou mesmo zero, de resíduos”, resume Baêsso.
A transformação de descartes em produtos como biochar ou embalagens biodegradáveis alinha o projeto à lógica da economia circular e de baixo carbono, contribuindo para mitigar as mudanças climáticas e aumentar a atratividade econômica do setor.
Marco regulatório como pro
Enquanto a inovação avança, os pesquisadores acompanham de perto o cenário regulatório brasileiro. A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu 30 de setembro de 2025 como data estipulada para o Governo entregar a regulamentação do cânhamo no brasil.
Baêsso destaca que, embora ainda em construção, há sinais concretos de avanço, especialmente com o fortalecimento do debate sobre a regulamentação da cannabis medicinal e o envolvimento de órgãos como o Ministério da Agricultura (MAPA).
“O potencial é enorme. A China detém hoje cerca de 70% da produção mundial de fibras de cânhamo, mas o Brasil reúne condições agronômicas, logísticas e de escala para disputar esse mercado”, afirma o pesquisador.
Publicação científica e patentes
Os resultados obtidos até agora serão organizados para publicações científicas e pedidos de patente. Quanto ao biochar, o objetivo é realizar o processo ainda no primeiro semestre de 2026.