TJMT regulamenta procedimentos relacionados ao porte de cannabis para consumo pessoal

Procedimento busca seguir decisão tomada pelo STF de descriminalizar o usuário em até 40g ou seis plantas de cannabis; pelo menos até pronunciamento do CNJ

Publicada em 18/10/2024

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Imagem: Alair Ribeiro/Coordenadoria de Comunicação Social TJMT

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) publicou, no dia 9 de outubro, a portaria nº 3/2024, que regulamenta os procedimentos de natureza não penal previstos no Tema 506 (Repercussão Geral) do Supremo Tribunal Federal (STF). A medida visa atender à tese que define o porte de cannabis  para consumo pessoal como um ilícito extrapenal, sujeito a advertências e medidas educativas. 

A portaria, emitida pelo Conselho de Supervisão dos Juizados Especiais (CSJE), cria um procedimento padrão para os magistrados dos juizados especiais cíveis e criminais do Estado.

 

Nova regulamentação para porte de cannabis

 

Em setembro de 2024, o STF aprovou que a posse de até 40g ou seis plantas fêmeas de cannabis sativa, destinadas ao consumo pessoal, não é considerada uma infração penal, mas sim um ilícito extrapenal. Assim, as pessoas flagradas nessas condições têm o material apreendido pela autoridade policial e são notificadas a comparecer em juízo.

Conforme o acórdão do Tema 506, até que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se pronuncie, os Juizados Especiais Criminais continuam competentes para julgar as condutas previstas no art. 28 da Lei 11.343/06, sem que a sentença implique efeitos penais.

Segundo o advogado Murilo Nicolau, a portaria publicada pelo TJMT auxilia na condução dos processos existentes, padronizando a atuação dos juizados regionais. Além disso, demonstra que a decisão do STF de descriminalizar o usuário está reverberando em outras instâncias da justiça brasileira.
 

 

Ação Prática no Jecrim de Várzea Grande

 

O juiz Hugo José Freitas da Silva, do Juizado Especial Criminal (Jecrim) de Várzea Grande, observou a necessidade de aperfeiçoar a aplicação do tema, já que a regulamentação ainda não foi detalhada pelo CNJ. “Enquanto não há uma regulamentação do CNJ, precisamos dar continuidade aos trabalhos”, comenta o magistrado, destacando a criação de um procedimento para atender os casos extrapenais.

Com a colaboração do juiz Agamenon Alcântara Moreno Júnior, o magistrado desenvolveu um procedimento baseado nas recomendações do STF, que incluem advertências e medidas educativas, como a participação em programas ou cursos educativos. Esse modelo foi adotado pelo Jecrim de Várzea Grande e, após o sucesso da iniciativa, foi expandido para todo o estado.

 

Procedimento 

 

A portaria nº 3/2024, assinada pelo desembargador Marcos Henrique Machado, presidente do CSJE, formaliza a adoção desse procedimento em todo o território de Mato Grosso. O documento inclui um fluxograma que detalha as etapas e decisões envolvidas no processo.

O juiz Hugo José Freitas da Silva enfatiza que o novo procedimento busca oferecer um atendimento acolhedor e humanizado, sem estigmatização. "Ele visa medidas adaptadas ao perfil e à realidade de cada indivíduo", destaca.

De acordo com a norma, o procedimento será dividido em duas fases, preliminar e processual. Na primeira, o Juizado Especial e o Ministério Público analisam se a conduta relatada pela autoridade policial se enquadra na decisão do STF. Em caso afirmativo, o processo de readequação da conduta é iniciado. 

Já na processual são realizados atendimentos psicossociais e encaminhamentos para ações afirmativas, como cursos profissionalizantes, apoio familiar e recolocação no mercado de trabalho.

Murilo ressalta que, assim como em outros processos, não fica explícito se a decisão abrange apenas a flor de cannabis ou também as extrações. "Existem relatos de pessoas apreendidas com haxixe que não foram enquadradas como usuárias, mesmo estando com quantidades abaixo de 40g", finaliza o advogado. 

O advogado Clayton Medeiros questiona o direcionamento do usuário para a JECRIM, visto que a posse em certas quantidades deixou de ser um crime. "Comparecer em alguma vara criminal, por mais que seja a do juizado especial criminal, ainda é colocar o usuário na válvula da marginalidade. As medidas poderiam e podem ser aplicadas de outra forma, mesmo com o comparecimento em juízo".