Luís Carlos Valois: “A regulamentação de todos os tipos de drogas é muito mais importante do que a proibição”
Ao portal Sechat, o juiz Luís Carlos Valois, mestre e doutor em direito penal e criminologia pela USP, faz análise dos desafios e perspectivas do julgamento na lei de drogas
Publicada em 25/09/2023
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No âmbito do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) referente à constitucionalidade do Artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 11.343/2006), o juiz Luís Carlos Valois, mestre e doutor em direito penal e criminologia pela USP, destacou a complexidade de diferenciar usuários de traficantes no cenário legislativo atual.
A norma vigente prevê penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade e advertência sobre os efeitos das drogas, para aqueles que adquirirem, transportarem ou portarem drogas para consumo pessoal, abolindo a pena de prisão, mas mantendo a criminalização.
No caso específico que motivou o julgamento, a defesa de um indivíduo condenado busca a desclassificação do porte de maconha para uso pessoal como crime, considerando que o acusado foi detido com uma pequena quantidade de maconha. “Hoje em dia 30 a 40% dos homens são presos por conta da lei de drogas e 80 a 90% das mulheres presas por crimes relacionados à lei de drogas”, diz Valois.
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“A regulamentação de todos os tipos de drogas é muito mais importante do que a proibição. Não regulamentar deixa tudo na mão do mercado paralelo, faz-se de conta que está funcionando a proibição, enquanto tem droga em todas as esquinas. Regulamentar traz informação e educação, além de proteção ao próprio usuário e deixa de financiar o crime organizado”
Luís Carlos Valois, juiz
Em relação à descriminalização somente da cannabis, o juiz diz que é algo significativo e que vem em benefício da própria sociedade. “Eu presumo que uma possível descriminalização só da planta o desencarceramento seria na base de 10 a 15% dos homens e 40% das mulheres”, complementa.
O juiz enfatiza que a consequência não vai ser tão grande quanto se pensa, porque o principal problema nos processos relacionados à lei de drogas é a questão da prova, e não a questão da quantidade de droga em si. E, reforça ainda, que a prova no processo relacionado à lei de drogas é o ponto central, destacando que a quantidade da substância não é suficiente para evitar forjamentos de flagrantes. O foco deve ser a avaliação das provas, evitando que a quantidade seja utilizada como única base de relatórios.
Sobre o julgamento, Valois esclarece que “o que está sendo discutido no STF não é a descriminalização das drogas, é o estabelecimento do que é traficante e do que é consumidor. Agora como resultado prático de uma possível descriminalização pelo meio legislativo, no caminho da lei, aí seria uma consequência muito positiva, principalmente, na criminalidade. Não só por tirar financiamento de crime organizado, não só por aumentar a arrecadação de imposto, mas também para diminuir o superencarceramento”, reforça.
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A regulamentação de todos os tipos de drogas é muito mais importante do que a proibição, destaca o juiz, e diz, ainda, que a necessidade de regulamentar o mercado de drogas com informação, educação e proteção aos usuários, em contraste com um mercado paralelo desregulamentado. Valois ressalta que a regulamentação pode contribuir para diminuir a disponibilidade de drogas para menores de idade, promovendo uma abordagem mais eficaz em comparação à exclusão. “A regulamentação de todos os tipos de drogas é muito mais importante do que a proibição. Não regulamentar deixa tudo na mão do mercado paralelo, faz-se de conta que está funcionando a proibição, enquanto tem droga em todas as esquinas. Regulamentar traz informação e educação, além de proteção ao próprio usuário e deixa de financiar o crime organizado”, finaliza.
Foto de capa: Atual